Os 'fura-filas' da vacina: quem são os investigados em diferentes Estados
Pelo país, há diversos casos de pessoas que não faziam parte do grupo prioritário para a vacinação neste momento e foram imunizadas. Casos se tornaram alvos de investigações.
Em meio à escassez de vacinas contra a covid-19 no Brasil, um grave problema tem preocupado especialistas: a imunização de pessoas que não compõem os grupos prioritários.
Em todo o país, até o momento, foram distribuídas 6 milhões de unidades da CoronaVac, desenvolvida por cientistas do Instituto Butantan com a empresa chinesa Sinovac.
Diante do número de doses considerado extremamente baixo para a população brasileira, a orientação é de que elas sejam destinadas àqueles que são considerados prioridades no atual momento.
Cada região do país teve a liberdade para definir as prioridades na vacinação neste momento. Enquanto muitos lugares incluíram somente profissionais de saúde na linha de frente contra a pandemia e idosos em casas de repouso e clínicas geriátricas, outras acrescentaram também indígenas, quilombolas e ribeirinhos.
Mas nem todos os locais têm restringido a vacinação àqueles que devem ser imunizados neste momento.
Em diversas cidades brasileiras há relatos de pessoas que não estavam entre os grupos prioritários, mas receberam a primeira dose da CoronaVac — a segunda deve ser tomada após 21 dias. Essas situações se tornaram alvos de investigações.
Em Manaus (AM), por exemplo, a vacinação foi suspensa por 24 horas na quinta-feira (21/01), após denúncias sobre pessoas que foram vacinadas quando não deveriam.
Na tarde desta quinta, o Ministério Público Federal (MPF) do Amazonas divulgou um comunicado no qual afirmou que está "atento às denúncias sobre desvios e usos indevidos da vacina contra a covid-19".
"Compartilhe essas informações com amigos e familiares para que possamos atuar em favor da distribuição impessoal e objetiva das doses disponíveis nesse momento para proteger os trabalhadores de saúde mais vulneráveis!", diz o texto.
Vacinação em Manaus
Um dos casos investigados em Manaus é o de duas irmãs médicas recém-formadas. As jovens de 24 anos, que são filhas de um rico empresário da região, foram vacinadas no primeiro dia de imunização na cidade, na terça-feira (19/01).
As irmãs publicaram fotos nas redes sociais enquanto eram imunizadas. Conforme o jornal O Estado de São Paulo, elas não estavam na linha de frente contra a pandemia. Uma delas teve sua nomeação publicada no Diário Oficial do Município um dia antes da vacinação, enquanto a da outra foi feita no dia seguinte. Ainda segundo a publicação, elas não ocupam cargos de médicos, mas de gerentes de projetos.
O caso das médicas de 24 anos é citado em pedido feito pelo Ministério Público do Estado, Defensoria Pública e Tribunal de Contas do Amazonas para esclarecimentos sobre a vacinação em Manaus e no Estado do Amazonas. Os órgãos também receberam outros relatos sobre suspeitas de pessoas que não fazem parte dos grupos prioritários e foram vacinadas.
Os órgãos de fiscalização pediram com urgência acesso diário à lista de aplicação de vacinas em Manaus, em razão da insuficiência de doses na região. Na lista com os imunizados devem constar: nome, CPF, local onde foi feita a imunização, função exercida pela pessoa e o local onde ela trabalha. O pedido foi ajuizado na Justiça Federal na noite de quinta-feira.
As suspeitas de irregularidades fizeram com que a vacinação fosse suspensa em Manaus, para que as listas de vacinados fossem disponibilizadas aos órgãos de investigação. A previsão é de que sejam retomadas ainda nesta sexta-feira (22/01) — até o início desta tarde ainda estavam suspensas.
A Prefeitura de Manaus nega que haja irregularidades nas vacinações dos médicos na cidade. Sobre o caso das irmãs, o prefeito David Almeida argumentou que elas estavam de plantão quando a Unidade Básica de Saúde (UBS), para a qual foram nomeadas, começou a vacinar os trabalhadores.
Prefeitos vacinados
Pelo país, há diversas cidades com suspeitas de que os próprios prefeitos furaram a fila de vacinação.
Um dos casos é o do prefeito da cidade de Itabi, em Sergipe, Júnior de Amynthas. O homem, de 46 anos, tomou a vacina na terça-feira (19/01), no início da imunização na cidade. O município, de 5 mil habitantes, havia recebido 31 doses da CoronaVac.
Júnior, que não faz parte do grupo prioritário, alegou que o ato foi "uma forma de incentivar a população para que tomasse a vacina", pois argumentou que muitas pessoas têm desacreditado da eficácia da vacina.
Ele se pronunciou sobre o assunto em suas redes sociais e negou ter cometido qualquer irregularidade. Afirmou que a vacinação teve o "propósito nobre em defesa da saúde e da vida do nosso povo".
"Se não houvesse nobreza e boa intenção no meu gesto, teria tomado a vacina escondido e teria vacinado também minha esposa, o meu filho de oito anos e meus pais de 80 e 85 anos", declarou.
Conforme reportagem da Folha de S.Paulo publicada na quinta-feira, as promotorias de pelo menos seis Estados do Nordeste abriram apurações sobre suspeitas de pessoas que furaram a fila da vacina nos dois primeiros dias de imunização.
Improbidade administrativa
Os diversos casos de "fura-filas" pelo país podem ser denunciados ao Ministério Público. Se houver a comprovação de ilegalidade, os envolvidos podem sofrer punições.
O Ministério Público do Ceará, que apura alguns casos do tipo que foram registrados no Estado, alerta que a situação pode configurar ato de improbidade administrativa — que atenta contra os princípios da administração pública — e em alguns casos também pode ser entendida como peculato — desvio de recurso público.
Na Bahia, por exemplo, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado ajuizaram, na quarta-feira, duas ações contra o prefeito de Candiba (BA), Reginaldo Prado, por ele ter recebido a primeira dose da CoronaVac mesmo sem ser parte do grupo prioritário.
Os MPs querem que ele seja condenado por improbidade administrativa e pague multa de R$ 145 mil.
Reginaldo, de 60 anos, não é considerado do grupo prioritário porque não vive em um abrigo para pessoas idosas. Desta forma, ele deveria ser imunizado somente em uma próxima fase da campanha de vacinação.
Nas medidas contra Reginaldo, os órgãos alegam que o prefeito utilizou o cargo para se colocar à frente dos cerca de 14 mil habitantes da cidade, que recebeu 100 doses da vacina.
Na quarta-feira, o prefeito publicou um vídeo se desculpando e disse que foi vacinado para incentivar a população a se imunizar contra a covid-19.
"A vacina não tem dor, não tem mal-estar, não tem nada anormal. Peço desculpas se errei, se fiz alguma coisa que deixou a desejar. Mas a maior testemunha que tenho é Deus e a minha mente. O meu objetivo foi dar de mim o melhor para o povo", disse em vídeo publicado no perfil da prefeitura no Facebook.
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