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Assédio sexual ainda é realidade muda que oprime mulheres árabes

08/03/2018 10h01

Cairo, 8 mar (EFE).- O assédio sexual continua a ser uma ameaça muito presente na vida da mulher árabe, em uma sociedade na qual, em muitos casos, oprime e silencia a denúncia e culpa as vítimas.

O medo de denunciar é latente em vários países do Oriente Médio, onde as mulheres temem o repúdio inclusive da própria família, aspecto que se torna especialmente maior nas áreas rurais, mas que também faz parte do dia a dia nas cidades.

Esse é o caso de Amal Hussein, que participou de um estudo sobre o assédio realizado no Iraque pela ONG Women's Environment & Development, e que contou à Agência Efe que foi assediada logo no seu primeiro dia de trabalho.

Segundo ela, o chefe tentou tocá-la, mas ela conseguiu impedir e pediu para trocar de setor. Conseguiu, mas não quis registrar uma queixa formal por medo de ser abandonada pelo noivo.

De acordo com um estudo elaborado no ano passado com 300 mulheres de diferentes idades e cargos, 80% delas disseram já ter sofrido algum tipo de assédio ou agressão sexual. No entanto, em 2017 apenas quatro queixas foram abertas por esse motivo em Bagdá - cidade de seis milhões de habitantes -, de acordo com o juiz Ali al Jabouri.

"A sociedade tribal obriga a mulher a pensar antes de denunciar e a isso se soma o problema da falta de testemunhas", afirmou.

Não longe desta realidade está a Arábia Saudita, que, apesar de ter começado a dar alguns direitos às mulheres desde o meio do ano passado, após a nomeação do herdeiro ao trono, Mohammed bin Salman, ainda tem mudanças incipientes.

Recentemente, a Arábia Saudita foi palco de denúncias de assédio sexual feitas por mulheres de todo o mundo, que começaram a contar o que sofreram durante a peregrinação à Meca e que está sendo divulgado através das hashtag #MosqueMeToo.

No entanto, o Conselho da Shura no país rejeitou várias vezes a tipificação do assédio sexual como crime, porque oficialmente não é certo que mulheres desacompanhadas dividam o mesmo espaço com homens que não sejam da sua família, e a atual lei já prevê punições, mas que nunca ultrapassam um ano de prisão.

A passividade institucional também está refletida no que poderia ser chamado de o país mais liberal do Oriente Médio. No Líbano, dois projetos de lei para criminalizar o assédio foram apresentados há dois anos na Câmara dos Deputados, mas nenhum foi aprovado.

Para a professora da Universidade Americana de Beirute e diretora do projeto Knowledge is Power (Conhecimento é poder), Charlotte Karam, o assédio sexual é uma forma de violência que deve ser reconhecida, nomeada e enfrentada.

"Não existem estatísticas oficiais que permitam que a gente conheça o tamanho do problema, mas estamos lutando para conseguir isso, apesar de não ser um assunto prioritário para as autoridades", comentou.

O Egito, onde em 2014 o termo "assédio sexual" foi incluído no Código Penal, também carece de estatísticas, mas a ONG HarassMap está trabalhando para obter esses dados.

A chefe de informação da organização, Alia Suliman, disse que, quando a organização começou a trabalhar, em 2010, poucas denúncias apareciam, mas agora as mulheres começaram a contar os casos sem medo da marca social.

"Ainda existem muitas justificativas e a culpa recai na vítima, com explicações como a roupa que ela usava ou porque foi à rua", detalhou.

Suliman disse que, graças às redes sociais, os egípcios agora estão começando a entender que o assédio pode acontecer com qualquer uma e a sociedade começou a aceitar a ideia de que a vítima não tem que ser condenada.

Na Jordânia o assédio também é silenciado. A associação Tadamon (Solidariedade), que luta pelos direitos das mulheres, afirmou que as denúncias no país não chegam a 16% dos casos reais, pois em 2015 apenas 631 mulheres denunciaram casos de estupro, segundo dados do Ministério de Justiça.

A Tadamon estima que o número baixo se deva ao completo desconhecimento das mulheres sobre os próprios direitos, além da vergonha, principalmente se o denunciado for alguém conhecido ou da família.

No Sudão não é diferente e as denúncias são bem poucas pelo medo da rejeição social, de acordo com a diretora do centro Sima para os direitos da mulher e do menor, Nahed Jabrala.

De acordo com Jabrala, o Código Penal e a lei de ordem pública perseguem as mulheres pela vestimenta e "não as protegem do estupro", que se repete "diariamente nas zonas de conflito e guerras", como Darfur e Cordofão do Sul.

Além do assédio, o Sudão também é marcado por numerosos casos de casamento infantil, e a porcentagem da mutilação genital feminina chega a 65% da população, segundo Jabrala.