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As possíveis consequências jurídicas da invasão à Ucrânia

01/03/2022 22h03

Haia, 2 Mar 2022 (AFP) - O procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI) anunciou que abriu uma investigação sobre a situação na Ucrânia, após denúncias de "crimes de guerra e contra a humanidade" cometidos pela Rússia.

A Corte Internacional de Justiça (CIJ), da ONU, convocou, por sua vez, audiências para os próximos dias 7 e 8 sobre as denúncias apresentadas pela Ucrânia envolvendo ações das tropas russas que invadiram aquele país.

Seguem abaixo cinco questionamentos sobre a situação jurídica após a invasão:

- A Rússia infringiu o direito internacional?:

A Rússia violou o Artigo 2 (4) da Carta das Nações Unidas, que proíbe o uso da força em nível internacional, diz Geoff Gordon, pesquisador principal do Instituto Asser de direito internacional e europeu, com sede em Haia.

"O uso da força militar russa não é desconhecido" na Ucrânia, acrescenta Philippe Sands, professor de direito internacional no Reino Unido. Mas "hoje existem regras para nos proteger de tais atos, refletidas na Carta da ONU, o que temos de mais parecido com uma Constituição internacional", destacou Sands em artigo publicado no "Financial Times". "Foram os compromissos mais importantes da Carta o que Putin menosprezou."

- Que tribunais podem julgar as questões ligadas à Ucrânia?:

A Ucrânia se apresentou à Corte Internacional de Justiça (CIJ), que realizará audiências nos próximos dias 7 e 8 para determinar suas competências jurídicas nesse caso, aponta Geoff Gordon. Além disso, os tribunais nacionais também podem julgar casos relacionados a violações do direito internacional, acrescenta.

A Rússia também poderia ter que comparecer perante o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, ao ser acusada por Kiev de violações nessa área.

A Ucrânia não é signatária do Estatuto de Roma, tratado fundador do TPI, mas reconheceu formalmente em 2014 a jurisdição do mesmo em relação aos crimes cometidos em seu território. A Rússia, por sua vez, retirou-se do TPI, razão pela qual este não pode processar cidadãos russos em solo russo, apenas se estiverem detidos no território de um Estado que reconheça a jurisdição do tribunal.

A CIJ anunciou hoje que realizará audiências nos dias 7 e 8 em um caso apresentado pela Ucrânia, que acusa a Rússia de planejar genocídio. A juíza presidente do Tribunal, Joan Donoghue, chamou a atenção da Rússia "para a necessidade de agir de forma que qualquer decisão do Tribunal possa ter os efeitos desejados", especificou a CIJ, principal órgão judicial das Nações Unidas, com sede em Haia.

- Os indivíduos podem ser responsabilizados?

Sim. O TPI julga os acusados das piores atrocidades cometidas no mundo, que incluem genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Os indivíduos também podem ser processados por tribunais nacionais.

O TPI, no entanto, não pode julgar o crime de agressão - ataque de um Estado contra outro planejado por um líder político ou militar - se esse país não tiver ratificado o Estatuto de Roma, como é o caso da Rússia e da Ucrânia.

Philippe Sands sugeriu a criação de um tribunal penal internacional ('ad hoc') consagrado à agressão russa contra a Ucrânia.

- O que acontece agora? -

De acordo com Cecily Rose, professora assistente de direito internacional público na Universidade de Leiden (Holanda), as audiências e a decisão da CIJ poderiam acontecer em breve, em virtude da urgência.

Sobre o TPI, o mesmo poderia emitir atas de acusação se os juízes determinarem que tem jurisdição e provas suficientes, ou se um Estado-membro apresentar o caso diretamente ao tribunal.

- Quais serão os efeitos?

É difícil prever, dizem os especialistas. A CIJ, cujas sentenças têm caráter definitivo e inapelável, "não conta com um mecanismo de aplicação clássico" para fazer com que as mesmas sejam cumpridas, diz Geoff Gordon. Já o TPI não tem uma força policial própria e depende dos Estados-membros para efetuar prisões.

"Por outro lado, assistimos à mobilização de uma série de mecanismos mais ou menos coordenados, cujo objetivo é punir a Rússia por travar uma guerra ilegal", como sanções econômicas, restrições de viagens e cancelamento de eventos esportivos, explica Gordon. "Uma sentença da CIJ poderia ter um papel nessas ações no futuro", estima.

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