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Tribunal decidirá se investigará o papel da Austrália no golpe do Chile

01/06/2021 22h30

Rocío Otoya.

Sidney (Austrália), 1 jun (EFE).- O ex-agente de inteligência militar australiano Clinton Fernandes está tentando fazer com que um tribunal ordene a divulgação de "todos ou a maior parte" dos documentos referentes ao suposto envolvimento da Austrália no golpe perpetrado por Augusto Pinochet no Chile em 1973.

"Acho que a Austrália esteve envolvida na derrubada do governo democrático de Salvador Allende e, sob a Lei de Arquivos, os australianos têm o direito de ter essa informação", disse Fernandes, que atualmente é acadêmico da University of New South Wales (UNSW)

Fernandes, especialista em operações de inteligência e política externa, baseia suas suspeitas na presença da Agência Secreta de Inteligência Australiana (ASIS) no Chile na época e na falta de transparência sobre o trabalho ali realizado.

O ex-agente secreto entrou com uma ação judicial para que os Arquivos Nacionais da Austrália tornassem disponíveis ao público os documentos secretos que datam do final dos anos 1960 até meados dos anos 1970 e que esclareceriam qual o papel dos serviços secretos no país andino.

O Tribunal Administrativo de Recursos vai tratar do caso entre quarta e sexta-feira na cidade de Sydney, embora Fernandes só possa estar presente e testemunhar na primeira metade do dia do processo, uma vez que as demais sessões serão realizadas a portas fechadas por questões de segurança nacional.

Fernandes já havia tentado sem sucesso em 2017 que os Arquivos divulgassem esses documentos sobre o trabalho da ASIS no Chile, mas agora também tem como alvo outras agências secretas do país.

Para o agora acadêmico, se trata de revelar "por que e como as agências de inteligência estavam simulando trabalhar em imigração para atrair pessoas tecnicamente qualificadas para fora do Chile, assim como saber o papel da Austrália em qualquer atividade com a CIA ou ou os serviços de inteligência do Chile".

A participação da ASIS remonta ao governo do liberal William McMahon, que no início dos anos 1970 enviou um grupo de agentes ao Chile a pedido de Washington, mas o trabalhista Gough Whitlam (1972-73) ordenou posteriormente a retirada desses homens do país sul-americano.

Whitlam confirmou em 1977 ao parlamento de Canberra que a ASIS tinha estado no Chile, embora, de acordo com relatos recentes da revista política "Crickey", ainda existam muitas questões, como a presença de funcionários da ASIO, a agência de inteligência interna australiana, no Chile se passando por agentes de imigração e supostamente ajudando a CIA até depois do golpe.

"Queremos saber por que a Austrália se envolveu tanto em se livrar de alguém que estava tão longe de casa", disse o especialista em inteligência, sem descartar que nessas ações "pessoas acusadas de violações de direitos humanos" também foram levadas para a Austrália, onde uma suposta ex-agente secreta de Pinochet é julgada pelo desaparecimento de sete pessoas.

Os Estados Unidos, um parceiro australiano na associação secreta de inteligência Cinco Olhos, começaram em 1999 a divulgar uma série de documentos que mostram que não apenas estavam cientes das táticas repressivas do regime do ex-governante chileno Augusto Pinochet, como também decidiram encobri-lo e apoiá-lo.

Porém, a suposta participação da Austrália no golpe de Pinochet, cujo governo está relacionado com a morte, tortura ou desaparecimento de mais de 3.000 pessoas entre 1973 e 1990, permanece obscura devido aos mecanismos legais que o país possui para proteger seus segredos.

"Tendo se passado 50 anos, acreditamos que o governo deveria divulgar todos ou a maior parte de seus registros" relacionados à participação da Austrália no golpe, comentou o ex-agente Fernandes, destacando que "a Austrália é uma das democracias menos transparentes do mundo".