Crise política no Peru: Lava Jato, Fujimoris e outras questões por trás do impasse entre presidente e Congresso
Além de estar ligada à liberdade ou à prisão de políticos acusados de corrupção, a eleição de membros do Tribunal Constitucional é chave também porque a Corte terá que decidir se a dissolução do Congresso foi constitucional, e assim influenciar a disputa entre Poder Executivo e Congresso, ou melhor, governo e oposição.
A crise política que vive o Peru tem como pano de fundo a luta pelo controle do Tribunal Constitucional, instância judicial máxima do país. Paradoxalmente, esta instituição foi o pivô da dissolução do Congresso e dará a palavra final sobre o atual confronto entre Executivo e Legislativo.
O gatilho da crise se deu em torno da renovação de 6 das 7 cadeiras do tribunal. O presidente da República, Martín Vizcarra, questionou formalmente o processo de escolha dos magistrados adotado pelo Congresso sob alegação de falta de transparência e de separação entre os Poderes.
Mas os congressistas de maioria opositora ignoraram o pedido e elegeram um novo nome para a Corte: um primo do presidente do Congresso, Pedro Olaechea.
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Vizcarra decidiu então dissolver a Casa, que reagiu no mesmo dia suspendendo o presidente e empossando a vice, Mercedes Aráoz. No dia seguinte, em nova reviravolta, ela renunciou ao posto de "presidente interina".
Mas por que a escolha de seleção de magistrados para o Tribunal Constitucional é tão sensível para a classe política a ponto de disparar uma crise institucional?
Parte considerável da resposta passa hoje pela Operação Lava Jato e o acordo de colaboração da empreiteira brasileira Odebrecht envolvendo suborno e lavagem de dinheiro.
O escândalo de corrupção arrastou quatro ex-presidentes peruanos para a crise, além da líder da oposição, Keiko Fujimori, que hoje está presa. Em abril deste ano, o ex-mandatário Alan García cometeu suicídio pouco antes de ser detido. Todos negaram irregularidades.
Além de estar ligada à liberdade ou à prisão de políticos acusados de corrupção, a eleição de membros do Tribunal Constitucional é chave também porque a Corte terá que decidir se a dissolução do Congresso foi constitucional, e assim influenciar o equilíbrio de forças entre Poder Executivo e Congresso, no caso, entre governo e oposição.
A liberdade de Keiko Fujimori...
O presidente peruano acusou a oposição de tentar utilizar o Congresso e os tribunais para se proteger de investigações criminais em andamento.
"A maioria parlamentar recorre a inúmeros argumentos e truques, destinados a prejudicar não apenas o governo mas também a sociedade em geral", afirmou Vizcarra em seu pronunciamento televisionado, no qual anunciou a dissolução do Congresso.
O principal nome da oposição envolvido no escândalo da Odebrecht é o de Keiko Fujimori, líder oposicionista e filha do ex-presidente autoritário Alberto Fujimori.
Ela, que apresentou à Corte um pedido para revogar sua prisão preventiva, está detida desde outubro de 2018 em meio a acusações de lavagem de dinheiro oriundo de subornos pagos pela construtora brasileira Odebrecht.
Em 12 de setembro, a Justiça peruana já havia reduziu de 36 meses para 18 meses o tempo de prisão preventiva, período que se encerra em abril.
A comissão do Congresso responsável pela renovação do Tribunal Constitucional sugeriu 11 nomes para 6 cadeiras no órgão. Entre eles está o de Wilber Medina, que se manifestou recentemente em redes sociais a favor da anulação da prisão preventiva de Keiko Fujimori.
Outros dois cotados, Ernesto Álvarez e Carlos Hakansson, também se manifestaram a favor da libertação da filha do ex-presidente peruano. Cada integrante da Corte tem um mandato de cinco anos, sem reeleição imediata.
...e de Alberto Fujimori
O Tribunal Constitucional terá que decidir também sobre um recurso apresentado em 20 de setembro que pede a liberdade do ex-presidente Alberto Fujimori.
Alberto Fujimori voltou à prisão em janeiro deste ano a fim de terminar de cumprir a pena de 25 anos de prisão por crimes contra a humanidade. Ele havia sido condenado em 2009.
Ele voltou a ser preso depois que decisões judiciais anularam o indulto concedido a ele pelo então presidente Pedro Pablo Kuczynski, que derrotou Keiko em eleição apertada em 2016.
A Justiça peruana considerou o processo de perdão presidencial irregular, entre outros motivos, por causa da negociação política que envolvia a libertação do ex-presidente em troca do apoio parlamentar do fujimorismo a Kuczynski, evitando sua deposição.
Mas ele acabaria renunciando em março de 2018. Eleito com promessas de modernização do país e combate à corrupção, Kuczynski entrou em decadência ao ser alvo de acusações ? as quais nega ? de ter ocultado pagamentos da Odebrecht a empresas vinculadas a ele entre 2004 e 2013.
Em seu lugar assumiu Martín Vizcarra, que disse ter entre suas prioridades o combate à corrupção, melhorias na educação e a busca por estabilidade institucional e governabilidade do país, apesar do desafio de lidar com um Congresso controlado pela oposição.
O caso Odebrecht
A crise atual se desenrola às vésperas do depoimento de Jorge Barata, ex-diretor da Odebrecht no Peru, ao Ministério Público. Estima-se que ele revele nomes de congressistas cujas campanhas eleitorais foram financiadas irregularmente pela construtora.
O fechamento do acordo, que permite aos investigadores terem acesso a depoimentos e investigações, é alvo de críticas da oposição fujimorista, mas foi avalizado pela Justiça peruana.
Se esse acordo for anulado em algum momento, praticamente levaria ao fracasso de todas as investigações do caso Odebrecht em torno de suborno e lavagem de dinheiro. O escândalo da empresa brasileira envolveu alguns dos nomes mais importantes da política peruana, como os ex-presidentes Alejandro Toledo, Ollanta Humala, Pedro Pablo Kuczynski e Alan García, que se matou em abril para evitar a prisão.
O suicídio de García foi o capítulo mais dramático do escândalo da Odebrecht no Peru, investigado pela Equipe Especial Lava Jato no país.
A Odebrecht admitiu ter pago US$ 29 milhões de propina no Peru, entre 2005 e 2014, em troca da obtenção de contratos. Estes pagamentos teriam resultado em benefícios de US$ 143 milhões para a empreiteira no mesmo período.
Em fevereiro deste ano, a empreiteira assinou um acordo de colaboração com os promotores da Lava Jato no país, no qual se comprometeu a fornecer informações e pagar uma indenização de cerca de US$ 230 milhões.
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