O que pode sair do encontro entre Trump e Kim?
A DW perguntou a analistas quais são os possíveis resultados da planejada reunião histórica entre o presidente americano e o líder norte-coreano, em meio a expectativas de desnuclearização da península coreana.Após meses de tensões, a comunidade internacional aguarda com ansiedade por uma cúpula entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, agendada para a próxima terça-feira (12/06), em Cingapura.
A DW Brasil conversou com analistas sobre as perspectivas de aproximação entre EUA e Coreia do Norte. A seguir, a resposta dos especialistas a quatro perguntas:
1- Qual o melhor cenário que se pode esperar para o encontro entre Trump e Kim?
- Robert King, enviado especial dos EUA para questões de direitos humanos da Coreia do Norte de 2009 a 2017:
"O melhor cenário para uma reunião entre Trump e Kim seria que as negociações dessem início a um esforço contínuo para que ambos os lados caminhem em direção à desnuclearização e melhorem as relações. As questões são complexas, a desconfiança de ambos os lados é profunda e de longo prazo, e as diferenças não vão ser resolvidas em uma única reunião.
O cenário do Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, para a desnuclearização imediata da Coreia do Norte é irrealista. Não há uma indicação clara do que os EUA podem oferecer para satisfazer a Coreia do Norte ou do que estariam dispostos a fornecer como incentivo para que o Norte concorde em avançar rumo à desnuclearização."
- Alexandra Bell, diretora de políticas do Centro para o Controle de Armas e Não Proliferação, think thank sediado em Washington:
"Se saíssemos da cúpula com algo como o acordo com o Irã, seria positivo e altamente irônico. Seria algo muito frustrante de ver, mas ainda preferível a um conflito na península. Mas deve ser entendido que isso está a meses – se não a anos – de distância. Será o mais complicado acordo de não proliferação já negociado na história. Isso fará com que o acordo com o Irã fique parecendo moleza."
- Joshua Pollack, editor do The Nonproliferation Review, jornal acadêmico do Centro James Martin para Estudos de Não Proliferação:
"O melhor cenário que posso imaginar seria uma reunião de cúpula em grande parte meramente formal que tenha iniciado – e não que tenha encerrado – um processo de negociação."
- Evans Revere, ex-vice-chefe de missão da Embaixada dos EUA em Seul, diretor de assuntos coreanos no Departamento de Estado e antigo representante do governo dos EUA na Coreia do Norte:
"O melhor cenário é provavelmente o resultado menos provável da cúpula: uma reunião na qual o líder norte-coreano concorde com a desnuclearização, conforme definida pelos Estados Unidos; faz um "pagamento antecipado" significativo em direção à desnuclearização, eliminando imediatamente algumas de suas capacidades, instalações, armas e material físsil; concorde com um cronograma para o fim completo de seu programa de armas nucleares; e também concorde em um processo de negociação com os Estados Unidos destinado a implementar o acordo de desnuclearização e lidar com detalhes técnicos."
2- E qual é o pior cenário para a cúpula Trump-Kim?
- King: "O pior cenário para a reunião entre Trump e Kim seria Trump encarar tudo como uma reunião única em que os EUA apresentam todas as suas exigências e abandonam tudo quando o Norte se recusa a atender. Essa pode ser, embora ainda não tenhamos certeza de que seja, uma oportunidade única de mudar o cenário de hostilidade de ambos os lados e tentar construir um relacionamento que leve à desnuclearização."
- Bell: "O pior resultado possível é que as partes se afastem decepcionadas e com raiva e que voltemos para onde estávamos antes dos Jogos Olímpicos de Inverno."
- Pollack: "O pior caso seria um encontro que destaque apenas as diferenças entre os dois lados e leve ao fim abrupto desse processo."
- Revere: "O pior cenário para a cúpula seria o líder norte-coreano rejeitar a desnuclearização, a menos que os EUA tomem medidas que nunca vão poder ser tomadas (como o fim da aliança EUA-Coreia do Sul ou a retirada das tropas americanas da península). Nesse caso, o encontro vai acabar em uma atmosfera de recriminação, e o presidente dos EUA pode começar a considerar opções militares para lidar com a ameaça nuclear do Norte."
3- Você acha que Trump e Kim estarão adequadamente preparados para a cúpula?
- King: "Eu tenho sérias dúvidas de que Trump esteja se preparado adequadamente para a cúpula. A prática normal nas discussões de relações internacionais é que os funcionários de nível inferior se encontrem e explorem as possibilidades e opções de cooperação, investiguem cuidadosamente e explorem o lado do outro e interesses e preocupações de cada um. Chegar a essa cúpula sem discussões de nível inferior para examinar áreas de concordância pode levar a sérios equívocos. Negociar com o jovem líder autoconfiante de uma nação soberana não é de forma alguma uma reunião entre um empreendedor imobiliário com um parceiro em potencial ou um possível financiador."
- Bell: "Você não costuma ter muitas chances desse tipo. Seria uma pena se o governo Trump não cedesse e fizesse o trabalho necessário para pelo menos criar algum tipo de resultado positivo. As expectativas são muito altas."
- Pollack: "Se um encontro acontecer, Kim estará altamente preparado e escolherá suas palavras cuidadosamente. Trump vai improvisar. É assim que eles operam. Trump não aceita muito bem orientações de sua equipe."
- Revere: "Eu não posso falar pelo presidente dos EUA, que tem uma conhecida aversão por detalhes de se informar por relatórios. No entanto, para o líder norte-coreano, uma vez que o destino de sua nação está em jogo, não há dúvida de que ele estará bem preparado. Ele também pode chegar à mesa pronto para preparar armadilhas ao presidente dos EUA."
4- Existe um modelo histórico para um país como a Coreia do Norte abrir mão de suas armas nucleares totalmente funcionais?
- King: "Não há um modelo histórico para a Coreia do Norte desistir de sua capacidade nuclear. Não há um modelo para a desnuclearização que os EUA buscam na Coreia do Norte. Também não existe um modelo que os Estados Unidos possam fornecer como incentivo ou garantia aos norte-coreanos para assegurar a segurança deles ou deixar claro quais benefícios os EUA podem fornecer à Coreia do Norte com o objetivo de garantir um acordo de Kim Jong-un para a desnuclearização."
- Bell: "Nenhum país jamais desistiu de um programa de armas nucleares em pleno funcionamento além da África do Sul – e eles meio que fizeram isso por conta própria e voluntariamente."
- Pollack: "Não há precedente real para um país que renuncie a suas próprias armas nucleares. Alguns podem apontar para a Líbia, mas a verdade é que a Líbia não tinha um programa de armas nucleares digno desse nome.
Outros podem se referir às antigas repúblicas soviéticas, mas isso também não se aplica. Após o colapso da URSS, a Ucrânia, o Cazaquistão e a Bielorrússia permitiram que a Rússia removesse todas as ogivas nucleares soviéticas de seus respectivos territórios. Outros podem mencionar a África do Sul, mas esse também é um modelo muito diferente. O país silenciosamente desmantelou seu pequeno arsenal e só depois admitiu que ele havia existido. E até hoje os sul-africanos ainda mantêm um estoque de urânio altamente enriquecido."
- Revere: "Alguns tentaram usar o exemplo da África do Sul ou da Ucrânia ou de outras antigas repúblicas soviéticas como precedentes para o que a Coreia do Norte poderia fazer, mas nenhum desses exemplos realmente se assemelha à situação norte-coreana."
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A DW Brasil conversou com analistas sobre as perspectivas de aproximação entre EUA e Coreia do Norte. A seguir, a resposta dos especialistas a quatro perguntas:
1- Qual o melhor cenário que se pode esperar para o encontro entre Trump e Kim?
- Robert King, enviado especial dos EUA para questões de direitos humanos da Coreia do Norte de 2009 a 2017:
"O melhor cenário para uma reunião entre Trump e Kim seria que as negociações dessem início a um esforço contínuo para que ambos os lados caminhem em direção à desnuclearização e melhorem as relações. As questões são complexas, a desconfiança de ambos os lados é profunda e de longo prazo, e as diferenças não vão ser resolvidas em uma única reunião.
O cenário do Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, para a desnuclearização imediata da Coreia do Norte é irrealista. Não há uma indicação clara do que os EUA podem oferecer para satisfazer a Coreia do Norte ou do que estariam dispostos a fornecer como incentivo para que o Norte concorde em avançar rumo à desnuclearização."
- Alexandra Bell, diretora de políticas do Centro para o Controle de Armas e Não Proliferação, think thank sediado em Washington:
"Se saíssemos da cúpula com algo como o acordo com o Irã, seria positivo e altamente irônico. Seria algo muito frustrante de ver, mas ainda preferível a um conflito na península. Mas deve ser entendido que isso está a meses – se não a anos – de distância. Será o mais complicado acordo de não proliferação já negociado na história. Isso fará com que o acordo com o Irã fique parecendo moleza."
- Joshua Pollack, editor do The Nonproliferation Review, jornal acadêmico do Centro James Martin para Estudos de Não Proliferação:
"O melhor cenário que posso imaginar seria uma reunião de cúpula em grande parte meramente formal que tenha iniciado – e não que tenha encerrado – um processo de negociação."
- Evans Revere, ex-vice-chefe de missão da Embaixada dos EUA em Seul, diretor de assuntos coreanos no Departamento de Estado e antigo representante do governo dos EUA na Coreia do Norte:
"O melhor cenário é provavelmente o resultado menos provável da cúpula: uma reunião na qual o líder norte-coreano concorde com a desnuclearização, conforme definida pelos Estados Unidos; faz um "pagamento antecipado" significativo em direção à desnuclearização, eliminando imediatamente algumas de suas capacidades, instalações, armas e material físsil; concorde com um cronograma para o fim completo de seu programa de armas nucleares; e também concorde em um processo de negociação com os Estados Unidos destinado a implementar o acordo de desnuclearização e lidar com detalhes técnicos."
2- E qual é o pior cenário para a cúpula Trump-Kim?
- King: "O pior cenário para a reunião entre Trump e Kim seria Trump encarar tudo como uma reunião única em que os EUA apresentam todas as suas exigências e abandonam tudo quando o Norte se recusa a atender. Essa pode ser, embora ainda não tenhamos certeza de que seja, uma oportunidade única de mudar o cenário de hostilidade de ambos os lados e tentar construir um relacionamento que leve à desnuclearização."
- Bell: "O pior resultado possível é que as partes se afastem decepcionadas e com raiva e que voltemos para onde estávamos antes dos Jogos Olímpicos de Inverno."
- Pollack: "O pior caso seria um encontro que destaque apenas as diferenças entre os dois lados e leve ao fim abrupto desse processo."
- Revere: "O pior cenário para a cúpula seria o líder norte-coreano rejeitar a desnuclearização, a menos que os EUA tomem medidas que nunca vão poder ser tomadas (como o fim da aliança EUA-Coreia do Sul ou a retirada das tropas americanas da península). Nesse caso, o encontro vai acabar em uma atmosfera de recriminação, e o presidente dos EUA pode começar a considerar opções militares para lidar com a ameaça nuclear do Norte."
3- Você acha que Trump e Kim estarão adequadamente preparados para a cúpula?
- King: "Eu tenho sérias dúvidas de que Trump esteja se preparado adequadamente para a cúpula. A prática normal nas discussões de relações internacionais é que os funcionários de nível inferior se encontrem e explorem as possibilidades e opções de cooperação, investiguem cuidadosamente e explorem o lado do outro e interesses e preocupações de cada um. Chegar a essa cúpula sem discussões de nível inferior para examinar áreas de concordância pode levar a sérios equívocos. Negociar com o jovem líder autoconfiante de uma nação soberana não é de forma alguma uma reunião entre um empreendedor imobiliário com um parceiro em potencial ou um possível financiador."
- Bell: "Você não costuma ter muitas chances desse tipo. Seria uma pena se o governo Trump não cedesse e fizesse o trabalho necessário para pelo menos criar algum tipo de resultado positivo. As expectativas são muito altas."
- Pollack: "Se um encontro acontecer, Kim estará altamente preparado e escolherá suas palavras cuidadosamente. Trump vai improvisar. É assim que eles operam. Trump não aceita muito bem orientações de sua equipe."
- Revere: "Eu não posso falar pelo presidente dos EUA, que tem uma conhecida aversão por detalhes de se informar por relatórios. No entanto, para o líder norte-coreano, uma vez que o destino de sua nação está em jogo, não há dúvida de que ele estará bem preparado. Ele também pode chegar à mesa pronto para preparar armadilhas ao presidente dos EUA."
4- Existe um modelo histórico para um país como a Coreia do Norte abrir mão de suas armas nucleares totalmente funcionais?
- King: "Não há um modelo histórico para a Coreia do Norte desistir de sua capacidade nuclear. Não há um modelo para a desnuclearização que os EUA buscam na Coreia do Norte. Também não existe um modelo que os Estados Unidos possam fornecer como incentivo ou garantia aos norte-coreanos para assegurar a segurança deles ou deixar claro quais benefícios os EUA podem fornecer à Coreia do Norte com o objetivo de garantir um acordo de Kim Jong-un para a desnuclearização."
- Bell: "Nenhum país jamais desistiu de um programa de armas nucleares em pleno funcionamento além da África do Sul – e eles meio que fizeram isso por conta própria e voluntariamente."
- Pollack: "Não há precedente real para um país que renuncie a suas próprias armas nucleares. Alguns podem apontar para a Líbia, mas a verdade é que a Líbia não tinha um programa de armas nucleares digno desse nome.
Outros podem se referir às antigas repúblicas soviéticas, mas isso também não se aplica. Após o colapso da URSS, a Ucrânia, o Cazaquistão e a Bielorrússia permitiram que a Rússia removesse todas as ogivas nucleares soviéticas de seus respectivos territórios. Outros podem mencionar a África do Sul, mas esse também é um modelo muito diferente. O país silenciosamente desmantelou seu pequeno arsenal e só depois admitiu que ele havia existido. E até hoje os sul-africanos ainda mantêm um estoque de urânio altamente enriquecido."
- Revere: "Alguns tentaram usar o exemplo da África do Sul ou da Ucrânia ou de outras antigas repúblicas soviéticas como precedentes para o que a Coreia do Norte poderia fazer, mas nenhum desses exemplos realmente se assemelha à situação norte-coreana."
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