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EUA diz que príncipe saudita 'aprovou' assassinato de jornalista em Istambul

Amigos de Jamal Khashoggi seguram fotos dois anos após a morte do jornalista - Ozan KOSE / AFP
Amigos de Jamal Khashoggi seguram fotos dois anos após a morte do jornalista Imagem: Ozan KOSE / AFP

26/02/2021 20h22

Os Estados Unidos acusaram pela primeira vez o príncipe saudita, Mohamed bin Salman, de ter aprovado o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, mas não anunciaram nenhuma sanção direta contra o herdeiro.

O príncipe Mohamed, herdeiro do rei Salman e governante de fato do reino, "aprovou uma operação em Istambul para capturar ou matar o jornalista saudita Jamal Khashoggi".

Khashoggi era um jornalista crítico ao reino, que se radicou nos Estados Unidos após cair em desgraça com o príncipe-herdeiro. Em outubro de 2018, ele entrou no consolado saudita em Istambul para pedir uma certidão para se casar com sua noiva.

Segundo as autoridades turcas, ele foi assassinado na sede diplomática em 2 de outubro por um esquadrão de 15 sauditas que primeiro o estrangularam e depois esquartejaram seu corpo. Seus restos mortais nunca foram encontrados.

O relatório, de dois anos atrás, foi divulgado nesta sexta-feira de forma parcial pelo governo do presidente Joe Biden. O informe destaca que dada a influência do príncipe-herdeiro, é "altamente improvável" que o assassinato do jornalista acontecesse sem uma luz verde de sua parte.

"O príncipe-herdeiro vê Khashoggi como uma ameaça para o reino e em termos gerais apoiou o uso de medidas violentas para silenciá-lo", destacou o relatório.

Após a suspensão do sigilo, os Estados Unidos anunciaram sanções contra 76 sauditas relacionados com a morte de Khashoggi, que era colaborador do jornal The Washington Post, e anunciou que proibirá a entrada ao país de pessoas que ameaçarem dissidentes em seus países de origem.

O chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, esclareceu que seu país não busca uma ruptura com a Arábia Saudita, e sim deseja "recalibrar" a relação.

A publicação do relatório ocorreu após uma conversa telefônica entre Biden e o rei Salman, após a Casa Branca indicar que o presidente terá o monarca como interlocutor e não seu herdeiro. Na conversa, Biden destacou o compromisso de "ajudar a Arábia Saudita a defender seu território contra ataques de grupos aliados do Irã", mas também reafirmou a importância que seu país atribui aos direitos humanos.

Riade rejeitou o documento desclassificado e afirmou que o mesmo contém "informações e conclusões inexatas".

- Um encontro infeliz -O experiente jornalista de 59 anos morava na Virgínia, mas foi informado pelas autoridades sauditas que ele teria de ir ao consulado de Istambul se quisesse obter uma série de documentos para se casar com sua noiva turca, Hatice Cengiz. Lá, ele foi assassinado por um esquadrão comandado por um ex-conselheiro próximo do príncipe Mohamed, Saud al Qahtani.

Um mês depois do assassinato, a CIA concluiu com grande confiança que o príncipe herdeiro havia ordenado o assassinato, de acordo com o The Washington Post.

No entanto, o então governo de Donald Trump, que estava determinado a manter laços estreitos com Riad, recusou-se a responsabilizar publicamente o líder saudita, apesar de pedir a punição dos responsáveis.

O relatório indica que 15 pessoas foram enviadas à Turquia para a operação contra Khashoggi, incluindo membros da guarda de elite para a proteção do príncipe Mohamed, a brigada de intervenção rápida. Os Estados Unidos anunciaram nesta sexta-feira sanções contra essa brigada.

O democrata Bob Menéndez, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, destacou a publicação do relatório e disse esperar que esse seja "um primeiro passo" e que o governo americano tome "medidas concretas para fazer com que o príncipe seja responsabilizado em nível pessoal".

- 'Uma paródia de justiça' -Poucos observadores acreditam que tal assassinato poderia ter ocorrido sem o consentimento do príncipe Mohamed, visto que o governante prendeu vários críticos e facções de sua própria família.

Sob forte pressão dos Estados Unidos e da comunidade internacional, o governo saudita levou alguns dos perpetradores à justiça.

No processo a portas fechadas, dois oficiais de alto escalão considerados os mentores foram exonerados: Qahtani e o então vice-diretor dos serviços de inteligência Ahmad al Asiri. Ambos fazem parte do círculo mais íntimo do príncipe e nesta sexta-feira os Estados Unidos anunciaram sanções contra Asiri.

Cinco pessoas que não foram identificadas foram condenadas à morte e três outras a duras penas de prisão. Mas, nove meses depois, as sentenças de morte foram substituídas por penas de prisão de 20 anos.

A Anistia Internacional e a Repórteres sem Fronteiras descreveram o processo como uma "paródia de justiça".