Venezuelanos expatriados denunciam entraves para inscrição em cartórios eleitorais no exterior

Dúvidas e incertezas se acumulam em torno da eleição presidencial de 28 de julho na Venezuela preocupando inclusive cidadãos que vivem no exterior, que se mobilizam para votar. Mas um relatório assinado por várias ONGs denuncia obstáculos impostos por Caracas para impedir que expatriados possam se inscrever nos cartórios eleitorais fora do país. É o que eleitores venezuelanos vêm enfrentando na Argentina.

Théo Conscience, correspondente da RFI em Buenos Aires

Como milhares de venezuelanos espalhados pelo mundo, Armando Noguera fugiu do caos econômico de seu país. Radicado na Argentina desde 2017, ele esperava com ansiedade o pleito de 28 de julho para poder contribuir com uma mudança. "Quis me inscrever para poder exercer meu direito de voto, mas não consegui", conta.

No último 20 de março, dois dias após a abertura oficial das inscrições nos cartórios eleitorais, Armando se dirigiu ao consulado venezuelano em Buenos Aires. "Perguntei quando as inscrições abririam, e me responderam que não sabiam, que anunciariam nas redes sociais. Mas isso jamais aconteceu", relata. 

Foi finalmente dois dias antes da data limite do fim das inscrições que Armando soube por um amigo que o processo havia sido aberto. Mas, de volta ao consulado venezuelano em Buenos Aires, descobriu que precisaria renovar seu passaporte.

"Minha carteira de identidade válida e meus documentos de residência na Argentina não foram aceitos. Eles exigiram um passaporte, o que demora entre três e cinco meses para ser feito e que custa cerca de US$ 300, uma quantia que não é todo mundo que tem", reclama.

Obstáculos para a inscrição

Além do passaporte válido, os serviços consulares venezuelanos ainda exigem dos expatriados documentos de residência no exterior.

Para a advogada Luisa Vera, os obstáculos são numerosos e dificultam a participação dos eleitores que vivem fora do país. "O período para inscrição também foi muito curto diante da quantidade de venezuelanos que moram aqui", ressalta.

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Entre os 7,7 milhões de expatriados, 150 mil em idade de votar vivem na Argentina. Eles tiveram apenas quinze dias para realizar a inscrição no consulado em vez dos dois meses previstos inicialmente. 

Luisa contou à RFI que compareceu duas vezes ao consulado em Buenos Aires, sem jamais conseguir chegar ao final da fila. "Era impossível. Nem minha família, nem eu conseguimos. É uma pena porque perdemos uma verdadeira oportunidade de expressar nosso desejo de mudança para a Venezuela", diz. 

Cerca de 500 inscritos

Segundo a ONG de apoio aos migrantes venezuelanos na Argentina Aliança pela Venezuela, apenas 500 pessoas puderam se inscrever para votar no consulado venezuelano neste ano, além das cerca de duas mil pessoas já registradas. 

"Menos de 2% da população em condições de votar vai poder participar da eleição. É lamentável", afirma o presidente da ONG, Alexander Galvis. Segundo ele, a falta de informação oficial, a grande quantidade de documentos exigidos e o curto período para a inscrição são entraves colocados em prática pelo governo do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, para dificultar a participação dos eleitores que vivem fora do país.

"Está claro para todo mundo que a grande maioria dos quase oito milhões de venezuelanos espalhados pelo mundo são contra Maduro. Então, as autoridades não têm interesse em abrir o processo a mais eleitores nos consulados", aponta Galvis. 

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Pouca esperança de mudança

O presidente Maduro, que é candidato a um terceiro mandato, também mobiliza todo o aparelho do Estado a serviço de sua campanha contra o opositor Edmundo Gonzalez Urrutia. Por isso, como a eleitora Luisa Vera, muitos venezuelanos não têm esperanças de que haja uma mudança no país após a eleição. 

"Já passamos por tantas eleições e vimos o quanto o sistema eleitoral é corrupto. Nossa esperança é a longo prazo", diz. 

No final de maio, o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, considerado pró-Maduro, retirou seu convite à União Europeia, que enviaria observadores independentes para o pleito. A decisão reforça ainda mais as dúvidas sobre a fiabilidade da votação do 28 de julho. 

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