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Quatro frases-chave explicam a tensão desta semana em Brasília

Ricardo Senra - Enviado especial da BBC Brasil a Brasília

28/03/2016 08h59

Foram cinzas, chuvosos e desertos os dias que antecederam, em Brasília, a semana mais importante desde o início das discussões sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Completamente esvaziada pelo feriado prolongado da Semana Santa, a capital do país volta ao centro das atenções nesta terça-feira, quando o PMDB deve anunciar o desfecho de seu conturbado processo de afastamento do governo.

O vice-presidente Michel Temer assume a Presidência da República interinamente nesta quinta-feira, enquanto Dilma participa de reuniões em Washington, nos Estados Unidos.

Na semana passada, Temer se reuniu privadamente com o senador Aécio Neves, em São Paulo. O presidente do PSDB comentou publicamente o encontro, sugerindo uma articulação entre tucanos e PMDB para um futuro governo, em caso de impeachment.

Dos salões de mármore da praça dos Três Poderes para as ruas, o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) organiza, também na quinta, um megaprotesto em Brasília e outras cidades. Críticos ao governo, mas contrários ao impeachment, eles dizem que levarão mais de 100 mil à capital federal.

Por fim, a qualquer momento da semana, novidades sobre a "colaboração definitiva" da Odebrecht com a operação Lava Jato, anunciada na última terça-feira (mas a existência do acordo foi negada pelo Ministério Público), podem, se confirmadas, estremecer novamente lideranças de partidos governistas e da oposição.

Entenda, a seguir, o que deve acontecer nesta semana que - ao contrário do feriado - promete ser de alta temperatura política em Brasília.

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  • Dilma Rousseff: "Queremos muito que o PMDB permaneça no governo"

Nesta terça-feira, uma reunião do PMDB pode resultar no rompimento do principal partido da base aliada com o governo Dilma.

Em visita ao Centro de Operações Espaciais de Brasília, na última quinta, Dilma disse "querer muito que o PMDB permaneça no governo" e "ter certeza de que nossos ministros estão comprometidos com sua permanência".

O apelo ocorreu no mesmo dia em que o principal aliado do governo no partido, o diretório do Rio de Janeiro, anunciou que deixará a base aliada. Até o momento, 14 dos 27 diretórios peemedebistas fizeram o mesmo.

A primeira reação prática da presidente ao possível divórcio foi a demissão, também na quinta-feira, de um assessor indicado pelo vice-presidente Michel Temer - apontado como um dos articuladores da debandada.

Do outro lado, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, e a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, já anunciaram que não devem abandonar o governo.

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  • Aécio Neves: "Estive em SP com Michel Temer e tivemos uma conversa republicana"

O vice-presidente Temer também se reuniu com o presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, em São Paulo.

Classificada de forma enigmática pelo senador tucano como "uma conversa republicana", o encontro reforça a tese de uma dobradinha entre os dois partidos em caso de afastamento de Dilma.

Em entrevista ao jornal Estado de S.Paulo , outro nome de peso do PSDB, o senador José Serra (PSDB-SP), falou em nome de Temer e disse que o vice deve assumir compromissos com a oposição e se comprometer a não concorrer à reeleição, além de não interferir nas eleições municipais deste ano.

Temer reagiu, em nota, dizendo que não precisa de intermediários "quando tiver que anunciar algum posicionamento".

"Michel Temer não tem porta-voz, não discute cenários políticos para o futuro governo e não delegou a ninguém anúncio de decisões sobre a sua vida pública", diz a nota.

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  • Guilherme Boulos: "País será incendiado por greves, ocupações e travamentos se houver golpe"

"O recado tá dado: não pensem que os trabalhadores ficarão parados observando o golpe passar", diz o convite do MTST para o "Dia de Mobilização Nacional", marcado para quinta-feira em Brasília e outras cidades pelo país.

O protesto deve ser diferente dos tradicionais atos organizados por grupos pró-impeachment ou por centrais sindicais, a favor do governo.

Críticos contundentes da gestão petista mas contrários ao afastamento da presidente, os membros das frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular devem pedir o fim do ajuste fiscal e dos cortes em programas sociais, o afastamento de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados e réu na Lava Jato, e a extinção das discussões sobre a reforma da Previdência.

Em entrevista coletiva na última terça-feira, Guilherme Boulos, coordenador nacional do MTST, disse que o país será "incendiado por greves, ocupações e travamentos", caso Dilma seja afastada ou Lula seja preso. "Não haverá um dia de paz do Brasil", continuou Boulos.

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  • Odebrecht: "Decidimos por uma colaboração definitiva com as investigações da Lava Jato"

A "colaboração definitiva" da Odebrecht com a Lava Jato, anunciada pela empreiteira na última semana, já é chamada pela imprensa nacional de "delação das delações" - ainda que a existência de um acordo de delação tenha sido negada pelo Ministério Público.

O trailer aconteceu na semana passada, quando foram divulgadas planilhas apreendidas na casa de um executivo da Odebrecht pela Polícia Federal. Elas caíram como uma bomba nos corredores do Congresso e trouxeram ao centro da Lava Jato nomes de pelo menos 280 políticos de todas as cores partidárias ? dos opositores PSDB e DEM e aos governistas PT e PCdoB, incluindo o indeciso PMDB.

Horas após a divulgação, o juiz Sergio Moro ordenou o sigilo das planilhas e, nesta segunda-feira, encaminhou-as ao Supremo Tribunal Federal, juntamente com outros materiais da investigação das fases 23 e 26 da Lava Jato.

Não se sabe ainda o que exatamente significam os nomes e números associados aos políticos ? a expectativa é que novidades sobre as denúncias e sobre a aceitação ou não da delação da Odebrecht pela Procuradoria Geral da República sejam anunciadas a qualquer momento, durante a semana.

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