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Geddel diz que "é hora de sair" ao deixar cargo de ministro em nova crise política

25/11/2016 14h24

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, pediu exoneração do cargo em carta de demissão enviada nesta sexta-feira ao presidente Michel Temer após polêmica sobre uma obra de interesse dele em Salvador, tornando-se o quarto ministro a deixar o governo em apenas seis meses em decorrência de denúncias de irregularidades.

"Avolumaram-se as críticas sobre mim. Em Salvador, vejo o sofrimento dos meus familiares. Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair", disse Geddel, que foi acusado pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero de fazer pressão pela liberação de um empreendimento imobiliário na capital baiana.

"Fiz minha mais profunda reflexão e fruto dela apresento aqui este meu pedido de exoneração do honroso cargo que com dedicação venho exercendo", acrescentou o ministro, que fez um agradecimento aos parlamentares pelo "apoio e colaboração" que deram na aprovação de medidas no Congresso.

A situação do ministro, que era responsável pela articulação política do governo com o Congresso, se agravou depois que o ex-ministro Calero afirmou à Polícia Federal que Geddel e Temer o pressionaram quando ainda estava no governo a respeito de uma obra do interesse de Geddel na capital baiana.

Segundo fontes ouvidas pela Reuters, o Palácio do Planalto havia montado uma operação desde segunda-feira para tentar convencer Geddel a pedir demissão, mas, envolvido em denúncias da operação Lava Jato, ele resistia. O vazamento do depoimento de Calero à PF envolvendo Temer, no entanto, finalmente convenceu o ministro a sair, de acordo com fontes palacianas. [L1N1DQ0J0]

Fontes do governo também disseram que o Planalto quer encontrar um substituto para Geddel o mais rapidamente possível para tentar estancar a crise, e que o nome só deve ser anunciado na próxima semana. [L1N1DQ0MP]

Inicialmente, Calero acusou apenas Geddel de exercer pressão para que ele interferisse na decisão do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de barrar um empreendimento imobiliário em Salvador, no qual Geddel havia comprado um apartamento. Em depoimento à PF, cujo teor foi confirmado por uma fonte à Reuters, o ex-ministro acrescentou que Temer o pressionou para encontrar uma "saída" para o caso, já que Geddel estava irritado e isso havia causado "dificuldades operacionais" a seu governo.

Calero pediu demissão do cargo na semana passada e denunciou a pressão sofrida no caso da construção do edifício.

Segundo reportagem do jornal Estado de S. Paulo nesta sexta-feira, Calero teria inclusive gravado conversas com Temer, Geddel e com o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, sobre o tema, mas Calero negou em nota que tenha solicitado uma audiência com Temer no intuito de gravar conversa no gabinete presidencial.

A Comissão de Ética Pública da Presidência, que havia decidido por unanimidade abrir processo para investigar Geddel após as primeiras denúncias de Calero, anunciou que o processo seguirá adiante, apesar da demissão do agora ex-ministro.

"É prerrogativa de qualquer autoridade pedir demissão. Isso não constitui ter havido por parte do ministro um desvio ético. Mas o processo tem continuidade e permanece sob exame estando a autoridade no cargo ou não", disse o presidente da comissão, Mauro Menezes.

Em nota, o presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), disse que o pedido de demissão de Geddel foi estritamente pessoal e lamentou a saída dele do governo.

"Lamento que o governo perca neste momento um político experiente e que estava dando uma importante contribuição no cargo que ocupava. Tenho certeza que ele continuará participando ativamente das transformações do País onde puder colaborar, seja no nosso partido, o PMDB, ou no debate político nacional", disse Jucá.

CRISE FAZ DÓLAR SUBIR

Após o depoimento do ex-ministro à PF, a Procuradoria-Geral da República informou que vai analisar se pede ao Supremo Tribunal Federal (STF) que seja aberta investigação para apurar as declarações de Calero envolvendo Temer e Geddel.

O agravamento da crise política fez o dólar disparar pela manhã, e a moeda norte-americana chegou a operar em alta de mais de 2 por cento por cento ante o real, com os investidores temerosos de que as notícias possam atrapalhar os planos do governo de aprovar importantes medidas econômicas no Congresso Nacional.

Em resposta à divulgação na quinta-feira do depoimento de Calero, Temer divulgou nota lida pelo porta-voz da Presidência, Alexandre Parola, em que diz estranhar as acusações do ex-ministro e afirma que buscou arbitrar uma disputa para evitar confrontos entre seus ministros. Segundo Parola, o presidente se surpreendeu com boatos de que o ex-ministro teria solicitado uma segunda audiência "somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa" para posterior divulgação".

No fim de semana, Geddel reconheceu em entrevista à Reuters ter tratado do assunto com Calero, mas negou que tenha feito pressão sobre o então ministro da Cultura. No início da semana Temer chegou a anunciar, por meio do porta-voz, que manteria Geddel no cargo apesar da denúncia de Calero, mas a situação mudou depois que o ex-ministro da Cultura envolveu o próprio presidente no depoimento à PF.

O governo Temer já perdeu quatro ministros em seis meses por conta de denúncias de irregularidades.

O primeiro foi Jucá, ex-ministro do Planejamento e atual líder do governo no Congresso, menos de um mês depois de ter assumido o cargo, e, em seguida, caiu o ex-ministro da Transparência Fabiano Silveira, os dois devido à divulgação de gravações em que faziam críticas à operação Lava Jato.

Depois foi a vez do ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves, em meados de junho, citado na delação premiada do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado como tendo recebido 1,5 milhão de reais em recursos ilícitos.

Além desses quatro, também deixaram seus cargos no ministério de Temer o próprio Calero, da Cultura, e Fábio Medina Osório, da Advocacia-Geral da União, mas estes sem terem sido alvo de denúncias de irregularidades.