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'Novos brasileiros': os imigrantes africanos que estão mudando a cara de São Paulo

Família nigeriana após culto evangélico no centro de São Paulo - Diego Padgurschi
Família nigeriana após culto evangélico no centro de São Paulo Imagem: Diego Padgurschi

20/11/2018 15h03

Habituado a caminhar pelo centro de São Paulo, o fotógrafo Diego Padgurschi viu a região se transformar na última década com a chegada de levas de imigrantes e refugiados africanos.

Vindos de Angola, Nigéria, Senegal, Gana, Guiné-Bissau, Mali, Guiné e República Democrática do Congo, entre outras nações, muitos traziam na bagagem tecidos coloridos e máscaras tradicionais, que passaram a vender nas ruas que há um século fervilhavam com imigrantes italianos, espanhóis, libaneses e japoneses.

Outros abriam restaurantes típicos, mercadinhos e salões de beleza. 

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Mulher senegalesa em São Paulo; segundo a Secretaria Nacional de Justiça, 4.785 africanos pediram refúgio no Brasil em 2017
Imagem: Diego Padgurschi

Não há dados precisos sobre a presença de africanos em São Paulo, pois nem todos estão no cadastro de estrangeiros da Polícia Federal.

Segundo a corporação, 292.288 estrangeiros se mudaram para a cidade entre 2001 e 2017.

A Secretaria Nacional de Justiça, por sua vez, registrou 161 mil pedidos de refúgio no Brasil desde 2010. O ano com mais solicitações foi 2017, com 33.866, das quais ao menos 4.785 foram feitas por africanos.

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Homem senegalês em São Paulo; trabalho foi inspirado nas obras dos fotógrafos malineses Seydou Keita, Malick Sidibè e Adama Kouyaté
Imagem: Diego Padgurschi

Igreja evangélica nigeriana

Inspirado nos fotógrafos malineses Seydou Keita, Malick Sidibè e Adama Kouyaté, celebrizados pelos retratos de pessoas comuns nas ruas do Mali no século passado, Padgurschi montou um estúdio móvel e foi atrás de dois dos mais numerosos grupos de africanos em São Paulo: nigerianos e senegaleses.

Primeiro, instalou-se num domingo à porta de uma igreja evangélica nigeriana na avenida Rio Branco, no centro da cidade, montou os equipamentos e ficou à espera de quem quisesse posar.

Depois, repetiu os passos ali perto, na Praça da República, onde todas as segundas-feiras senegaleses se reúnem para uma sessão de batucadas intercaladas por leituras do Alcorão.

Padgurschi diz que, no início, foi recebido com desconfiança. "Muitos perguntavam quanto as fotos custariam. Quando dizia que não queria nada, achavam ainda mais estranho", ele conta à BBC News Brasil.

Após várias visitas, foi ganhando a confiança do grupo. Para deixá-los à vontade, não pedia qualquer informação pessoal dos fotografados.

Deu certo. Ao longo de um ano, Padgurschi fez cerca de 3 mil fotos de africanos e seus filhos, vários deles nascidos no Brasil.

Batizado de "Novos Brasileiros", o trabalho buscou retratar a comunidade de uma maneira pouco habitual.

"Vemos muitas reportagens com tom de denúncia mostrando as duras condições de vida e de trabalho que os imigrantes e refugiados enfrentam no País. Já eu tentei retratá-los de uma forma digna, quis fazer fotos que eles pudessem guardar", explica.

Cada vez que voltava aos locais, Padgurschi levava as imagens impressas e as distribuía aos retratados.

Africanos escravizados no Brasil

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Retratos foram feitos utilizando um estúdio móvel
Imagem: Diego Padgurschi
Padgurschi lembra que a chegada dos africanos se insere numa longa história que o Brasil mantém com o continente, marcada por um dos aspectos mais sombrios da formação do país - a escravidão negra.

Segundo o The Trans-Atlantic Slave Trade Database, uma iniciativa internacional de catalogação de dados sobre o tráfico de pessoas escravizadas, navios portugueses ou brasileiros embarcaram suas vítimas em quase 90 portos africanos, fazendo mais de 11,4 mil viagens.

Dessas, 9,2 mil tiveram como destino o Brasil.

Estima-se que 4,9 milhões de africanos tenham desembarcado no país naquela época. Nenhum outro lugar do mundo recebeu tantos escravizados. Nos Estados Unidos, em comparação, foram 389 mil.

Diferentemente dos que chegaram naquele período, Padgurschi diz que os africanos que desembarcam hoje no país não serão forçados a romper os laços com a terra natal.

"Nenhum negro brasileiro tem seu sobrenome africano, mas sim o de quem o escravizou. Já os africanos que estão aqui agora poderão repassar seus nomes aos filhos e netos, que saberão de onde vieram seus antepassados."

"Meu trabalho se propõe a fazer um registro dos novos africanos, que vão conseguir manter uma conexão com suas origens muito maior do que os escravos, que tiveram suas histórias apagadas."