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Paraisópolis: Mãe acusa polícia de agredir filha com garrafa

Paula Felix, Marco Antonio Carvalho, Cecília do Lago e Daniel Fernandes

São Paulo

02/12/2019 07h43

Nove pessoas morreram pisoteadas e 12 ficaram feridas durante tumulto após ação da Polícia Militar em baile funk na comunidade de Paraisópolis, zona sul de São Paulo, na madrugada deste domingo, dia 1º. A corporação afirma que os agentes de segurança perseguiam dois suspeitos em uma moto, quando entraram no local da festa, que reuniu cerca de 5 mil pessoas. Já moradores, em relatos e vídeos, acusam os PMs de agir com truculência. O Estado informou que vai investigar as circunstâncias das mortes para apontar se houve excessos.

A mãe de uma jovem de 17 anos relatou que a adolescente foi agredida por um policial militar durante a correria no baile funk. "Ela levou uma garrafada na região da cabeça. Levou pontos no centro da testa, em volta do olho e no queixo. Deve ter levado uns 50 pontos. Ela afirma que foi agredida por um policial e está com marcas de cassetete nas costas", conta a dona de casa, de 36 anos, que pediu anonimato.

Ela afirma que não sabia que a filha estava na festa, mas descobriu ainda na madrugada, quando recebeu ligação do posto de saúde. A família mora em Pirituba, zona norte. Segundo o relato da jovem, os participantes do baile teriam ficado cercados em ruas estreitas durante a ação policial. "Ela já tinha ido lá outras vezes, escondida. Minha filha relata que acontecia o baile e os policiais fecharam os dois lados. Eram mais de duas viaturas de cada lado. Tinha uma viela e vieram os PMs, cercaram entrada e saída. No desespero, não tinha para onde correr."

A agressão teria ocorrido quando a jovem tentou ajudar outra garota, que também estaria sendo agredida por um PM. "Ela saiu de perto do namorado e, quando foi levantar a menina, o policial 'tacou' a garrafa na cara dela. Ela ficou internada 12 horas porque fez tomografia do crânio para ver se não tinha sangramento ou fratura. Quem sobreviveu nasceu de novo."

Trancados

O dono de um bar na comunidade, que também não quis ser identificado, disse que o baile ocupava de três a quatro quarteirões. Segundo ele, os PMs apareceram uma vez e logo depois voltaram disparando balas de borracha e bombas de gás no início da madrugada. Relatou não ter visto a perseguição descrita pela PM.

Ao ver a confusão, disse, baixou a porta e acolheu oito pessoas que estavam com um "paredão" de som na frente do bar. Desligaram a luz e ficaram em silêncio por horas. Saíram só quando o dia já estava claro. Na versão da PM, porém, o episódio teria sido por volta das 5h30, quando já havia amanhecido.

O público que frequenta o bar aos sábados tem perfil diferente daquele de outros dias. Pedreiros, pintores e operários dão lugar a jovens com "paredões" de som que se proliferam em dia de baile. A festa onde houve o tumulto é a da 17, uma das maiores da região, referência a um antigo comerciante que deu início ao evento há dez anos. O baile prosperou e, aos sábados, atrai milhares em uma mistura com festas menores.

O dono do bar disse que é comum a ver a PM na área. "Às vezes são educados, chegam e pedem para fechar. Em outras, lançam bomba aqui dentro e batem nos frequentadores." Procurada, a Secretaria de Segurança Pública disse que, por ser domingo, não conseguiria apurar e se manifestar sobre relatos de supostas violências ocorridas em outros dias.

Vídeo flagra PMs agredindo jovens já rendidos após baile funk em Paraisópolis

UOL Notícias

Clima tenso

Moradores têm relatado escalada da tensão em Paraisópolis após o assassinato de um sargento da PM há um mês. Segundo líderes comunitários, lá aumentaram ações policiais, com relatos de ameaças e truculência.

Nas redes sociais, moradores vinham comentando sobre possível "invasão" da PM na comunidade. "Os moradores estão com medo, e nos enviam relatos de agressões e ameaças constantes", disse Marisa Fefferman, da Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio, grupo que busca que dar visibilidade a casos de abuso nas periferias.

"O baile funk (aumentou) por conta da ausência do Estado, que não investe em equipamentos de lazer para a comunidade. Cresceu de forma desorganizada. O baile cresceu, mas nunca teve solução, só repressão", disse Gilson Rodrigues, líder comunitário de Paraisópolis. Segundo moradores, esses bailes também se tornaram motivo de incômodo frequente, por causa do barulho e das aglomerações.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública não se manifestou sobre os relatos ou o suposto elo com a morte do PM.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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