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Com escassez de remédios, França lança plano para internalizar produção de medicamentos

13/06/2023 12h03

Essa foi uma das lições aprendidas pela França após a pandemia de Covid-19. O país vai realocar em seu território a produção de cerca de 50 medicamentos prioritários, para evitar a escassez e recuperar a autonomia de saúde em nível nacional e europeu. A medida representa pelo menos € 200 milhões em investimentos.

O anúncio foi feito pelo presidente francês Emmanuel Macron em visita a dois laboratórios no leste e no  sul da França. A intenção do governo é de transferir a produção de cerca de cinquenta medicamentos essenciais para o país, a fim de lidar com a falta de remédios destinados ao público em geral, como antibióticos ou mesmo paracetamol .

O primeiro passo será repatriar ou fortalecer a produção de 25 medicamentos "essenciais" dentro de cinco anos, entre antibióticos, remédios anticâncer e anestésicos, a maioria genéricos. Em uma segunda etapa, o foco será em outras 25 drogas, para as quais é comprovada a dependência da França de importações de fora da Europa.

Para apoiar estes projetos, estão previstos mais de € 200 milhões de investimentos. Um valor equivalente já havia sido anunciado em 2020, em plena crise sanitária, para financiar infraestruturas de produção farmacêutica e, em particular, permitir a internalização da produção na França do princípio ativo do paracetamol.

No auge da epidemia de Covid-19 na União Europeia, médicos de vários países, inclusive franceses, denunciaram a escassez de relaxantes musculares, sedativos e analgésicos para os doentes internados em unidades de terapia intensiva. Também faltaram reagentes para a fabricação de testes de diagnóstico do novo coronavírus. 

Aumento da produção

O laboratório britânico GSK vai investir € 22 milhões para aumentar a capacidade de produção de amoxicilina em Mayenne, no noroeste da França. Este antibiótico, amplamente prescrito para crianças para tratar infecções, está regularmente em falta nas farmácias francesas.

Em 2022, a Agência Nacional de Segurança do Medicamento (ANSM) recebeu mais de 3.700 denúncias de rupturas de estoque e declarações de risco de ruptura: um aumento de mais de 73% em um ano, e até oito vezes maior do que em 2014.

A falta de paracetamol e amoxicilina causou preocupação neste inverno, em meio à tríplice epidemia de influenza/bronquiolite/Covid-19. Porém, a situação é mais complicada em relação aos chamados medicamentos "de grande interesse terapêutico" ligados ao sistema cardiovascular, ao sistema nervoso (antiparkinson, antiepilépticos) e os anti-infecciosos. Os corticosteroides (medicamentos anti-inflamatórios que reduzem a vermelhidão e o inchaço) também estão na lista.

Dependência da China e da Índia

A produção de matérias-primas para os produtos mais antigos e tradicionais do mercado, incluindo os genéricos, havia sido remanejada para fora da Europa por razões de rentabilidade, questões sociais ou ambientais, em particular para a China e a Índia, países dos quais a França depende de 60% a 80%, no quesito produção de remédios.

Um limite que sobe para 95% para biomedicamentos (medicamentos produzidos a partir de organismos vivos, ao contrário dos medicamentos mais convencionais, fabricados quimicamente).

Em termos de saúde pública, a escassez dificulta o andamento dos tratamentos, com possíveis atrasos no atendimento à pacientes, com riscos de ineficácia ou efeitos adversos na substituição do medicamento em falta por outro.

As medidas de internalização da produção, contudo, levarão tempo para surtir efeito. Empresas do setor dizem que é preciso agir no curto prazo para conter a escassez e evitar problemas de oferta.

Os fabricantes exigem, por exemplo, um aumento nos preços dos medicamentos que caíram em domínio público, muitas vezes mais baixos do que nos países vizinhos, e ainda mais no atual contexto de inflação.

França Assos Santé, entidade de referência na representação de pacientes e usuários do sistema de saúde francês, recomendou uma reavaliação dos estoques obrigatórios de medicamentos prioritários em quatro meses, contra dois meses em vigor atualmente. Além disso, destacam a importância de "estoques de produtos semiacabados em nível europeu", como vidros, tubos e seringas.

(Com AFP)