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Jerusalém e Gaza: por que a nova onda de violência era 'inevitável'

Jeremy Bowen - Editor de Oriente Médio da BBC News

12/05/2021 09h27

Uma nova rodada de violência entre israelenses e palestinos está ocorrendo agora e a lógica não muda: o conflito não resolvido entre judeus e árabes.

A mais recente onda de violência envolvendo Israel e Palestina, iniciada na segunda-feira (10/5), segue se agravando.

Até a noite desta quarta-feira (horário do Brasil), pelo menos 72 pessoas já haviam morrido ? 65 em Gaza e 7 em Israel. Há crianças entre as vítimas nas duas localidades.

Após semanas de tensão em Jerusalém, eclodiram na noite de segunda-feira ataques aéreos e com mísseis, além de conflitos locais entre judeus e muçulmanos em várias cidades israelenses.

Desde o início da semana, militantes palestinos dizem ter disparado 130 foguetes em direção a Israel, como resposta a um ataque que destruiu a torre de al-Sharouk, na cidade de Gaza, que abrigava escritórios do Hamas, o grupo palestino que controla Gaza.

Já as forças armadas de Israel afirmaram na quarta-feira que os ataques aéreos que fez a Gaza foram os maiores desde 2014, resultando na morte de membros da alta cúpula do Hamas ? que por sua vez confirmou que um comandante e "outros líderes" morreram.

O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu afirmou na noite de quarta que pretende enviar militares para ajudar a polícia em cidades destruídas pela violência.Netanyahu classificou os ataques nos últimos dias como "anárquicos".

"Nada pode justificar um grupo árabe agredindo judeus, e nada pode justificar um grupo judeu agredindo árabes", disse ele em um vídeo.

Já a Autoridade Palestina escreveu no Twitter que o "ataque militar" de Israel está "traumatizando uma população já sitiada de 2 milhões de pessoas".

As bases do conflito

Na nova onda de violência que atinge Israel e a Faixa de Gaza, uma lógica permanece inalterada: o conflito não resolvido entre judeus e árabes que tem arruinado e acabado com as vidas de palestinos e israelenses por gerações.

É uma ferida aberta no coração do Oriente Médio e o fato de o conflito ter desaparecido das manchetes internacionais nos últimos anos não significa que ele tenha acabado. Os problemas não mudam, nem o ódio e a amargura que atravessam não apenas anos, mas gerações.

Por mais de um século, judeus e árabes lutam para dominar a faixa de terra entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo.

Israel infligiu uma série de derrotas esmagadoras aos palestinos desde que foi criado como Estado em 1948, mas ainda não pode se declarar vitorioso.

E enquanto o conflito continuar, nenhum dos lados estará seguro.

A única certeza é que de tempos em tempos, no mínimo, haverá uma crise grave e violenta.

O padrão dos últimos 15 anos frequentemente envolveu combates na área que separa Gaza de Israel.

O problema de Jerusalém

A explosão de violência desta vez tem sido um lembrete de que Jerusalém e seus locais sagrados têm uma capacidade incomparável de acirrar os ânimos.

A importância da cidade para cristãos, judeus e muçulmanos não é apenas uma questão religiosa.

Os locais sagrados judeus e muçulmanos também são símbolos nacionais. Geograficamente, eles estão literalmente lado a lado. A Igreja do Santo Sepulcro, venerada pelos cristãos palestinos, fica próxima a um posto de controle israelense.

O que há de novo agora

Os novos gatilhos para o mais recente confronto incluem ameaças de despejo de palestinos de suas casas em Sheikh Jarrah.

Trata-se de um bairro palestino fora dos muros da Cidade Velha de Jerusalém, com terras e propriedades reivindicadas por grupos de colonos judeus em tribunais israelenses.

Isso é mais do que uma mera disputa por um punhado de casas. Ela acontece depois de anos de sucessivos governos israelenses buscando tornar Jerusalém mais judaica.

Grandes assentamentos para judeus foram construídos em terras ocupadas ao redor da cidade, em violação a normas do direito internacional.

Nos últimos anos, o governo e grupos de colonos trabalharam para estabelecer judeus israelenses em áreas palestinas próximas à murada Cidade Velha.

O novo estopim

Somado a isso nas últimas semanas, houve a severa vigilância israelense dos palestinos durante o Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos. Foram usados spray de pimenta e granadas de choque dentro da Mesquita de Al-Aqsa, o lugar mais sagrado para os muçulmanos depois de Meca e Medina.

O Hamas deu o passo incomum de emitir um ultimato a Israel para retirar suas forças do complexo de Al-Aqsa e Sheikh Jarrah, e então disparou foguetes contra Jerusalém.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, tuitou: "As organizações terroristas em Gaza cruzaram a linha vermelha ... Israel responderá com grande força."

Outra combinação de eventos poderia ter terminado da mesma maneira. Eventos violentos assim acontecerão repetidamente enquanto o conflito não for resolvido.

O conflito tem solução?

Um apresentador da BBC me perguntou recentemente, quando a crise estava se agravando, quando foi a última vez que tive esperança de que os dois lados encontrariam uma maneira de coexistir em paz.

Morei em Jerusalém de 1995 a 2000 e voltei muitas vezes depois disso.

Achar uma resposta para essa pergunta foi difícil.

No auge do processo de paz de Oslo na década de 1990, houve um breve momento de esperança, mas apenas os residentes de Jerusalém na casa dos 40 anos terão lembrança daquele tempo.

Líderes de ambos os lados têm travado suas próprias batalhas políticas internas, concentrando-se em salvaguardar suas próprias posições, quando o maior problema para qualquer líder palestino ou israelense deveria ser obter a paz.

Esse desafio não foi abordado seriamente por anos.

Algumas novas ideias surgiram.

Dois conceituados centros de pesquisa, o Carnegie Endowment for International Peace e o US/Middle East Project acabam de publicar um relatório conjunto argumentando que a primeira prioridade deve ser direitos iguais e segurança igual para palestinos e israelenses.

Eles dizem que os EUA devem apoiar "a igualdade total e o direito de voto para todos os que residem no território sob controle israelense; não devem apoiar dois sistemas separados e desiguais".

Um novo pensamento é algo positivo. No entanto, as realidades desta semana, a retórica que soa familiar e a mais recente erupção de um conflito de um século estão abafando todo o resto.


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