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'Tá ruim pra todo mundo': espera por atendimento em PS ultrapassa 6 h em SP

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

22/12/2021 15h17

Um ambiente lotado, com pessoas em pé, sentadas no chão e até encostadas nas janelas enquanto aguardavam. Assim começava o dia de hoje em São Paulo. A espera para atendimento piorou nesta semana, segundo os pacientes, com o agravamento dos casos de gripe na capital paulista.

No Pronto-Socorro da Lapa, havia relatos de espera por atendimento de mais de seis horas. Os sintomas são mais próximos da nova epidemia de gripe, causada pelo vírus Influenza A H3N2, do que das variantes de coronavírus, que até poucos meses atrás provocava grande ocupação de leitos.

O UOL ainda percorreu unidades de saúde do Grajaú e do Jabaquara (zona sul de São Paulo) e também constatou demora no atendimento.

Aos pacientes, os médicos têm informados que o agravamento da situação afetou até mesmo profissionais de saúde, afastados por causa da gripe. Em uma das unidades, não havia médicos pediatras. A demanda observada hoje era pior que a dos dias anteriores e a tendência é só piorar.

Sentado no chão, com as costas na parede e a mão na cabeça, Jailson Eraldo da Silva, 20 anos, não tinha nem forças para falar. Ele apenas mostrou o celular para dizer o que sentia, em texto enviado para a namorada: "Estou com calafrios, tosse, perdi a voz, dor no corpo e não consigo comer".

Questionada pelo UOL, a Secretaria Municipal de Saúde atribuiu o longo período de espera nas unidades de atendimento constatado pela reportagem ao aumento de casos de pessoas com sintomas gripais. A pasta disse ainda que destinou parte dos leitos do Hospital Municipal da Brasilândia ao acolhimento de pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave.

PS - Herculano Barreto/UOL - Herculano Barreto/UOL
Espera por atendimento no pronto-socorro da Lapa, em São Palo
Imagem: Herculano Barreto/UOL

Rouco e aparentando fazer muito esforço para se expressar, Jailson Eraldo disse ter chegado ao local às 6h30. Já tinha passado das 12h30, mas ainda não havia previsão para atendimento.

"Me mandam pra um canto e pro outro, mas continuo aqui", contou, gesticulando bastante na tentativa de dar ênfase a um relato com a voz fraca.

Ali, só se ouvia tosse constantemente, vindas de todos os cantos daquele ambiente lotado, e até choro. Um homem, Caio Medeiros, carregava a mãe pelo braço com o auxílio de uma mulher em direção a uma porta, na esperança de que ela pudesse ser atendida.

Ouviu que precisaria aguardar. Com o corpo curvado para a frente, a mãe dele, que se contorcia de dor e mal conseguia permanecer em pé, sentou em uma cadeira, enquanto Caio seguia em pé, para falar para algum profissional de saúde que a situação era grave.

Ela está com pedra nos rins. Tá com muita dor, com febre, tudo. Não tem condições aqui, não"

Em um dos bancos da frente, uma mulher massageia as costas da mãe, que inclina o corpo para a frente e enxuga o suor da testa com uma toalha.

Era comum ver pessoas de olhos fechados e aparentando cansaço em uma espera que parecia ser interminável.

O pedreiro Sebastião Carvalho da Silva, 39, apontou o celular para o local para registrar a lotação, enquanto aguardava em pé por atendimento com gripe e dores no corpo.

Tá precário. Tá ruim pra todo mundo aqui. E os outros hospitais também estão lotados. Não tem o que fazer"

Com o filho de 4 anos com sintomas gripais e dor de garganta no colo, a doméstica Thais Melo, 22, aguardava por atendimento há mais de uma hora.

"Tá muito lotado, moço! Muita aglomeração. Deveriam ter mais recursos pra atender a população, que tá sofrendo aqui", desabafou, sem qualquer perspectiva de quando seria atendida.

'Tá cruel aqui, viu?': longa espera no Grajaú

Grajaú - Herculano Barreto/UOL - Herculano Barreto/UOL
Pacientes aguardam em pronto-socorro no Grajaú (zona sul de São Paulo)
Imagem: Herculano Barreto/UOL

Na UBS Jardim Castro Alves, no Grajaú, zona sul da capital paulista, também há relatos de espera de mais de seis horas durante a semana —o que piorou nesta semana, segundo os pacientes. No local, havia mais de 60 pessoas aguardando por atendimento no começo da tarde de hoje (22).

Ih, filho! Aqui, tá sempre lotado. O povo tá acostumado a ficar seis horas na fila. Eu e o meu marido estamos tossindo muito. Ele tá bem ruim, com febre e tudo. Acho que é essa gripe nova"
Sueli Cancela, 54, professora

Após passar pelo Hospital Geral do Grajaú, o pedreiro Josinaldo Rosa de Lima, 38, disse ter sido orientado a procurar por atendimento na UBS, onde pegou uma senha para atendimento e optou por esperar do lado externo.

"Tô com febre, tosse, dor no corpo, na cabeça. O negócio tá feio."

Com dor de cabeça e febre, a operária Maria Iranilda Lima Koba, 47, que já aguardava por atendimento havia mais de três horas, também estava do lado de fora para pegar um pouco de ar livre enquanto aguardava.

Ela puxou do bolso a ficha da primeira senha, que marcava 10h14. "Tá cruel aqui, viu?", relatou Maria Iranilda, que disse ter apresentado os sintomas após uma viagem para a Alemanha, no começo do mês.

A cuidadora de idosos Manuela Alves Porfirio, 40, já aguardava por atendimento havia mais de cinco horas depois de passar pela triagem e por procedimentos de praxe com uma técnica de enfermagem e com uma enfermeira.

Ela já tinha ido ao mesmo local em busca de atendimento três dias antes —disse ter chegado às 19h e só ter recebido atendimento à 1h do dia seguinte, após espera de seis horas. Decidiu voltar porque o seu estado de saúde se agravou.

Tô com falta de ar e ainda preciso esperar esse tempo todo. A gente só vem pra esse lugar porque tá precisando"

O que diz a Secretaria Municipal de Saúde

A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), informa que a rede tem registrado um aumento significativo na demanda de atendimento das unidades de saúde a pessoas com sintomas gripais. Em novembro de 2021, a SMS registrou um total de 111.949 atendimentos de pessoas com sintomas gripais, sendo 56.220 suspeitos de Covid-19. Neste mês, até terça-feira (21), a SMS registra um total de 170.259 atendimentos com quadro respiratório, sendo 79.482 suspeitos de covid-19.

A SMS destinou parte dos leitos do Hospital Municipal da Brasilândia para o acolhimento e tratamento dos casos de Síndromes Respiratórias Agudas Graves (Srags) na cidade. A estratégia da gestão municipal é concentrar os pacientes em uma unidade para o devido acompanhamento e realizar o painel viral das pessoas internadas, contribuindo para a identificação da cepa viral de influenza, entre outros vírus, que circulam na capital.

Desde sábado (18), os pacientes diagnosticados com as síndromes respiratórias e que necessitam de internação já estão sendo transferidos para essa unidade hospitalar. O HM Brasilândia conta com 406 leitos, dos quais 258 serão destinados aos pacientes com Srag, sendo 158 de enfermaria e 100 de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Além disso, a rede municipal está contratando 280 profissionais de saúde e instalando tendas em UPAs e AMAs para agilizar a triagem e atendimento da população.

Devido ao aumento dos vírus respiratórios, dentre eles, a influenza, a Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa) da capital enviou, no dia 17 de dezembro, ofício ao Ministério da Saúde (MS) e Secretaria de Estado da Saúde (SES) solicitando mais doses da vacina contra influenza à cidade de São Paulo. Por se tratar de uma campanha com período delimitado, não há previsão para reposição dos estoques.

A SMS tem intensificado as ações de monitoramento e iniciou na quinta-feira (16), a realização de testes rápidos em suas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), Assistências Médicas Ambulatoriais (AMAs), Prontos Atendimentos (PAs) e prontos-socorros, no setor de triagem, para identificar os casos positivos de Covid-19.