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"Ninguém se veste como nas revistas", diz autor de livro sobre história da moda

19/12/2018 14h14

Os historiadores franceses Denis Bruna e Chloé Demey acabam de publicar um livro coletivo no qual retraçam a história da moda desde a Idade Média. Ambicioso, o projeto visa um público amplo, desde os fashion victims até aqueles que não conhecem nada sobre o assunto.

Os historiadores franceses Denis Bruna e Chloé Demey acabam de publicar um livro coletivo no qual retraçam a história da moda desde a Idade Média.

Quando se fala de história da moda, o que não falta nas prateleiras são opções de livros temáticos. Entre os tratados sobre calçados, as biografias dos estilistas ou os livros que retraçam a trajetória das marcas – quase sempre usados como uma ferramenta de comunicação pelas empresas de luxo, as livrarias encontraram nesses "coffee table books" um bom filão comercial.

No entanto, poucas são as publicações que tentam tratar a moda em sua globalidade. Desde a publicação do clássico História do Vestuário no Ocidente, escrito pelo francês François Boucher en 1965, poucas foram as obras completas. Foi pensando nisso que Denis Bruna e Chloé Demey, professores da Escola do Louvre, reuniram jovens pesquisadores para resumir, em um livro de mais de 500 páginas e 400 imagens, seis séculos de hábitos do vestuário.

Porém, apesar do lado enciclopédico da obra, os autores tentam ir além do modelo cronológico clássico. “Queríamos publicar um livro que nós mesmos gostaríamos de ler e que interessasse a todos, sejam eles não-especialistas ou simples curiosos da história, das formas, das roupas, da cultura e da sociedade em geral”, explica Chloé Demey.

Em Histoire des modes et du vêtement – Du Moyen Âge au XXIe siècle, (disponível apenas em francês), os autores mostram, por exemplo, que homens e mulheres se vestiam da mesma forma até os anos 1330. Foi isso, aliás, que os levou a começar o livro na Idade Média, afim de poder se basear nas especificidades de gênero que marcaram a moda desde então.

Espartilhos até nos bebês

O livro é uma mina de curiosidades, que mostra, entre outras coisas, a importância da moda no eterno debate sobre a diferença de classes e de gênero. Ele conta, por exemplo, como os bebês eram vestidos entre os séculos 14 e 19, com espartilhos e outros acessórios apertados, praticamente desde o nascimento. No caso dos meninos, esses adereços eram em seguida substituídos por miniaturas de ternos como seus pais, enquanto as mulheres continuavam espremidas até a velhice. “Para a aristocracia, era uma maneira de se distinguir por meio dessa rigidez e verticalidade do resto do povo, que não podia usar esse tipo de roupas, já que tinha que trabalhar nos campos ou nas cidades. Aliás, é por isso que os corpos dos mais pobres eram mais arredondados e flácidos, com curvas facilitadas por um vestuário mais largo”, conta Denis Bruna.

Moda para pobres e ricos

Ao contrário dos livros do gênero, que quase sempre se concentram no que usam as elites, Bruna optou por uma abordagem mais ampla. “Não queríamos falar de moda, mas das modas. Afinal, todos os grupos da sociedade precisam se vestir”, explica. Por isso a história do jeans e das camisetas é abordada com o mesmo rigor que a da silhueta em forma de ampulheta criada por Christian Dior em 1947. Além disso, o livro traz uma abordagem inédita sobre a manutenção das roupas, desde a forma como elas eram guardadas com o passar dos anos até os rituais para limpar os tecidos, que evoluíram até a chegada de nossas máquinas de lavar modernas.

E mesmo se algumas marcas são citadas, os autores tentaram evitar a armadilha do livro publicitário, que traz pela enésima vez anedotas sobre Chanel ou Yves Saint Laurent. “Tentamos relativizar o papel das marcas com relação ao uso que a população faz das roupas”, argumenta Chloé Demey. Afinal, explica a historiadora, “as marcas são apenas um epifenômeno valorizado pela imprensa e pelo marketing”.

Por essa razão, os autores evitaram usar apenas as revistas especializadas como referência de periódicos. “Sempre digo a meus alunos, comprem uma revista de moda e em seguida entrem em um ônibus ou no metrô”, conta Bruna. “Vocês vão logo notar que praticamente ninguém se veste como nas revistas!”