Dois condados britânicos já se decidiram sobre o Brexit
Em algumas semanas, o Reino Unido vai votar sobre sua permanência ou não na União Europeia (UE), num referendo conhecido com Brexit (apelido que surgiu da junção Britain + exit). Alguns britânicos ainda estão indecisos, mas outros já fizeram a sua escolha, especialmente nos condados de Ceredigion e Havering.
Segundo pesquisa do instituto de opinião britânico YouGov, Havering, município da região de Londres, é o condado menos entusiasta da UE, enquanto Ceredigion, no País de Gales, é um grande admirador do bloco europeu.
Para saber a razão pela qual os galeses apoiam tanto a União Europeia, basta perguntar-lhes sobre sua relação com a terra-mãe Inglaterra. "Nesta cidade, um inglês não é o mesmo que um galês", afirma Jean François-Poncet, sentado num bar de uma avenida de Aberystwyth, um dos dois centros urbanos do condado de Ceredigion. "Os galeses estão mais próximos da Europa do que da Inglaterra."
Sem UE, sem internet e sem programa Erasmus
François-Poncet diz sentir-se metade galês, metade francês, mas um verdadeiro europeu. Ele é um dos 11 mil estudantes que animam Aberystwyth a cada semestre - sem eles, a população da cidade se reduziria a 15 mil habitantes. Pessoas como ele se beneficiam do programa de intercâmbio estudantil Erasmus. Muitos não conhecem uma vida sem a comunidade europeia.
Mesmo com o fim do semestre, François-Poncet vai permanecer no País de Gales até o referendo do dia 23 de junho. Ele está em campanha pelo "StrongerIn", que defende a permanência britânica na UE. "A União Europeia investiu mais no País de Gales do que o governo britânico jamais o fez", explicou. Internet rápida, infraestrutura de transporte, financiamento para as universidades: "O fato de Ceredigion ser hoje tão desenvolvido se deve aos fundos da UE."
UE como protetora de regiões autônomas
Em um pub, um homem mais velho se dirige aos jovens ativistas em bom galês. Os habitantes do País de Gales são muito orgulhosos de seu idioma, não há nada que não esteja documentado em duas línguas. "A UE incentivou a proteção da língua galesa", diz Anwen Elias. Ela pesquisa na universidade em Aberystwyth sobre União Europeia e política regional e afirma não ser nenhuma surpresa que o partido nacionalista galês Plaid Cymru participe da campanha StrongerIn: "Para ele, a UE é uma possibilidade de se tornar mais independente."
Independente, mas não separado do Reino Unido nem de outros partidos, segundo o desejo da atual campanha eleitoral. "Nesta eleição, não se trata apenas de estado de espírito", ressalta o deputado local Mark Williams. Ele ocupa um assento no Parlamento britânico pelo Partido Liberal Democrata. "O que está em jogo aqui são condições reais de mercado, que podemos vir a perder."
Uma questão de sobrevivência
O País de Gales precisa dos fundos da União Europeia, já que não recebe apoio financeiro de Londres. "De vez em quando, somos negligenciados pelo Ministério da Economia britânico", diz Williams.
Sem o apoio da UE, os agricultores galeses não poderiam sobreviver. "Não recebemos o suficiente pelos nossos produtos no mercado", afirma Glynn Roberts, presidente da Associação de Agricultores Galeses. Quase metade de sua renda anual de 30 mil euros é financiada pela União Europeia. "Precisamos do dinheiro não somente para sustentar a agricultura por aqui, mas para a vida como um todo", explica o fazendeiro.
Com a saída da União Europeia, agricultores como Roberts também perderiam suas vantagens competitivas nos mercados da UE. Denominações de origem, que atualmente protegem, por exemplo, o champanhe francês e o parmesão italiano, não se aplicariam mais à carne de cordeiro galesa. "Teremos mais concorrência devido à importação de produtos baratos", prevê Roberts.
O bastião do Brexit
A cerca de 300 quilômetros de Ceredigion, em Havering, bastião dos defensores do Brexit, não há compreensão para os problemas dos galeses. "As pessoas aqui estão cansadas", desabafa Sue Connelly, dirigente dos conservadores no condado londrino. "Qualquer um vem para cá e se aproveita de nossa sociedade." Para ela, a liberdade de circulação dentro da União Europeia não é nenhuma conquista. "Precisamos de melhores controles de fronteira", afirmou. "E de um sistema de imigração como os australianos."
Ela prepara a campanha eleitoral no Edifício Margaret Thatcher na cidade de Romford. Não há como ignorar a sede dos conservadores: dois outdoors com os dizeres Vote Leave (Vote deixar) ladeiam o jardim, também as janelas que dão para a rua estão cobertas com cartazes.
No centro de Romford, as flâmulas substituem os cartazes: bandeiras da Inglaterra tremulam em frente aos bares, todos estão prontos para festejar a Eurocopa. "As pessoas em Romford são muito patrióticas", diz Andrew Rosindell. Romford é o círculo eleitoral do parlamentar conservador. Junto a Connelly, ele montou um estande na zona de pedestres. "Nunca ninguém veio à Inglaterra nos dizer como devemos cuidar das nossas coisas."
Próximo debate
A bandeira inglesa com a Cruz de São Jorge também tremula sobre a barraca de peixe de Kim Crosbie. "Eu gostaria de sair", disse ela sobre a UE. Crosbie afirmou estar aborrecida com a regulamentação da pesca na União Europeia. "Qualquer um pode pescar em nossas águas", reclamou. "Mas somos obrigados a manter a cota de 24%."
Essa é a cota da população total de peixes que países-membros da UE podem pescar em suas águas territoriais. Essa cota é bastante disputada, e os pescadores britânicos a rejeitam.
No estande eleitoral, o parlamentar Rosindell conversava com eleitores. "Acho que o clima no país está mudando em direção a uma saída", declara o político. "As pessoas querem que o governo britânico crie suas próprias leis, em vez de somente impô-las."
Um senhor mais velho perguntou a Rosindell por que os irlandeses podem votar no referendo. "Devemos discutir isso outro dia", replicou Rosindell, mudando de assunto. "Ok", responde o idoso, voltando-se para Sue Connelly, que logo lhe prega um pin com os dizeres Vote Leave.
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