'Quem dominar o ar vence a guerra': a dura batalha para controlar o céu da Ucrânia
Em entrevista à BBC, oficial da defesa aérea da Ucrânia explica as dificuldades enfrentadas pelos militares de seu país para tentar conter avanço russo.
Grande parte do foco da guerra na Ucrânia até agora tem sido sobre a batalha no solo — mas a luta para dominar o céu é tão importante quanto.
Em entrevista exclusiva à BBC, um oficial de defesa aérea ucraniano falou sobre a batalha pelo controle do espaço aéreo.
Durante a conversa por videochamada, o capitão Vasyl Kravchuk sorri com facilidade e isso surpreende por se tratar de um homem que já suportou mais de 50 dias de guerra.
Ele conversou com a BBC diretamente de sua base aérea, em um local não revelado na Ucrânia.
O capitão sabe que não terá trégua nas próximas semanas. A Rússia pode ter sofrido um revés em suas tentativas malsucedidas de tomar Kiev, mas agora foca seus esforços militares na região leste de Donbas, que já era foco de ações separatistas.
Defender o céu da Ucrânia dos ataques russos tem sido um grande desafio. Um outro oficial de defesa aérea ucraniana comparou esse esforço a usar uma raquete mata-moscas com buracos no meio.
"Não conseguimos cobrir todo o espaço aéreo", explica o capitão Kravchuk.
A Brigada de Mísseis Antiaéreos de Dnipro, na Ucrânia, admite que "muitas instalações de defesa aérea foram total ou parcialmente destruídas" nos primeiros dias de guerra.
É incomum que as forças ucranianas reconheçam publicamente que sofreram perdas significativas nas primeiras etapas da guerra.
Mas apesar dessas perdas, as defesas aéreas que sobreviveram foram utilizadas com algum êxito.
O blog Oryx, uma página militar e de inteligência que acompanha as perdas militares durante a guerra por confirmação visual, diz que a Ucrânia destruiu, danificou ou capturou pelo menos 82 aeronaves russas, incluindo aviões, helicópteros e drones.
Em um comparativo, é possível observar que as perdas de aeronaves equivalentes da Ucrânia correspondem a 33.
De fato, esses dados surpreendem os especialistas militares, que previam que a Rússia alcançaria rapidamente a superioridade aérea sobre a Ucrânia.
A Rússia já tinha uma vantagem significativa no ar, porque despachou mais que o triplo de caças do que a Ucrânia.
Segundo o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, os aviões russos estão realizando cerca de 250 missões militares e cerca de 30 ataques aéreos todos os dias. Autoridades ocidentais dizem que a Rússia está lutando para ganhar superioridade aérea.
Enquanto isso, a frota envelhecida da Ucrânia, composta principalmente de caças MiG-29, tem lutado para competir, lidando com cerca de 10 missões militares por dia, na melhor das hipóteses.
A Ucrânia sabe que a Rússia tem vantagem no ar. Por isso, pediu repetidas vezes para que as nações ocidentais fechem seus espaços aéreos.
Falta de armas
A ofensiva antecipada da Rússia na região de Donbas, no leste da Ucrânia, representa um desafio novo e mais difícil.
Justin Bronk, principal pesquisador sobre a Força Aérea do Royal United Services Institute, na Inglaterra, diz que a Rússia provavelmente terá maior liberdade de acesso ao céu sobre a região do que no resto do país por causa da proximidade com o espaço aéreo controlado pela Rússia.
Para vencer essa batalha, a Ucrânia precisa de uma mistura de armas de longo, médio e curto alcance para fornecer o que é conhecido como "defesa em camadas".
O Ocidente tem fornecido um número significativo de mísseis "terra-ar" de curto alcance. Só os Estados Unidos já enviaram 2.000 Stingers. O Reino Unido também forneceu um número não especificado de mísseis de alta velocidade Starstreak.
Mas enquanto o capitão Kravchuk diz que seu país é grato por esses mísseis que são disparados pelo ombro, conhecidos como Manpads, ele diz que essas armas só são eficazes na linha de frente.
Isso ocorre porque os Manpads, sistemas de defesa aérea portáteis, são mais eficazes contra aeronaves voando baixo. A Rússia usa principalmente mísseis de cruzeiro de longo alcance e bombardeios de grandes altitudes.
O capitão Kravchuk disse à BBC: "Agora não temos sistemas de defesa aérea de médio e longo alcance... não temos o suficiente deles".
Uma nova ofensiva russa em Donbas deixará ainda mais séria a pressão sobre a limitada defesa aérea da Ucrânia.
Além de Donbas
Embora o foco da guerra atualmente esteja no leste da Ucrânia, o resto do país ainda precisa de proteção.
Há evidências de que a Ucrânia tem enviado sistemas de defesa aérea adicionais para o leste do país nos últimos dias. Mas não pode se dar ao luxo de realocar todos os seus sistemas de defesa aérea para a região de Donbas.
"Não podemos deixar metade da Ucrânia completamente desprotegida", diz Kravchuck.
O capitão Kravchuk estima que sua unidade está derrubando de 50% a 70% dos mísseis de longo alcance da Rússia. Como exemplo, ele diz que quando a Rússia disparou seis mísseis ao redor de Dnipro recentemente, eles conseguiram deter quatro.
Isso ainda sugere que um número significativo está penetrando na defesa ucraniana. O Pentágono diz que a Rússia lançou 1.550 mísseis desde o início da guerra.
A Rússia diz que também está usando mísseis hipersônicos. Não há muito que as defesas aéreas da Ucrânia possam fazer contra eles, pois viajam a cinco vezes a velocidade do som.
Mas a dura realidade é que, sem um apoio mais significativo, a Ucrânia achará cada vez mais difícil se defender contra ataques aéreos e de mísseis russos quanto mais essa guerra se prolongar.
Um alto funcionário da inteligência ocidental disse à BBC que as defesas aéreas de médio e longo alcance estavam no topo da lista de pedidos da Ucrânia para mais suprimentos de armas.
"Eles são muito específicos sobre o quanto precisam de munições de defesa aérea... eles precisam em grandes quantidades", disse a fonte.
O capitão Kravchuk finaliza dizendo que "as guerras passadas mostraram que quem dominar o ar vence a guerra".
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