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Em queda de braço entre Maia e governo, Câmara aprova reoneração com isenção de PIS/Cofins sobre diesel

23/05/2018 21h43

Por Lisandra Paraguassu e Maria Carolina Marcello

BRASÍLIA (Reuters) - Em meio à crise causada pela paralisação dos caminheiros e a queda de braço entre governo e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), os deputados aprovaram na noite desta quarta-feira a reoneração da folha de pagamento de alguns setores, com isenção de PIS/Cofins sobre o diesel, enquanto o país enfrentava desabastecimento em várias cidades, sem previsão de fim da greve.

Representantes dos caminhoneiros autônomos, que participaram de reunião no Palácio do Planalto na tarde desta quarta, saíram reclamando da falta de soluções para o impasse e rejeitaram pedido de trégua do presidente Michel Temer. No início da noite, a Petrobras anunciou redução de 10 por cento dos preços do diesel nas refinarias por 15 dias.

Mais tarde, a Câmara aprovou o a reoneração da folha de pagamento e incluiu, contra a vontade do governo, a isenção de cobrança do PIS/Cofins sobre o diesel até 31 de dezembro deste ano.

"O que o governo perde com essa receita vai ganhar com a reoneração desses setores", argumentou o relator da matéria, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), acrescentando que há ainda expectativa de aumento da arrecadação do governo. O relator acredita que a isenção pode trazer uma redução do preço do combustível de até 14 por cento.

Por outro lado, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, visivelmente contrariado com o resultado da votação, disse que deve procurar o Senado para eventuais “correções”. O ministro nutria a expectativa que a decisão tomada mais cedo pela Petrobras de reduzir o preço do óleo diesel daria tempo para negociar com o Congresso.

O texto-base da reoneração foi aprovado inclusive por parlamentares da base do governo. A votação foi simbólica e não houve necessidade de registro nominal de votos.

Maia afirmou mais cedo que tentaria votar o projeto de reoneração da folha de pagamento de alguns setores da economia, depois do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, ter afirmado que não seria possível editar o decreto que zera a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre o diesel antes da aprovação da reoneração.

"Não há como decretarmos a redução da Cide antes de que esteja votada a reoneração. A Lei de Responsabilidade Fiscal exige que se apresente a compensação das perdas fiscais, por isso o decreto ainda não foi publicado. Estamos aguardando a votação no Congresso", disse Padilha em entrevista no Palácio do Planalto.

No mesmo momento, na Câmara, Maia tentava votar a reoneração, apesar ter reagido mal, mais cedo, às declarações do ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, de vincular a retirada da Cide do diesel à aprovação da reoneração.

"A reoneração vai compensar o PIS/Cofins. E o governo está tendo excesso de arrecadação. O que tem de entender é que o país vive uma crise profunda, e o que está aparecendo de mais claro dessa crise é a crise dos caminhoneiros. O governo precisa entender que se não começar a usar o excesso de arrecadação, algumas receitas extras para compensar a crise que os brasileiros vivem, vamos ter crises muito piores que essas", disse Maia.

Retirar o PIS/Cofins do diesel, no entanto, não é um ponto pacífico para o governo. De acordo com Padilha, o assunto foi discutido, mas não existe ainda uma decisão porque não há previsão de compensação de arrecadação que cubra a perda fiscal de zerar a Cide.

Os primeiros cálculos do governo, para uma redução do imposto à metade, pelos próximos seis meses, seriam necessários 12,5 bilhões de reais este ano para compensar a redução do PIS/Cofins.

"Nós no governo estamos estudando se poderemos trabalhar com PIS/Cofins e indicaremos a compensação no momento próprio", disse Padilha. Se o Congresso aprovar essa isenção, afirmou o ministro, terá que fazer suas próprias indicações de compensação.

No início da noite desta quarta-feira, o anúncio da Petrobras de uma redução de 10 por cento no preço do diesel por 15 dias poderia ter dado um fôlego ao governo para negociar, mas não garantiu a suspensão do movimento dos caminhoneiros.

Apesar do discurso de que está preocupado com os resultados da paralisação e trabalhando para resolver o problema, Padilha admitiu que o governo saiu da reunião com as lideranças dos caminhoneiros -que classificou como "tensa"- sem uma solução. Um outro encontro foi marcado para o início da tarde desta quinta-feira.

Tanto a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam) quanto a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) deixaram a reunião afirmando que o governo não apresentou propostas para o fim da paralisação, que reúne cerca de 450 mil motoristas e já afeta uma série de setores da economia.

"O governo foi irresponsável com a situação que está o país hoje. O governo foi avisado com antecedência e nem mesmo abriu negociação", afirmou o presidente da CNTA, Diumar Bueno, após o fim da reunião que contou com presença de Padilha e do ministro dos Transportes, Valter Casimiro.

Padilha admitiu que o fórum permanente de negociação que existe entre governo e caminhoneiros recebeu os alertas da categoria, e "deu o encaminhamento que achou que deveria dar", mas as negociações só começaram nesta quarta-feira, no terceiro dia de paralisação.

Setores da economia já acusavam problemas decorrentes da suspensão no transporte de cargas. Nesta tarde, entidades representantes de supermercados, Abras, e de farmácias, Abrafarma, citavam desabastecimento de lojas. Produtores de carnes informaram que 129 fábricas estavam paradas no país por causa da paralisação dos motoristas e que 90 por cento da produção nacional pode ser interrompida até sexta-feira, se os protestos continuarem.

Na cidade de São Paulo, a prefeitura afirmou que cerca de 40 por cento da frota de 14 mil ônibus da cidade não deverá circular na quinta-feira por causa de dificuldade no abastecimento de combustível dos veículos. Mais cedo, o sindicato de empresas de ônibus coletivos afirmou que a frota poderá ficar sem combustível a partir de sexta-feira.

Em aeroportos também há problemas de abastecimento, como em Brasília e Congonhas, na capital paulista.

Os representantes dos caminhoneiros não dão esperanças de ver encerrada a mobilização enquanto o governo não der respostas concretas ao movimento. Apenas zerar a Cide não resolve, dizem, nem uma redução parcial do PIS/Cofins.

GASOLINA

Com a turbulência causada pela greve dos caminhoneiros, o governo esqueceu a discussão inicial, anunciada na segunda-feira, de uma solução que envolvesse não apenas o diesel, mas também a gasolina, que teve reajustes praticamente diários nos últimos 15 dias e subiu 16,07 por cento apenas no mês de maio.

Padilha afirmou que a política de preços da Petrobras é um dos assuntos que o governo vem discutindo desde domingo, mas questionado se isso envolveria a gasolina, negou. Disse que está sendo discutida a previsibilidade dos reajustes porque é uma cobrança dos caminhoneiros.

"Muitas coisas decididas para o diesel podem vir a ser avaliadas para a gasolina. Mas, por enquanto, está se falando na questão dos caminhoneiros", explicou o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, que também participou de entrevista no Planalto.

Mais tarde, por mensagem, o ministro da Casa Civil explicou que o governo não discute a política de preços da Petrobras, mas a previsibilidade dos reajustes.

(Com reportagem adicional de Mateus Maia e Marcela Ayres, em Brasília, e Alberto Alerigi Jr. e José Roberto Gomes, em São Paulo)