De onde vem o movimento anti-máscara, que está ganhando força na França?
A obrigatoriedade do uso de máscaras ao ar livre vem ganhando espaço rapidamente em várias cidades francesas, por medo do ressurgimento da epidemia do coronavírus no país. Ao mesmo tempo, o movimento "anti-máscara", já enraizado nos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido, está ganhando força na França, liderado por teóricos da conspiração. A que se deve esse fenômeno?
Por Romain Philips
Os conspiracionistas mais moderados falam de "leis desproporcionais" e reclamam dos extremos de uma "ditadura da saúde". Após as manifestações contra as medidas tomadas em tempos de crise do coronavírus, que reuniram milhares de pessoas nos Estados Unidos, Alemanha ou Canadá, um movimento "anti-máscara" está tentando ganhar força na França.
Por vários dias, circularam modelos de cartas para enviar a deputados ou para boicotar lojas que se recusam a aceitar clientes sem máscaras. Outros compartilham seu entusiasmo em quebrar as regras, com fotos em que se mostram sem máscara.
Por enquanto não houve manifestação contra as máscaras na França, mas os apelos para o não cumprimento da obrigação se multiplicam nas redes sociais. E atos violentos isolados ocorreram: um homem foi atacado na semana passada por um grupo em uma lavanderia no norte de Paris depois de pedir que um cliente do local colocasse máscara, e um motorista de ônibus foi espancado até a morte em Bayonne, em julho, após pedir que passageiros usassem o acessório de proteção.
Esse movimento, que atrai cada vez mais pessoas, apresenta argumentos online sobre a inutilidade e a até a periculosidade da máscara, às vezes chamada de "focinheira", responsável pela intoxicação por CO2, falta de ar, doenças pulmonares...
Fonte de todo o mal
Sobre este assunto, informações falsas e teorias da conspiração estão se multiplicando. No grupo do Facebook "Anti-masque obligatoire" ("Anti-máscara obrigatória"), vários internautas dizem que esta prevenção seria apenas "um primeiro passo antes da vacinação obrigatória" ou que ela poderia desenvolver "fungos nos brônquios". Alguns até temem que um "microchip" possa ser incorporado à máscara, permitindo o controle da população.
Para outros, é uma questão de liberdade individual: usar uma máscara diz respeito a "eles e apenas a eles". Em outro grupo, um internauta fica indignado com o "gado" que cumpre a obrigação da proteção, enquanto denuncia a política do presidente francês Emmanuel Macron.
Mas ser "anti-máscara" não significa necessariamente aderir às teorias da conspiração. Algumas pessoas dizem que estão "perdidas", ou que "não entendem" a política variável do governo sobre o assunto: "Antes era desaconselhável e, agora, é absolutamente necessário!", criticam. "As recomendações para o uso de máscaras evoluem com o conhecimento do vírus SARS-CoV-2", justifica a Direção Geral de Saúde.
"Imbecilidade total"
Se as diretrizes do Executivo são evasivas, o uso de máscaras é "essencial hoje", diz Jean-Christophe Calmes, vice-presidente da Federação de clínica-geral francesa, que deplora "uma total imbecilidade" por parte dos que se opõem a usar. "Quando olhamos para o que está acontecendo, por um lado, há uma epidemia que explode quando não a usamos, e por outro lado, onde a usamos, há um número limitado de contaminações, fico muito fácil escolher", explica.
Claro, a máscara não protege o usuário, mas sim aqueles ao seu redor, filtrando as gotas que ele emite. É uma medida "altruística". "Ao me proteger, estou protegendo os outros, então, se todo mundo está protegido, eu também estou", diz o médico.
Mas alguns não estão convencidos: "Não posso proteger os outros de uma doença que não tenho", diz o administrador de um grupo privado entrevistado pela RFI, que acredita que "o direito de respirar não é negociável". Ele também nega o alto índice de pessoas assintomáticas, uma das causas que dificulta o combate à epidemia.
Em resposta ao argumento de que "a máscara nos faz respirar nosso próprio CO2", o médico é categórico: "Se isso fosse verdade, eu teria que anunciar a morte dos profissionais de saúde que a utilizam todos os dias". A Direção-Geral da Saúde dá a mesma resposta aos que acreditam que o acessório reduz a oxigenação: "A composição do ar equilibra-se rapidamente em ambos os lados da máscara, por isso não há alteração na quantidade de oxigênio."
"Um mundo paralelo e infernal em que tudo é mentira"
Na Alemanha, quase 20.000 pessoas se manifestaram contra as medidas restritivas, e os ativistas do partido de extrema direita AfD são esmagadoramente "simpatizantes" (67,3%) desse movimento. Mas 35% dos apoiadores do partido da direita liberal e 20% da Linke (esquerda radical) também compartilham essa posição. Levantamento que mostra a composição heterogênea dos grupos "anti-máscara", basicamente animados por esferas conspiratórias, bem conhecidas dos especialistas.
Essas "esferas" em questão apareceram pela primeira vez nos Estados Unidos. Para Rudy Reichstadt, o fundador do Conspiracy Watch, esses grupos que misturam desinformação e teorias da conspiração são onipresentes. "Não é de estranhar que surjam teorias sobre o assunto. É bastante normal, porque conspiração é o business deles", afirma.
Youtubers, páginas do Facebook, contas no Twitter... Nas redes sociais, esses movimentos vêm produzindo há anos "um mundo paralelo e infernal em que tudo é mentira".
Se Rudy Reichstadt explica que conhece "bem" esses grupos, é porque não se trata de um fenômeno novo: o movimento "rejeitou o confinamento, acreditou que estávamos sendo enganados sobre a gravidade da epidemia... Estamos testemunhando uma convergência entre os antivacinas, conspiradores e os globalistas que se movem na mesma direção e se influenciam".
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