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Leia a íntegra da entrevista exclusiva de Michel Temer à EBC

04/05/2018 12h00

Pela primeira vez desde que assumiu o governo, o presidente Michel Temer concedeu entrevista exclusiva à Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Por quase uma hora, o presidente respondeu a perguntas de vários veículos que compõem a EBC sobre economia, reeleição, programas sociais e anunciou medidas para incentivar a criação de empregos e geração de renda. Ainda este mês, a Caixa Econômica Federal deve usar os lucros obtidos com empréstimos para a construção de 150 mil casas populares e para repasses a prefeituras por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Também defendeu a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, mas avisou que o modelo não será replicado para outros estados. Indagado sobre as delações premiadas, Temer disse que são úteis, mas não são provas definitivas: "Apenas dão início às investigações". Sem citar o nome do empresário Joesley Batista, o presidente afirmou que o vazamento distorceu a conversa gravada. Segundo ele, essa distorção causou o momento "mais injusto" para o governo. 

Questionado sobre as reações negativas que recebeu à manifestação de solidariedade às vítimas do prédio que desabou no centro de São Paulo no último dia 1º, Temer disse que foi um ato de "coragem de autoridade" e que tais ações não o fariam desistir de buscar a reeleição em outubro. Ele comemorou ainda a redução dos juros e da inflação, assim como a recuperação financeira da Petrobras e do Banco do Brasil. 

A íntegra da entrevista foi transmitida pela NBR, será reprisada às 21h15 na TV Brasil e pode ser acessada na Agência Brasil. Os principais trechos irão ao ar nos noticiários da TV Brasil e das rádios que compõem o sistema EBC.   

"É a primeira vez que concedo uma entrevista [para a EBC] e acho que poderemos repetir essas conversas, que são uma maneira naturalmente de o presidente da República trazer ao público em geral os atos de governo e discutir as questões da sociedade", afirmou o presidente.

A seguir, a íntegra da entrevista concedida pelo presidente Michel Temer à EBC, no Palácio da Alvorada.

Diálogo

"No governo, nós temos umas palavras-chaves. Uma delas, que foi a primeira, que inaugurou praticamente o meu governo, foi a palavra diálogo. Diálogo, em primeiro lugar, com o Poder Legislativo. Porque não havia diálogo do Executivo com o Legislativo. Até diferentemente, o Legislativo era tido sempre como uma espécie de apêndice do Executivo. Nós fizemos diferente. Nós trouxemos o Legislativo para governar juntamente com o Executivo. Veja bem, todas as propostas que fizemos ao Legislativo foram muito rapidamente aprovadas. Eu me recordo, e me recordo bem, que uma das propostas que fizemos foi a fixação de um teto nos gastos públicos. Essa matéria logo deu uma grande confiança para o chamado mercado e, naturalmente, para aqueles que produzem no nosso país. E por isso tudo, creio que este primeiro ponto ajudou muito para estabelecer ou restabelecer uma confiança no governo e uma confiança no país, o que permitiu, naturalmente, esta redução que você acabou de apontar. Foi muito útil para a economia brasileira e deu também um novo impulso à economia. A palavra diálogo foi a primeira que utilizei e outras tantas expressões que usei ao longo do tempo para, digamos assim, levar o nosso governo adiante. Esta primeira fase, posso dizer, que foi pautada pela palavra diálogo".

Índices de desemprego

"Houve uma queda substancial ao longo do tempo. Veja bem, nesses últimos meses, com dados concretos, em janeiro deste ano, o Caged [Cadastro Geral de Empregados e Desempregados], que registra o número de carteiras assinadas, apontava cerca de 78 mil carteiras assinadas em janeiro. Em fevereiro, cerca de 66 ou 67 mil carteiras assinadas. Em março, 57 ou 58 mil carteiras assinadas. Eu mesmo indaguei sobre essa preocupação que você tem, à equipe econômica. Mas como é isso? O Caged e a nota de carteiras assinadas revela que houve, nestes três meses, quase 200 mil postos de trabalho com carteira assinada. Entretanto, o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística], com seu dado, aponta que há 13 milhões e tanto de desempregados. Qual a razão desse fato? É interessante. Esse fato é positivo. Quando a economia melhora, aumenta a procura pelo emprego. Então, aquilo que pautava pelo desalento, as pessoas não procuravam emprego, em face da melhora da economia, as pessoas começaram a procurar emprego. E, como por enquanto não há emprego para todos, o IBGE faz um cálculo, digamos assim, desse alento que não deu resultado num primeiro momento. Aqueles que procuram emprego, e não conseguiram, entram na faixa dos chamados desempregados".

Será que ainda dá para recuperar o desemprego?

"Seguramente, você sabe que a política econômica do nosso governo é pautada pela ideia da recuperação do emprego e sobre a recuperação do emprego, também a recuperação dos chamados postos de trabalho. Você sabe que essa confiança que eu mencionei na primeira pergunta, ela trouxe, em consequência, nesses quatro meses, mais de um milhão e meio de postos de trabalho. Ou seja, gente que não tinha tarefa, não tinha função, nenhuma atividade, passou a ter. Cabeleireira, carrinho de pipoca, comida, alimentação, as pessoas passaram a ter postos de trabalho. E se tiveram postos de trabalho é porque houve pagamento em função dessas atividades. É uma demonstração clara de que a economia está se recuperando".

Lucro da Caixa revertido em linhas de crédito

"Aliás, isso foi objeto de conversas ao longo desses dias. Não só para a construção civil, porque a construção civil é uma das atividades que mais emprega em nosso país. Nós estamos, praticamente, lançando agora, estamos finalizando estudos para lançar cerca de 150 mil casas populares, Minha Casa, Minha Vida. Isso vai movimentar, agilizar a construção civil. Mas, ao mesmo tempo, estamos estudando, com esses lucros, estamos estudando, empréstimos a municípios. Porque quando você empresta para o município, em face de uma decisão nossa de governo, o município pode dar, como garantia, e não podia dar no passado, o chamado Fundo de Participação do Município, o FPM. E, com isso, vai aumentar seguramente a procura dos municípios à Caixa Econômica Federal, com a garantia do FPM, para obter empréstimos. E esses empréstimos certamente gerarão empregos. Espero que ainda saia este mês".

Queda dos juros

"E é interessante quando se festeja, por exemplo, a queda da inflação ou os juros baixos, é claro, na valorização do salário. Você tem um salário mais valorizado em face da queda da inflação e, naturalmente, da queda dos juros. Você tem um alimento mais barato. O alimento não cresce. Não sobe de preço. Isso tem uma significação, vamos dizer, para as classes mais vulneráveis. É por isso que eu digo que, em ambas as hipóteses, a redução dos juros e a queda da inflação, são importantes para a sociedade brasileira".

Os juros e o consumidor

"Você sabe que isso é uma coisa curiosa. As pessoas acabam não entendendo como cai tanto a taxa Selic e os juros continuam altos. Primeiro lugar, você tome o caso do cartão de crédito. Houve agora uma nova resolução do Conselho Monetário Nacional reduzindo os juros do cartão de crédito e acabando com aquela história do chamado crédito rotativo que, no passado, permanecia durante todo o tempo e, num dado momento, permaneceu apenas por um mês e depois entrava num financiamento natural. Hoje, nem esse primeiro mês fica no cartão, no crédito rotativo. Neste primeiro momento, você tem juros regulares. Portanto, a tendência é reduzir os juros no cartão de crédito. Por outro lado, tenho falado muitas vezes com o presidente Ilan, e o presidente Ilan [Goldfajn] do Banco Central, está cuidando, com os bancos, naturalmente, da redução dos juros. E registro mais. Você veja que muito recentemente a Caixa Econômica Federal reduziu os juros para o crédito imobiliário. Nós temos uma mesma orientação para a redução dos juros. Já houve uma pequena redução, mas é preciso uma redução mais ampla e isso está sendo cuidado".

Caixa e BB estudam reduzir juros para servir de parâmetro para os demais 

"Sim, na verdade, quando os bancos oficiais, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, reduzem juros, servem de parâmetro para os demais bancos. Isto está sendo estudado" .

Reajuste do Bolsa Família e redução da fila de acesso ao benefício 

"Eu acho que esse é um grande ganho social. É um dos grandes ganhos sociais. Aliás, eu registro que há mais de dois anos e meio não se dava aumento para o Bolsa Família. Eu, imediatamente, dois meses depois, três meses depois, eu reajustei o Bolsa Família. Isto há dois anos. E, em face da inflação, ainda muito pequena nos dois anos, não houve reajuste do Bolsa Família. Mas, passados os dois anos, nós resolvemos aumentá-lo e, de fato, você tem razão, acima da inflação. Foi um gesto importante. Eu devo dizer, até citando esse número, talvez nove ou dez reais a mais, mas é importante para atender ao Bolsa Família. Esse valor tem certa significação. Mas, eu digo que não é o único ganho do governo na área social. Você veja o financiamento estudantil para os cursos superiores. Nós ampliamos enormemente em mais de 70 e tantas mil vagas para o Fies, para o financiamento estudantil, que é também um tema de grande significado social. Agora, devo dizer que o maior significado social está, primeiro, no impedimento do aumento do preço dos alimentos, que acabei de mencionar. Segundo, na valorização do salário, em face dos dados que acabei de dar. E, terceiro ponto, é que nós vamos trabalhar muito para combater o desemprego. A melhor maneira de fazer um grande governo, de natureza social, é precisamente o combate ao desemprego. Você sabe que pelos dados do Caged, em 2015, o negativo dos postos de trabalho chegava a um milhão e 300 e poucos. No ano de 2016, o negativo chegava a 1 milhão e qualquer coisa. Neste ano de 2017, no final do ano, o dado negativo era de apenas menos de 20 mil empregos. Veja como houve uma evolução no emprego ao longo desse tempo. Por isso, retorno àquela pergunta anterior. Como expliquei, olha aqui, quando a economia melhora as pessoas vão procurar emprego e, às vezes, não conseguindo emprego entram na estatística dos desempregados".

Petrobras saneada e flutuação de preços dos combustíveis 

"São duas coisas. A  primeira, eu quero aproveitar sua pergunta para dizer da grande recuperação da Petrobras. Você sabe que a Petrobras, se nós nos reportarmos há dois anos e meio, três anos atrás, era praticamente, se você me permite a expressão, um palavrão. Ficou muito mal o conceito da Petrobras. Com isso, naturalmente, as ações caíram de preço e a própria Petrobras, como instituição, se desvalorizou. Mas, há o Pedro Parente [presidente da Petrobras], que é um grande administrador, logo se recuperou a Petrobras. E hoje, a Petrobras, as ações cresceram de preço. A Petrobras tem outro conceito. Mas, a propósito disso, me permite dizer o seguinte: há coisa de duas, três semanas, o [Paulo] Caffarelli, presidente do Banco do Brasil, me ligou dizendo o seguinte: 'Olha, presidente, quando nós chegamos aqui, o preço da ação do Banco do Brasil estava em R$ 15. Hoje está em R$ 45'. Ou seja, o patrimônio que estava mais ou menos em R$ 35 bilhões, hoje está em R$ 125 bilhões. Estou citando esses dois exemplos para revelar a recuperação da Petrobras de um lado, e do Banco do Brasil e das empresas estatais em geral. E, também, num segundo ponto, fiz aprovar uma lei que estabelece a impossibilidade de, vamos dizer assim, do exercício, nessas empresas estatais, dos agentes que ainda exercitem atividade política. Ou seja, só técnicos poderão ir para lá. Por isso, reitero, mais uma vez, que entidades como aquelas que acabei, de maneira exemplificativa, de apontar tiveram um acréscimo patrimonial extraordinário. Agora, a política de preços realmente, o Pedro Parente, há tempos atrás, me disse que é melhor acompanhar os preços internacionais porque isso dá muita segurança jurídica para aqueles que investem na Petrobras e nessa atividade. E esse acompanhamento dos preços internacionais, ora tem um aumento, ora uma diminuição. Mas também dá muita credibilidade e segurança jurídica aos investidores".

Queda do preço da gasolina

"Lamentavelmente por enquanto, nós temos que continuar [a manter a política de flutuação de preços] porque a segurança jurídica em relação à Petrobras também é um fato relevante. É possível que, é provável, que o preço internacional caia. Caindo o preço internacional, cai os preços dos produtos da Petrobras".

Decisão dos EUA de sobretaxar o aço e o alumínio do Brasil

"O Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Indústria e do Comércio lançaram uma nota pautada, mais ou menos, pelos setores interessados, tanto do alumínio como do aço. Em matéria de aço, nós exportamos muito aço inacabado. Eles completam o aço nos Estados Unidos. E há uma tendência, uma tendência, de aceitar as chamadas cotas que os Estados Unidos estão pleiteando. Ainda não há decisão. Uma hipótese é de cota. Cota baseada nos três meses de exportações ou então um acréscimo não de 25%, mas de 10%. Isto ainda está em estudo. De igual maneira, em relação ao alumínio. Tanto que já apresentamos uma manifestação, não sei se um dia nós vamos levar à Organização Mundial do Comércio ou não, até lá teremos uma decisão a respeito disso. Por enquanto, a posição, naturalmente, dos produtores é de que não querem perder o mercado. Curiosamente, as empresas norte-americanas que recebem o aço inacabado também querem continuar a receber essas exportações. Eles acabam o aço lá nos Estados Unidos e ganham com este acabamento. Não foi útil essa decisão norte-americana. Você viu que foi adiado no primeiro mês. Agora foi adiado no segundo mês. Quem sabe até o término do segundo mês, nós consigamos negociar em melhores condições".

Reformas e prioridades

"Quero dizer que grandes reformas já foram feitas. Se relacionarmos a reforma do teto dos gastos foi parte de uma fórmula trivial. Não se pode gastar mais do que se arrecada. É o caso de uma família. Você não pode gastar mais do que aquilo que ganha. Veja que ao fazermos o teto dos gastos foi uma coisa revolucionária. Ninguém ousou fazer isso ao longo do tempo. Ao fazê-lo, nós fizemos de uma maneira inteiramente responsável. Ou seja, não tomamos uma medida populista. Vamos fazer melhorar por um ano e, no ano que vem, voltamos tudo. Ao contrário, nós fizemos um projeto, depois convertido em emenda constitucional que prevê um prazo de 20 anos revisável após dez anos. Por quê? A suposição é que talvez em dez anos você consiga empatar aquilo que arrecada com aquilo que gasta. E veja, no primeiro ano nosso, o déficit era de R$ 179 bilhões, no segundo, de R$ 159 bilhões, hoje, a tendência é cair para R$ 139 bilhões. Portanto, supõe-se que ao longo de dez anos você tenha o empate do que você arrecada com o gasto público de modo que possamos fazer uma revisão definitiva desse teto dos gastos públicos. Segundo, nós fizemos a reforma do ensino médio. Aparentemente, parece um interesse menor, mas não é. Eu fui presidente da Câmara dos Deputados, há 20 anos, 1997, quando passou o período de 20 anos, e nada da reforma do ensino médio. Uma coisa que se dizia é que o aluno do fundamental, do médio, não sabia multiplicar, não sabia dividir, não conhecia história, não conhecia português, expressava-se mal. Então, muito bem. No nosso governo, nós fizemos a reforma do ensino médio. Vocês sabem dos protestos que houve. Nas reuniões que fazíamos com os secretários de Educação dos estados, ela foi aprovada por mais de 95% do setor educacional. Portanto, você vê que foi uma reforma da maior significação. Uma grande reforma. Terceiro, a reforma da modernização trabalhista. Nós temos uma legislação do trabalho de 1943, com modificações singelas que foram feitas ao longo do tempo. Mas, a grande modernização trabalhista veio por meio desta reforma que todos consideraram ousada, mas que está sendo muito bem recebida. Portanto, a primeira consideração que faço é que grandes reformas foram feitas. Agora, uma das fundamentais é a reforma da Previdência. E eu entro exatamente no tema que o Valter [Lima, jornalista da Rádio Nacional] colocou. A reforma da Previdência é fundamental. Você tem um déficit hoje de cerca de R$ 180 bilhões, e você não consegue segurar por mais um ou dois anos um déficit desse tamanho na Previdência Social. Logo depois nós retomamos a Previdência Social. E nós já estávamos praticamente no início de um ano eleitoral, que torna mais difícil a votação que aprovaria a reforma da Previdência. Mas, ocorreu um fato mais significativo que foi a intervenção federal na área da segurança do Rio de Janeiro. E você sabe que na administração pública você também pesa os valores. Então, entre o valor da Previdência Social naquele momento de difícil aprovação e o valor da segurança pública que atingia, não só o estado do Rio de Janeiro, mas em vários estados brasileiros, só para termos uma ideia tivemos de usar as Forças Armadas, por solicitação dos estados, em função da segurança pública. Então, quando houve a questão do Rio de Janeiro, a intervenção, aliás uma intervenção cooperativa porque o governador [Luiz Fernando] Pezão solicitou essa intervenção, em face da intervenção federal você não pode votar emendas à Constituição. E daí, nós tivemos que paralisar por inteiro a reforma da Previdência".

Reforma da Previdência e a pauta política

"Nós colocamos a reforma da Previdência na pauta política do país. Ela pode ter saído temporariamente da pauta legislativa, mas não saiu da pauta política. Vou lhe dizer, não haverá candidato a presidente, candidato a senador, candidato a governador, candidato a deputado federal que não tenha que dizer publicamente o que ele pensa a respeito da reforma da Previdência. Então, primeiro ponto, não é improvável (inaudível) que nós venhamos a pensar nela ainda no final deste ano, porque a intervenção federal que foi decretada, ela, devo dizer, ela paralisa a possibilidade de votação de emenda constitucional. Mas, se ela perdurar até setembro ou outubro, nós teremos ainda um mês. Uma parte de setembro, uma parte de outubro, novembro e uma parte de dezembro para colocar novamente na pauta legislativa. E volto a dizer que não saiu da pauta política do país. Os deputados e senadores já terão sido reeleitos, enfim, não haveria mais eleições pela frente o que facilita enormemente a votação da Previdência. Então, volto a dizer, se ela não for aprovada agora, inevitavelmente, será aprovada no início do próximo ano".

Venezuelanos

"Nós temos de acolhê-los. Este é o primeiro ponto, porque aqui está em pauta não apenas o texto constitucional, mas tratados internacionais que nós firmamos de acolher refugiados. Eu me lembro a primeira vez que eu fui à ONU, você sabe que o Brasil é quem abre os trabalhos da ONU no ano, um dos grandes temas é o dos refugiados. Teve até uma sessão especial para tratar dos refugiados e dizemos que o Brasil está aberto aos refugiados e estava muito em pauta a questão dos refugiados na Europa. E agora que a Venezuela está passando as mais variadas dificuldades, enfim, fome, inexistência de trabalho, salário mínimo, incapaz de prover as necessidades dos venezuelanos, que nós iremos fechar as fronteiras? Agora, se você me disser isso estará criando problemas para o Brasil? De alguma maneira, sim. Mas, nós estamos dando cumprimento a vários compromissos que assumimos. O primeiro deles é que recebam verbas mais ou menos substanciosas para acolher os venezuelanos lá em Roraima. Primeiro ponto. Segundo ponto, estamos dando assistência médica. Terceiro ponto, nós estamos dando abrigo, naturalmente. Agora, reconheço que estão entrando muitos venezuelanos por dia aqui no Brasil. Às vezes, o abrigo não é suficiente para abrigar a todos, mas nós estamos fazendo a programação para abrigar a todos os venezuelanos. E outro ponto interessante é que recentemente eu adotei um decreto que cria uma identidade provisória para os refugiados. Esta identidade provisória para os refugiados, primeiro, os identifica e os identificando permite até que busquem trabalho, não aquele trabalho informal, mas até o trabalho formal. Sem embargo de criar problemas, nós estamos dando guarida e amparo àqueles que visitam o Brasil. Agora, há poucos dias esteve aqui o presidente [Juan Manuel] Santos, da Colômbia, e calcula que estejam entre 300 mil a 400 mil refugiados na Colômbia. Aqui, ainda estamos na faixa dos 50 mil, 60 mil. É problema? Sem dúvida. Mas o Brasil está tendo condições de acolhê-los".

Autonomia e independendência das instituições 

"A Operação Lava Jato significa apenas uma coisa: as instituições no Brasil estão funcionando. Interessante que já há as mais variadas observações nesse sentido e eu sempre sustentei a necessidade absoluta da observância do texto constitucional porque a Constituição é a primeira autoridade do Estado. A minha preocupação sempre é o descumprimento do texto constitucional, quando você descumpre a Constituição, você desorganiza a sociedade. O objetivo do direito, da Constituição é organizar uma sociedade. Se você tem o cumprimento rigoroso do texto constitucional, você tem tranquilidade jurídica e social no país. Como você cumpre o texto constitucional? Primeiro, você tem de preservar a harmonia e a independência entre os Poderes, não porque queiramos, mas porque a soberania popular do Estado brasileiro assim determinou e acho que isto está funcionando. Eles [os Poderes] hoje funcionam com toda tranquilidade. Não há impedimento ao exercício de nenhum Poder". 

Atuação do Ministério Público

"Em particular, o Ministério Público tem as prerrogativas porque tem autonomia funcional, que significa que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário não podem se intrometer nas questões internas do Ministério Público. O Ministério Público está exercendo o seu papel. Pode haver uma ou outra observação, mas serão observações de natureza jurídica. Ou seja, se o Ministério Público toma uma determinada providência perante o Judiciário, aquele que se ressente vai dizer os eventuais equívocos de natureza jurídica, não de natureza institucional. Não sei dizer se um ou outro esteja politizando. Eu quero dizer que a instituição não se politizou, usando uma expressão minha. Se você disser que um ou outro teve uma aspiração política, ou um ou outro pretendeu exercitar sua tarefa com um viso político até seria possível de concordar, mas o importante é falar da instituição. E a instituição funciona regularmente. Cumpre seu papel. O que você tem de diferenciar sempre digamos, assim, eu pego o Poder Legislativo, você não pode dizer que todos do Poder Legislativo agem da mesma maneira. Você não pode pegar o Poder Executivo e dizer o mesmo. Igualmente, o Judiciário. A mesma concepção se aplica ao Ministério Público. É possível que um ou outro se desvie de suas tarefas jurídicas. E se se desviar de suas tarefas jurídicas, receberá naturalmente a contestação também de natureza jurídica, naturalmente com os advogados das partes".

Impeachment

"As duas denúncias [anteriores] eram pífias. Tão pífias que o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados não teve a menor dúvida em rejeitá-las. Rejeitá-las não, impedir que elas prosperassem. Essa suposta terceira denúncia é uma campanha, oposicionista naturalmente, seja do Poder Legislativo, seja onde estiver sediado. Mas, é uma mera hipótese para desmoralizar o governo, mas não tem a menor possibilidade de prosperar. Eu diria que é mais pífia, de menor dimensão até do que as denúncias anteriores. Eu não tenho a menor preocupação. É apenas uma campanha deliberada para: 'Ah, pode vir uma terceira denúncia etc...' Isto é para tentar enfraquecer o governo. Mas, olha, se nós resistimos até hoje, podemos resistir mais quatro ou cinco meses. De fato, quando você aponta para "será?", seria, digamos assim, conveniente tratar da deposição de um presidente cinco meses antes, é porque um delito ele praticou. Se ele praticou um delito daqueles incontornáveis, evidentemente seria o caso de ele não permanecer um mês. Agora, se a pergunta se dirige ao Brasil, eu digo que esta possibilidade é, se fosse dar nota, seria nota zero".

Delações premiadas

"Eu tenho percebido é que, muitas vezes, o delator ele quer se livrar de uma eventual penalidade. Então, ele delata, não sei como é interrogado. Às vezes, é interrogado de uma maneira que faça com que ele: 'Olha se você dizer isso ou aquilo você se libera'. Eu não sei como isto acontece nos interrogatórios. Evidentemente que o delator tem sempre em vista que a delação pode livrá-lo de uma penalidade maior ou até livrá-lo de uma penalidade. Eu tive um caso concreto, que vocês conhecem, diz respeito a mim, em que o delator gravou e depois foi delatar e ao delatar criou as maiores inverdades. E sobre criar essas maiores inverdades, essas maiores inverdades foram depois denunciadas por ele próprio numa conversa, digamos assim, de má direção, entre ele, um assessor, um advogado e foi parar nas mãos do ex-procurador-geral e o ex-procurador-geral acabou pedindo a prisão daquele que me fez uma acusação. Ele ficou na prisão um bom período. Então, eu acho que a delação é uma coisa útil desde que devidamente estruturada, estabelecida. Se você toma a delação como um fato que vai apenas liberar o sujeito de uma pena maior, eu acho inútil".

Investigações via Ministério Público e Polícia Federal

"Eu acho que quem investiga é a Polícia Federal e naturalmente deve tomar os depoimentos juntamente com o Ministério Público, poderia aprovar a delação. Agora ela não é uma prova definitiva. Hoje em dia está acontecendo assim: o sujeito falou do beltrano e o beltrano está condenado. Ora, a delação é praticamente o início do processo. São os primeiros dados, se confirmados por outros vários dados que se compõe o processo. Vale dizer dos dias atuais. Se delata e pronto, o delatado está definitivamente condenado. Isto não pode acontecer porque o processo está praticamente se iniciando. Aliás, a delação é interessante. A delação deveria surgir, essa é a minha concepção jurídica, depois de uma série de fatos que autorizassem uma delação comprobatória daqueles fatos. A delação é o primeiro passo de um processo longo, depois tem de ser comprovado, verificar se o delator disse a verdade. Outros dados documentais, testemunhais deverão comprovar esta delação. Mas, respondendo objetivamente a sua pergunta, a delação tem prestado, muitas vezes, a que o delatado diga coisas que, às vezes, nem são verdadeiras. Não estou entrando no mérito das delações".

Vazamentos

"O que a Polícia Federal não pode fazer é intervir por meio de vazamentos. Ora, o processo é sigiloso. Eu tenho verificado com frequência que, quando o processo é sigiloso, a defesa entra com pedido para ter acesso e o acesso é negado, há o fundamento de que o processo é sigiloso. E a defesa se conforma com isso. Afinal, se sigiloso é, não se deve dar conhecimento a nenhuma investigação que esteja sendo feita. Quando a defesa, tenho observado isso, solicita o acesso aos autos e tem essa resposta, no dia seguinte, no dia seguinte, a matéria está nos jornais. Ora, não foi o jornalista, disse na minha manifestação, que sorrateiramente, na madrugada pegou o inquérito. Alguém vazou. Esta matéria não pode acontecer nem na Polícia Federal e em nenhum setor onde o processo seja sigiloso".

Episódio Joesley Batista

"Foi o mais injusto, porque na verdade, aliás interessante, inventou-se uma frase nessa gravação que não existe. A frase até vou aproveitar para dizer, a frase era: 'Estou dando dinheiro para o deputado tal para manter o silêncio dele'. Eu teria respondido: 'Mantenha isso'. Hoje as pessoas sabem, a imprensa sabe que esta frase não existe em toda gravação. Você pega a degravação inteira. Não existe esta frase. A frase que existe é essa: 'Estou de bem com ele'. Foi o que eu disse: 'Tem de manter isso. Mantenha isso'. Então é interessante que colocou-se esta frase como verdadeira, definitiva. E foi uma luta. Muitos já perceberam que não podem mais usá-la e o que é que dizem. Dizem o seguinte, publicam a matéria e dizem o seguinte: 'Mantenha isso'. Segundo a Procuradoria-Geral da República, a frase anterior teria sido essa. Mas, a frase não existe. É do diálogo. Então, eu digo o seguinte aquilo atrapalhou momentaneamente o Congresso Nacional, mas logo depois o Congresso Nacional retomou a sua atividade e vem aprovando as mais variadas matérias desde o ano passado".

Reeleição e hostilidades em São Paulo

"Olha, não seria este fato [episódio em São Paulo] que me faria desistir da reeleição. Eu posso não ir para a reeleição na medida em que eu comece a perceber o seguinte: você tem muitos candidatos. Não vou rotular porque não é de meu gosto. Mas eu vejo que tem rótulos de extrema esquerda, extema direita, rótulos de centro. Eu vejo que no chamado centro tem seis, sete ou oito candidaturas o que não é útil. Você tem de fazer o eleitor fazer suas opções. Você tem, vamos rotular outras vezes, embora não seja muito a meu gosto. Você tem alguém que o representa de extrema direita, outro que o representa de extrema esquerda. Tem que ter alguém que represente o centro. Para o eleitor, é muito importante. Mas, o fato de ter ido lá prestar solidariedade e soube prestar solidariedade, eu já havia tomado providências junto à Defesa Civil, que pertence ao Ministério da Integração Nacional, para adotar todas medidas necessárias para dar toda cobertura possível à Defesa Civil do estado e do municipio de São Paulo. Então, eu estava em São Paulo, eu achei que seria falta de autoridade eu não comparecer para prestar solidariedade e falar com a imprensa naquele local. Interessante que eu fui sozinho. Fui com outro carro sem nenhuma estrutura de segurança, falei com a imprensa que era meu objetivo, um dos meus objetivos, e depois houve agressões verbais e quase agressões físicas. Mas, o interessante isto não foi modo de me assustar. Pelo contrário, acho que tive uma reação de coragem e de autoridade. Não é coragem pessoal. É coragem de autoridade. Quem é presidente da República tem de enfrentar essas coisas. Lamento até que elas ocorram, mas tenho de enfrentar. Eu diria que este fato não é modo de na hipótese impedir da reeleição. Vale a pena. Não vale a pena. Não é isso". 

O senhor já tomou a decisão da reeleição?

"Não, isto vai até julho".

Sobre posição política

"Eu acho que sou um homem atento ao texto constitucional. Mais do que nunca eu digo que a nossa Constituição ela foi muito sábia porque ela soube, a Constituinte, soube reunir os princípios do Estado social com os princípios do Estado liberal. Veja, quando se trata do prestigiamento da iniciativa privada, do direito à propriedade, o que está escrito na Constituição, isto é fruto do Estado liberal. Quando você trata dos chamados direitos sociais, tem um capítulo de direitos sociais na Constituição, entre eles o direito à moradia, à alimentação, vamos dizer assim, o Minha Casa, Minha Vida se inspira no direito à moradia que é um preceito constitucional. A própria Bolsa Família se inspira no direito da alimentação. São princípios constitucionais. Então eu me considero um homem pautado pelo direito, pelo texto constitucional. Eu me guio pelo que diz o Livro, pelo que diz a Constituição Federal. Se isso é ser de centro, eu posso ser rotulado de centro. Mas eu sou mais legalista".

Mudar o sistema de indicação dos ministros do Supremo Tribunal Federal

"Quando participei da Constituinte, eu propus uma fórmula para o Supremo Tribunal Federal que estabelecia o seguinte: primeiro que ele cuidaria apenas de questões constitucionais. Especialmente hoje que temos uma Constituição muito pormenorizada, muito detalhada, o número de ações diretas de inconstitucionalidade e mesmo de constitucionalidade, ou ainda os mandados de injunção, as ações de controle da constitucionalidade das leis são inúmeras. Então, dizia eu, naquela época que é melhor que ter uma Corte que examine apenas as questões constitucionais. Primeiro ponto. Segundo ponto: eu propunha uma Corte com nove membros: três indicados pelo Legislativo, três indicados pelo Judiciário e três pelo Executivo. Todos com mandato de 12 anos, renováveis por 12 anos ou seis anos, parceladamente. Mas isso não passou na Constituinte. Eu confesso que, eu prezo muito os juristas que estão no Supremo Tribunal Federal, claro, há divergências porque o Direito comporta interpretações. Há interpretações divergentes. Até muito divergentes hoje no plenário do Supremo Tribunal Federal. Mas cada um muito alicerçado nas suas concepções da ordem jurídico constitucional. Mas, eu ainda mantenho um pouco essa ideia de que se nós tivéssemos um Supremo com indicação, ao invés de só o presidente da República, tivéssemos a indicação do Judiciário, do Legislativo e do Executivo, eu penso que seria mais útil".

Proposta de indicação deve ser resgatada

"É um modelo muito saudável, que tenha a participação direta dos Três Poderes. Veja os Poderes do Estado, eles representam exatamente a soberania popular, a ideia da separação dos Poderes é essa. Você ter órgãos que exerçam funções".

Intervenção federal no Rio de Janeiro

"Em primeiro lugar a intervenção não é militar. Se fala muito em militar. Mas a intervenção é civil. É constitucional. Eu designei um general para comandar a intervenção, mas ele comanda com a Polícia Civil e a Polícia Militar do Rio de Janeiro. Primeiro ponto. Segundo ponto, desde o momento em que nós determinamos a intervenção, nós registramos que essas questões não se resolvem de um dia para outro ou de um mês para outro. Fui secretário de Segurança Pública de São Paulo duas vezes, em cada uma delas, fiquei praticamente três anos. E quando começava uma atividade de combate à criminalidade, por exemplo, eu percebia e tinha a absoluta convicção que só dali a três ou quatro meses teria resultado. Primeiro ponto. Segundo ponto, é que a presença da intervenção ou dos interventores federais no Rio de Janeiro começou a dar uma sensação de segurança no Rio de Janeiro. Terceiro ponto, é que a segurança pública, hoje comandada pelo interventor, tem feito, lá na Vila Kennedy, por exemplo, fez várias operações que deram muita tranquilidade ao povo daquela região. Nós estamos praticamente a dois meses da intervenção decretada, ela começa ou começará a dar resultados agora, embora já tenha dado. Você sabe que muito recentemente eles apreenderam lá no Porto do Rio de Janeiro uma tonelada e meia quase de drogas. Isso é resultado da presença forte e interventiva que se deu no Rio de Janeiro. De outro lado, também nestas questões, você veja que lá nos morros, as milícias, senão as milícias, a temeridade colocavam barreiras e eles tiveram a paciência de ir lá, quase que diariamente, para retirar esses concretos. Ou seja, dando uma certa tranquilidade à população. Há um mínimo de segurança já apresentada. Agora, o mais virá com o tempo. Não é de um dia para outro".

Replicar o modelo de intervenção federal em outros estados

"Eu só não fiz a intervenção, como criei o Ministério Extraordinário de Segurança Pública. A segurança pública é uma competência dos estados brasileiros. Nós não vamos invadir a competência dos estados. Nós vamos coordenar e integrar a segurança pública em todo o país. Portanto, eu não digo replicar a intervenção, mas replicar por meio do Ministério Exrraordinário da Segurança Pública esta presença efetiva da União na integração e coordenação da segurança em todos estados da  Federação".

Aumento do número de crimes durante a intervenção estaria associado ao enfrentamento

"Não é improvável. Aliás, desde o primeiro momento se falava que poderia haver como está havendo uma reação ostensiva às Forças Armadas, mas às forças que estão atuando mais diligentemente lá no Rio de Janeiro. Não é improvável. É muito provável e já era mais ou menos previsto".

Legado do governo Temer

"Queda da inflação, a queda dos juros e as 500 mil vagas criadas em tempo integral na área da educação. No meio ambiente, nós tomamos atitudes que não foram tomadas nos governos anteriores. Só para dar um exemplo muito concreto, primeiro, o desmatamento diminuiu em mais de 16% no país. Nós fizemos a maior reserva marinha ambiental. São quilômetros do mar protegidos ambientalmente. Na Chapada dos Veadeiros [GO], nós ampliamos em 400% [a área preservada].  Na agricultura, que com os empréstimos do Banco do Brasil, bateu recorde no ano passado e baterá recorde neste ano. A saúde que era um tópico muito complicado, o fato é que conseguimos uma economia substanciosa, que está permitindo a entrega de milhares de ambulâncias e gabinetes odontológicos. Volto a dizer o Bolsa Família que nós já demos dois aumentos para o Bolsa Família e conscientes de que não se deve manter permanentemente a ideia de uma família na dependência alimentar".

* A entrevista exclusiva foi conduzida pelos jornalistas da TV Brasil e da NBR com a participação de profissionais de vários veículos da EBC.