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'Seria uma declaração de guerra': como Irã influencia nos ataques do Hamas a Israel?

18.jun.2021 - O ultraconservador Ebrahim Raisi nas eleições presidenciais do Irã Imagem: Atta Kenare/AFP

Da DW

18/10/2023 04h00Atualizada em 18/10/2023 11h55

Após os ataques terroristas do grupo islamista Hamas em Israel a partir da Faixa de Gaza, várias autoridades israelenses disseram suspeitar do envolvimento do Irã, notório apoiador de grupos militantes anti-Israel no Oriente Médio. Para alguns analistas, caso se encontre uma prova que implique o Irã, seria uma decisão política com consequências devastadoras: "uma declaração de guerra".

O chanceler federal alemão, Olaf Scholz, afirmou no Bundestag, o Parlamento alemão, que o Irã tem responsabilidade em colaborar para que o Hamas tenha crescido até o ponto de ser capaz de conduzir o ataque do fim de semana contra Israel.

"Embora não tenhamos provas concretas de que o Irã tenha suportado operacionalmente este ataque covarde, é claro para todos nós que sem o apoio iraniano o Hamas nunca teria sido capaz de lançar este ataque sem precedentes", ressaltou.

Em entrevista à emissora americana CBS na noite de domingo, o embaixador israelense nos Estados Unidos, Michael Herzog, afirmou que a liderança de Israel suspeita que "mãos iranianas" tenham atuado nos bastidores.

"O Hamas e o Irã são aliados próximos. O Irã fornece apoio material, financeiro e armas ao Hamas", acusou o embaixador. "Eles estão ligados naquilo que chamam de 'eixo da resistência', é claro, resistência ao direito do Estado de Israel de existir. Eles são parte da mesma coalizão."

Herzog deixou claras suas próprias suspeitas em relação ao envolvimento iraniano nos ataques. "No que nos diz respeito, essa é uma coalizão liderada pelo Irã."

O embaixador israelense na ONU, Gilad Erdan, afirmou em reunião do Conselho de Segurança da entidade no último domingo que o presidente iraniano, Ebrahim Raisi, se reuniu com líderes do Hamas há algumas semanas. "Sabemos que houve encontros na Síria e no Líbano", declarou.

"É fácil compreender que estavam tentando organizar os militares, os Exércitos terroristas e os representantes do Irã na nossa região. Eles tentam se coordenar o máximo possível com o Irã porque o objetivo em longo prazo é tentar destruir Israel sob a proteção nuclear iraniana."

O que Teerã diz

O regime iraniano, porém, nega envolvimento nos ataques terroristas, que qualifica como um ato de autodefesa por parte dos palestinos. Em pronunciamento à nação, Raisi deixou claro que seu país "apoia a legítima defesa da nação palestina". O presidente também elogiou os esforços da "resistência" do Hamas.

O Irã apoia uma ampla rede de milícias e grupos armados no Oriente Médio, incluindo organizações palestinas, enquanto o regime tenta consolidar sua influência no Líbano, Síria, Iraque e Iêmen, assim como em Gaza.

Autoridades iranianas destacam com frequência o chamado "eixo de resistência" em suas declarações e posicionamentos sobre Israel. Essa expressão se refere explicitamente a grupo de militantes que se dedicam à oposição a Israel e inclui principalmente O Hamas e o libanês Hezbollah.

As alas militares dessas duas organizações são consideradas grupos terroristas por diversos países, incluindo os Estados Unidos e a União Europeia (UE).

Autoridades iranianas se reúnem com regularidades com esses grupos. Em agosto, o ministro iraniano do Exterior, Hossein Amir-Abdollahian, se encontrou em Beirute com lideranças do Hamas, da Jihad Islâmica e outros grupos anti-Israel ativos no Líbano. Na ocasião, o ministro reafirmou seu apoio ao "eixo de resistência".

Autoridades tanto do Hamas quanto do Hezbollah admitem com frequência o apoio substancial que recebem de Teerã.

Mahmoud al-Zahar, um dos membros do mais alto escalão do Hamas, afirmou em dezembro de 2020 que eles haviam recebido aproximadamente 22 milhões de dólares (R$ 111 milhões) em dinheiro durante uma reunião com o antigo líder da Guarda Revolucionária do Irã Qassim Soleimani em 2006.

O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, afirmou repetidas vezes que sua organização recebe apoio financeiro, além de armas e mísseis do Irã. Em meados de 2016, ele chegou a dizer que "enquanto o Irã tiver dinheiro, nós também teremos. Nenhuma lei pode evitar o recebimento dessa ajuda".

Um relatório de 2021 do Wilson Center, um think tank sediado nos EUA, aponta que, desde pelo menos 2006, o Irã "se concentra em abastecer seus aliados regionais e representantes, incluindo facções palestinas, com know-how e equipamentos para a produção local de foguetes".

O relatório cita uma entrevista com o comandante da Força Aérea da Guarda Revolucionária do Irã, Amir Ali Hajizadeh, na qual ele diz que "ao invés de dar-lhes o peixe ou de ensiná-los da pescar, mostramos a nosso aliados e amigos como produzir anzóis. Eles agora possuem tecnologias e capacidades de mísseis".

Oposição ao elo de Israel com nações árabes

O ataque terrorista do Hamas ocorreu em meio a negociações em torno da normalização diplomática entre a Arábia Saudita e Israel, à qual o Irã é veementemente contra.

Em entrevista recente, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, afirmou que seu país "progride gradualmente rumo à normalização das relações com Israel".

Os chamados Acordos de Paz Abraham, assinados em 2020 por Israel, Estados Unidos e Emirados Árabes Unidos, possibilitaram essa normalização do elo entre Israel e algumas nações árabes.

Em 3 de outubro, dias antes do ataque do Hamas a Israel, o líder supremo do Irã, Ali Khamenei, descreveu o estabelecimento de relações com Tel Aviv como um "esforço completamente inútil" e advertiu enfaticamente as nações islâmicas que "os que apostarem na normalização com Israel sairão perdedores".

Damon Golriz, pesquisador e professor da Universidade de Haia, na Holanda, disse à DW que uma ampliação dos Acordos Abraham com Israel "sufocaria os objetivos estratégicos do Irã na região".

Teerã nega envolvimento

Teerã nega que tenha desempenhado qualquer papel nos ataques terroristas. Mas, uma reportagem publicada no último domingo pelo The Wall Street Journal mencionou autoridades do Hamas afirmando que a Guarda Revolucionária iraniana teria ajudado no planejamento nos ataques simultâneos e inesperados a Israel.

Na segunda-feira, porém, o porta-voz das Forças Israelenses de Defesa Daniel Hagari disse que "o Irã é um dos principais atores, nas não podemos ainda afirmar que estavam envolvidos no planejamento ou treinamento".

Autoridades americanas também dizem não haver ainda nenhum indício do envolvimento direto do Irã. "Não vimos nenhuma prova de que o Irã orquestrou ou esteve por trás desse ataque em particular, mas há certamente um longevo relacionamento", disse o secretário de Estado americano, Antony Blinken.

Raz Zimmt, especialista do Instituto de Estudos de Segurança Nacional (INSS) da Universidade de Tel Aviv, rebateu o artigo do Wall Street Journal através da rede social X, antigo Twitter.

"Ao mesmo tempo em que não há dúvida da cooperação militar entre o Irã e o Hamas e do crescente envolvimento na arena palestina nos últimos anos, incluindo a Cisjordânia, duvido muito que o Irã estivesse significativamente envolvido na última ação do Hamas", escreveu.

Zimmt, no entanto, afirmou que se a reação de Israel "representar um desafio significativo para o Hamas", isso obrigaria o Irã a "passar da fase de apoio e coordenação para um envolvimento mais direto".

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, já declarou que seu país está "em guerra" com o Hamas e prometeu uma retaliação severa. Nesta segunda-feira, o premiê disse que os ataques de Israel ao Hamas iriam "transformar o Oriente Médio".

Gilad Erdan, o embaixador israelense na ONU, disse que os ataques terroristas sofridos pelo país são o "11 de setembro de Israel", após o qual, "nada será como antes", em referência aos ataques sofridos pelos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001.

O analista Golriz avalia que, ao manter uma doutrina bem preparada de "negação plausível", Teerã consegue evitar o envolvimento direto nesses conflitos. Ele diz que encontrar uma prova que possa implicar o Irã seria uma decisão política que poderia ter consequências devastadoras.

"Seria uma declaração de guerra entre Israel e Irã", afirmou.

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