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O exército de analfabetos do Afeganistão

01/03/2014 20h26

Aproximadamente metade dos homens nas forças de segurança do Afeganistão são analfabetos, apesar de investimentos milionários dos Estados Unidos em programas de ensino, de acordo com um levantamento feito pelo órgão americano que supervisiona os projetos de reconstrução do país.

"Eu sempre lamentei não saber ler e escrever", diz Ali Akbar, um soldado de 34 anos do Exército afegão.

Nascido na província de Ghazni, no leste do país, ele começou o serviço militar em 2008 e foi incluído no programa de combate ao analfabetismo no Exército três anos depois.

"Eu fiquei nas nuvens quando eles me contaram", afirmou Akbar. Mas as aulas não funcionaram como ele esperava.

O curso básico de alfabetização que ele frequentou tinha o objetivo de ajudá-lo a ler e escrever todas as letras do alfabeto e os números até mil, além de escrever seu próprio nome e reconhecer palavras curtas.

Mas depois de 64 horas de aulas ele ainda não consegue escrever mais do que as primeiras três letras de seu nome.

"Os cursos eram muito curtos, e havia muito para aprender. Para alguém da minha idade, é preciso mais tempo para praticar", diz.

De acordo como Ministério da Educação afegão, apenas cerca de um terço dos cidadãos do país sabe ler e escrever.

Depois de três decadas de guerra civil, muitas pessoas ainda não tiveram a oportunidade de frequentar a escola e muitas outras, como Ali, receberam somente a educação básica.


Em 2009, os Estados Unidos lançaram um programa de alfabetização de US$ 200 milhões (R$ 466 milhões), com o plano de fazer com que todos no serviço militar alcançassem pelo menos o padrão básico internacional até o fim de 2014, quando as tropas americanas devem se retirar do país.

Mas um relatório recente do órgão Inspetor Especial para a Reconstrução do Afeganistão (Sigar, na sigla em inglês), diz que os militares americanos já admitem que o objetivo provavelmente não será alcançado.

É um grande obstáculo para as tentativas do Afeganistão de construir um exército moderno e eficiente.

Dificuldades para soletrar

Ali diz que um dos maiores problemas do curso de alfabetização era o foco na entrega, e não nos resultados - algo que relatório do Sigar também ressaltou.

"Nossos professores não eram ruins, mas eles eram contratados para dar os cursos, então não se importavam se nós aprendíamos ou não."

"Meu irmão, que ainda está na escola, consegue me ensinar melhor como soletrar as palavras", compara.

Outra razão pela qual as taxas de alfabetização permanecem tão baixas é a alta rotatividade no Exército afegão.

O Sigar afirma que aproximadamente metade dos soldados que termina os cursos, deixa o serviço militar.

"Alguns dos nossos colegas que aprendiam rápido já deixaram o Exército. Quando eles aprenderam a ler e escrever, puderam encontrar empregos melhores", diz Ali.

Autoridades que supervisionam o programa de alfabetização estão considerando as recomendações do Sigar para melhorar os cursos.

Ali, enquanto isso, espera que seu filho pequeno aprenda a ler na escola e consiga ler para o pai um dia.

No momento, ele diz que adora passar páginas de revistas e ver as imagens, mas as palavras ainda não fazem sentido.

"Ser analfabeto é como ser cego", diz.