Raúl Castro se vai, mas Cuba continuará na mesma linha
Havana, 19 Abr 2021 (AFP) - Cuba virou a página dos governos dos irmãos Castro, com a aposentadoria de Raúl Castro, aos 89 anos, numa transição simbólica que não muda a linha política do país, um dos últimos comunistas no mundo.
"Eleito Miguel Díaz-Canel Bermudez, Primeiro-Secretário do Comitê Central do Partido Comunista de #Cuba no #8ºCongressoPCC", anunciou o partido em sua conta no Twitter ao final da eleição dos delegados desta organização política.
"19 de abril, um dia histórico", escreveu Díaz-Canel, de 60 anos, em sua conta no Twitter. "A Geração do Centenário, fundadora e guia do Partido, entrega responsabilidades" a uma geração mais jovem, acrescentou.
"O mais revolucionário dentro da Revolução é sempre defender o partido, da mesma forma que o partido deve ser o maior defensor da Revolução", disse posteriormente o presidente.
A transferência ocorre em meio a uma profunda crise econômica no país devido à pandemia do coronavírus e ao fortalecimento do embargo que os Estados Unidos mantêm ao país há 60 anos.
Embora seja uma transição simbólica, em um país onde a maioria só conheceu Fidel e Raúl Castro à frente do poder, não significa necessariamente uma mudança na linha política cubana.
"Desde que nasci, conheci apenas um partido e até agora vivemos com ele, e ninguém passa fome", diz Miguel Gainza, um artesão de 58 anos que trabalha na Havana Velha e apoia esse sistema político.
"É uma pena que Fidel tenha morrido. porque ele resolvia tudo", lamenta.
- "Administrar um país" -Um total de 300 delegados de toda a ilha, representando 700.000 militantes, votaram direta e secretamente no domingo para eleger o Comitê Central, composto de 114 membros.
O novo comitê vai anunciar nesta segunda-feira a formação do Birô Político, atualmente com 17 membros, e a direção do partido.
Para John Kavulich, presidente do Conselho Econômico e Comercial Cuba-Estados Unidos, é necessária uma mudança geracional. "Atualmente, a idade combinada dos três líderes atuais do Partido Comunista está se aproximando dos 300 anos", diz.
A saída de Castro pode ser acompanhada pela aposentadoria de outros militantes que alcançaram o triunfo da revolução em 1959, incluindo o segundo secretário, José Ramón Machado Ventura, de 90 anos, e Ramiro Valdés, 88.
O partido está envelhecendo. De seus integrantes, 42,6% têm mais de 55 anos, o que frustra as aspirações dos jovens.
Kavulich considera que há no partido uma "falta de vontade de aceitar que já não é preciso lutar por uma revolução, mas sim gerir um país não de meados do século XX, mas da segunda década do século XXI".
Entre muitos cubanos há um cansaço devido à escassez e às longas filas para se abastecer. O país importa 80% do que consome.
O governo, atormentado nos últimos quatro anos pelo endurecimento das sanções de Washington, continua tendo o combate ideológico entre suas prioridades.
"A existência de um único partido em Cuba foi e sempre estará no foco das campanhas do inimigo", disse Castro em seu discurso.
"Esta unidade deve ser protegida com zelo e nunca aceitar a divisão entre revolucionários sob falsos pretextos de maior democracia", acrescentou.
- "Contrarrevolução interna" -Na pizzaria onde trabalha, Luis Enrique Oramas, de 30 anos, diz que "se deixassem as pessoas falarem o que pensam, seria como em outros lugares, (haveria) dois ou até três partidos".
"A maioria das pessoas preferiria isso do que como o país anda agora, tendo um partido em que todos pensem o mesmo", acrescenta.
A nova liderança chega em meio a uma expansão das demandas sociais nas redes, graças ao advento da internet móvel em 2018.
Ativistas, artistas e intelectuais mantêm uma intensa atividade nas redes sociais, em um país onde as manifestações são quase inexistentes.
Antes de partir, Castro rejeitou que "as mentiras, a manipulação e a divulgação de notícias falsas não tenham mais limites" em referência às críticas nas redes.
É "a contrarrevolução interna, que carece de base social, liderança e capacidade de mobilização", acrescentou.
Durante o congresso, o partido adotou uma resolução para enfrentar a "subversão" política e ideológica, enquanto vários ativistas, jornalistas independentes e artistas denunciaram no Twitter que a polícia os impedia de sair de casa, recurso utilizado para impedir que se encontrassem.
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