'Bomba suja' e explosão de barragem: entenda o que pode acontecer na Ucrânia
A semana começou particularmente tensa na guerra que a Rússia promove na Ucrânia. Moscou disse nesta segunda-feira (24) que Kiev entrou na "fase final" de fabricação de uma "bomba suja", uma alegação rejeitada com veemência pelo presidente Volodymyr Zelensky e seus aliados ocidentais. Os reveses sucessivos sofridos pelas tropas russas nas áreas anexadas por Moscou e uma iminente derrota na região de Kherson fazem o presidente russo, Vladimir Putin, ameaçar Kiev com uma catástrofe no sul do país.
Uma das razões para o Kremlin adotar esta retórica mais agressiva é o avanço obtido pelo Exército ucraniano na contraofensiva que vem empreendendo no leste e no sul do país e estar perto de reconquistar a cidade de Kherson, uma localidade estratégica perto da Crimeia, península anexada pela Rússia em 2014.
Uma "bomba suja" é um armamento de dispersão que usa material radioativo combinado com explosivos convencionais, como dinamite, por exemplo. O objetivo desse tipo de arma é contaminar o entorno da área onde é utilizada com a poeira radioativa gerada pela detonação. Entretanto, seus efeitos não podem ser comparados com a explosão de uma bomba nuclear, de consequências muito mais devastadoras.
"De acordo com as informações que temos, duas organizações ucranianas têm instruções específicas para fazer a chamada 'bomba suja' e o trabalho deles entrou na fase final", afirmou, em um comunicado, o tenente-general russo Igor Kirillov. Ele é o responsável por substâncias radioativas, químicas e biológicas no Exército russo.
Segundo o militar, "o objetivo desta provocação é acusar a Rússia de usar armas de destruição em massa na Ucrânia e, assim, lançar uma poderosa campanha antirussa no mundo", acusou Kirillov, acrescentando que Kiev quer "intimidar a população local e aumentar o fluxo de refugiados para a Europa". "A detonação de um dispositivo radioativo levaria inevitavelmente à contaminação da área, que poderia cobrir vários milhares de metros quadrados", advertiu o tenente-general. Kirillov também acusou o Reino Unido de ter "contatos" com Kiev "sobre a questão de a Ucrânia obter as tecnologias (necessárias) para a produção de armas nucleares".
As alegações de Moscou contra Kiev de que a Ucrânia quer usar uma "bomba suja" são "falsas", insistem Paris, Londres e Washington, em uma declaração conjunta publicada nesta segunda-feira.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, também refuta as alegações de Moscou. "Se a Rússia diz que a Ucrânia está preparando algo, isso significa apenas uma coisa: a Rússia já preparou tudo isso", afirmou Zelensky, acusando Moscou de procurar justificar uma escalada do conflito. Ontem, o governo ucraniano considerou "absurdas" e "perigosas" as declarações dos militares russos e pediu uma resposta "o mais dura possível" de seus aliados ocidentais.
Porta-voz da Rússia envia mensagem para França e Alemanha
O Kremlin também se queixou hoje de que França e Alemanha não demonstram vontade de atuar como mediadores do conflito. "No que diz respeito aos senhores [Emmanuel] Macron e [Olaf] Scholz, nos últimos tempos eles não têm mostrado nenhum desejo de ouvir a posição do lado russo e participar de qualquer esforço relacionado à mediação", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov. Ao mesmo tempo, o porta-voz elogiou a "posição de "Ancara, muito diferente da de Paris e Berlim".
A Turquia "expressa a vontade de continuar com os esforços de mediação, que foram muito apreciados pelo presidente russo", destacou Peskov. Membro da Otan, a Turquia, muito dependente de gás e petróleo russo, se esforça desde o início da ofensiva ordenada por Putin, em 24 de fevereiro, a manter relações com a Ucrânia e a Rússia. O país não aderiu às sanções internacionais contra Moscou.
Explosão de barragem pode formar onda de 60 metros
Apesar da polêmica anexação de quatro territórios ucranianos no final de setembro -Lugansk e Donetsk, no leste, Kherson e Zaporíjia, no sul -, a contraofensiva ucraniana tem recuperado dezenas de localidades e está às portas de Kherson, cidade ocupada há meses pelos russos. Nesta segunda-feira, as unidades ucranianas se encontravam a 180 km das barreiras erguidas pelos inimigos, mas avançam lentamente e evitam deflagar uma batalha no centro da cidade por saber que nem toda a população civil pôde deixar suas casas.
Ciente das dificuldades enfrentadas pelo Exército russo, Moscou instalou minas na barragem de Nova Kakhovka, o que poderia causar uma enorme inundação no sul da Ucrânia e atingir a região de Kherson. Essa represa retém um grande reservatório que permite a irrigação de extensas áreas agrícolas no sul do território ucraniano e norte da Crimeia. A hidrelétrica foi bombardeada em agosto pela Rússia, provocando o desligamento de três de suas seis turbinas. Na época, o ministério russo da Defesa atribuiu o ataque às forças ucranianas.
Zelensky tem denunciado essa ameaça e pedido ajuda aos aliados ocidentais para evitar mais esta catástrofe. Forças pró-russas que ocupam Kherson têm evacuado os moradores de barco.
Habitantes da região, que conhecem as instalações e os riscos relacionados com a barragem, dizem que uma onda de 60 metros de altura poderia se formar, caso a barragem seja destruída. De acordo com o presidente ucraniano, 80 localidades poderiam ser rapidamente submersas pela onda gigantesca.
A inundação poderia deter a contraofensiva ucraniana, mas também poderia afetar o resfriamento dos reatores da usina nuclear de Zaporíjia, que extrai água da represa. Os russos, no entanto, teriam muito a perder, pois a infraestrutura também fornece água para a Crimeia, notam analistas.
RFI e AFP
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