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O benefício que a maconha traz para algumas mulheres durante a gravidez

Diana Donath em sua casa em Baytown, no Texas - Bryan Schutmaat/NYT
Diana Donath em sua casa em Baytown, no Texas Imagem: Bryan Schutmaat/NYT

Catherine Saint Louis

28/02/2017 04h00

Este mês, o "The New York Times" publicou uma reportagem sobre o número cada vez maior de mulheres grávidas que usam maconha. Pedimos que algumas delas compartilhassem suas histórias.

Centenas de leitoras nos escreveram; a maioria havia fumado, e algumas poucas a consumiram com vaporizadores ou comeram pratos que levavam a erva. Aproximadamente metade disse tê-la usado por razões médicas. Praticamente todas acham que o consumo não afetou seus filhos, ou não tinham certeza; apenas algumas se preocupam com a possibilidade de as crianças sofrerem déficits cognitivos.

O Times acompanhou algumas com mais profundidade. As que quiseram proteger sua privacidade ou evitar consequências legais, permitiram apenas o uso do primeiro nome.

Diana Donath, 50 anos, professora de ginástica do Texas

A texana Diana começou a fumar maconha na adolescência e não parou nas duas gestações.

"Realmente não me importo com o que pensam. Tenho 50 anos e meus dois filhos têm nível superior", disse ela.

Pesquisas mostraram que o THC, ou tetrahidrocanabinol, pode passar pela placenta e chegar até o feto, podendo prejudicar o desenvolvimento cerebral e reduzindo o peso no nascimento, mas Diana não viu efeitos nocivos no consumo de cannabis.

Nenhum dos bebês teve peso baixo ao nascer; na verdade, um deles pesava mais de quatro quilos. E, acrescentou: "Meus filhos têm inteligência acima da média".

Ao contrário de muitas grávidas de vinte e poucos, ela abriu o jogo com os médicos: "Sempre fui honesta com eles sobre tudo o que faço".

Seu obstetra se preocupava com o cigarro e o álcool, mas nunca lhe disse para parar de usar maconha. Ela se lembra do que ele disse: "Como o caso não é tão estudado, não posso orientá-la nessa área".

Mesmo sem se arrepender, disse Diana, se seu ginecologista dissesse que a maconha era ruim para o bebê, ela teria parado, mas, na época, pensou: "É o meu pulmão, não o do meu filho".

Porém, um estudo de 1988 publicado no New England Journal of Medicine descobriu que a cannabis pode reduzir a capacidade do sangue de transportar oxigênio, o que, em teoria, poderia afetar o bebê.

27.fev.2017 - Jane e sua filha em Nova York - Nancie Battaglia/NYT - Nancie Battaglia/NYT
Jane e sua filha em Nova York
Imagem: Nancie Battaglia/NYT

Jane, 41 anos, pesquisadora farmacêutica de Nova York

Quando Jane estava grávida do último de seus três filhos, seu casamento passava por um período estressante, ela sofria de náuseas e teve contrações muito cedo. Usou um bloqueador de canal de cálcio e tomou injeções de progesterona para relaxar as contrações e adiar o nascimento.

Começou a usar maconha para controlar a náusea e lidar com o estresse. "Às vezes eu dava uma tragada para poder sair da cama e não me preocupar com as contrações o dia inteiro", disse ela.

Como pesquisadora farmacêutica, Jane não fumou maconha de modo leviano: primeiro, fez uma pesquisa no PubMed, banco de dados de estudos científicos, e pesou os riscos e benefícios.

"Eu usava muito pouco, por isso acho que o benefício valeu", concluiu ela. Seu médico havia receitado Zofran para os enjoos matinais, e ela achou que maconha não poderia ser pior.

No final, sua filha nasceu saudável, com 37 semanas. "Hoje, não há nada de errado com ela além de sua atitude petulante. Ela é a mais inteligente", conta Jane.

Jane nunca falou sobre o uso de maconha, mesmo com seu ginecologista, que era seu amigo. "Você não precisa discutir o fato de que fuma maconha na gravidez. Não é uma questão que precisa ser pública", disse ela, descrevendo-se como uma profissional extremamente eficiente que está fazendo doutorado.

Tycia, 24 anos, dona de casa do Colorado

Tycia usa a maconha para aliviar da dor de uma lesão nas costas que sofreu aos 12 anos, mas não é paciente registrada da versão medicinal. Fuma umas duas vezes por dia, mesmo quando estava grávida de sua filha, Lilith.

"Não fumei no primeiro trimestre. Tentei manter de um estilo de vida saudável", disse ela.

Usou só pomadas e Advil para controlar a dor nas costas. Já havia tomado opioides no passado, mas ficou preocupada com a probabilidade de se viciar, de causar alguma dependência no bebê e de ficar constipada.

No segundo trimestre, porém, voltou para a maconha depois que os enjoos ficaram insuportáveis. "Ela estava crescendo, e eu continuava enjoada, praticamente incapaz de comer qualquer coisa. Tentava, mas não conseguia", disse Tycia.

Ela teve medo de contar aos médicos sobre sua decisão, então avaliou os riscos e benefícios por conta própria. Também tentou parar de fumar cigarros. "Fiz um grande esforço para parar, mas não funcionou. Não consegui me livrar de dois ou três cigarros".

Hoje sua filha parece completamente normal. "Talvez eu não perceba, mas acho que ela está bem", disse.

Ela amamenta Lilith e pretende continuar assim por muito tempo. Perguntei se temia que o principal ingrediente psicoativo da maconha fosse encontrado no leite materno. Ela respondeu: "Meu lado responsável diz que sim, mas, honestamente, não".

"Maconha é natural e quase todo mundo que conheço fuma ou usa de alguma forma. Então, acho que não tem problema".

Margaret, 38 anos, publicitária de Nova Jersey

Em sua primeira gravidez, Margaret ficou "superatenta a tudo", conta ela. Só tomava café descafeinado, parou com o sushi e com os frios e consumia principalmente alimentos orgânicos.

Porém, nas duas gestações seguintes, sentindo-se constantemente enjoada, recorreu à maconha.

O médico havia receitado Zofran, que é usado para náuseas na gravidez, que ela tomou algumas vezes, mas não todos os dias. "Não me parecia natural. Já a maconha é uma planta", disse.

Nesse ponto, os enjoos já eram tão debilitantes que ela não conseguia comer, tocar na comida e nem mesmo prepará-la – situação ainda mais difícil quando é preciso cuidar de crianças. "Algumas tragadas num baseado melhoravam a situação. Não precisava nem fumar muito, a ponto de nem ter vontade de me encher de Doritos", brincou.

O marido, que não usa maconha, tinha medo que isso pudesse prejudicar o bebê. Ela fez buscas online para obter informações sobre o uso da erva na gravidez e não ficou preocupada com os estudos que encontrou. No fim, chegaram a um acordo.

"Se tivéssemos que escolher entre o Zofran e o baseado, com certeza escolheríamos o baseado", disse ela.

O uso de maconha na gravidez foi associado ao baixo peso no nascimento e problemas cognitivos mais tarde na vida da criança, mas seus três filhos nasceram "com peso muito saudável e sem efeitos adversos perceptíveis", disse Margaret.

Seus médicos não sabiam que ela usava maconha. Margaret omitiu o fato porque havia lido artigos sobre mulheres que receberam um telefonema do serviço de proteção social por terem fumado na gravidez.

Ela se autodescreve como uma "mãe suburbana" e nunca deu aos médicos motivo para que a examinassem. "Sei que esse é um privilégio porque sou branca, mas realmente não acho que isso aconteceria comigo", disse ela.

Claire, 32 anos, assistente social do Oregon

Existem algumas razões pelas quais Claire fuma maconha, independentemente de estar ou não grávida: dor de cabeça, cólicas, náuseas, ou, como disse, "se estou de péssimo humor, impaciente e irritada".

Em sua primeira gravidez, Claire fumou uma vez por semana no terceiro trimestre; na segunda, dava uma ou duas tragadas dia sim, dia não e passava semanas sem fumar. Ela diz usar o vaporizador porque não fica tão chapada como quando fuma um baseado.

Claire, que tem dois filhos com menos de cinco anos, fica com o pé atrás em relação à indústria farmacêutica. "Já me chamaram de hippie", disse ela, acrescentando que tem uma "aversão a remédios que precisam de receita médica".

Durante a gravidez, morou no Oregon, onde a maconha é legal, e em outro estado, onde é proibida. Em nenhum lugar contou à sua parteira sobre o uso de maconha.

"A única razão é o estigma. Ninguém gosta que mulheres grávidas fumem maconha."

Mas Claire pesquisou na internet sobre o potencial de dano para o desenvolvimento de fetos; achou um pequeno estudo feito na Jamaica que seguiu grávidas que fumavam maconha, mas que não usavam tabaco nem álcool.

Os pesquisadores descobriram que os bebês expostos no útero ao THC – principal ingrediente psicoativo da maconha – eram mais alertas e tinham uma maior predisposição de se regular aos 30 dias de idade do que aqueles cujas mães não haviam usado a erva.

Ela considerou as conclusões um tanto discutíveis, mas admitiu que o estudo a confortou. "Me deu um certo ânimo", disse ela.

Claire encontrou outros estudos com mulheres grávidas que fumaram tabaco ou ingeriram álcool, mas poucos envolvendo as que usavam exclusivamente maconha, como ela, e gostaria que houvesse mais.

"Meu círculo social é basicamente de profissionais no estilo hippie e de esquerda e a maconha é a única coisa que usamos. Ninguém bebe ou fuma tabaco na gravidez. São muito cuidadosas", disse Claire. Ela acha que o governo federal demoniza a cannabis, mas no seu meio "há muita confiança na erva".