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O sucesso secreto da Obamacare

Paul Krugman

30/11/2013 00h01

A lei que criou a Obamacare (a reforma da saúde) foi oficialmente batizada de Lei de Atendimento de Saúde a Preço Acessível e Proteção do Paciente. E a parte do "a preço acessível" não se tratava apenas de prêmios subsidiados. Ela também visava "dobrar a curva" –reduzindo o aumento aparentemente inexorável nos custos da saúde.

Grande parte do establishment em Washington zombou da promessa da economia de custos. A postura predominante na capital é que uma reforma não é real a menos que as pessoas mais simples sofram; economias sérias devem supostamente vir de coisas como elevação da idade do Medicare –o seguro-saúde público para idosos (algo que o Escritório de Orçamento do Congresso concluiu recentemente que dificilmente economizaria dinheiro) e excluindo milhões de americanos do Medicaid (o seguro-saúde público para pessoas de baixa renda).

Na verdade, uma carta de 2011 assinada por centenas de economistas de saúde e do trabalho apontava que "a Lei de Atendimento de Saúde a Preço Acessível contém basicamente todos os artigos de contenção de custos que os analistas de políticas consideram eficazes para redução da taxa de gastos médicos". Mas essa posição dos especialistas foi em grande parte ignorada.

E então, como vão as coisas? As bolsas de saúde tiveram um começo turbulento, mas muitas, apesar de não todas, as medidas de controle de custos entraram em vigor. A curva foi alterada?

A resposta, incrivelmente, é sim. De fato, a desaceleração dos custos de saúde é dramática.

Ok, as ressalvas obrigatórias. Primeiro, nós não sabemos por quanto tempo as boas notícias durarão. Os custos de saúde nos Estados Unidos desaceleraram dramaticamente nos anos 90 (apesar de não tão dramaticamente), provavelmente graças à ascensão das organizações de manutenção de saúde, mas o crescimento do custo ganhou força de novo depois de 2000. Segundo, nós não sabemos ao certo quanto da boa notícia se deve à Lei de Atendimento de Saúde a Preço Acessível.

Mesmo assim, os fatos são notáveis. Desde 2010, quando a lei foi aprovada, o gasto em saúde real per capita –isto, o total de gastos corrigido pela inflação e crescimento da população– aumentou menos de um terço tão rapidamente quanto sua média a longo prazo. O gasto real por beneficiário do Medicare não cresceu; o gasto real por beneficiário do Medicaid na verdade caiu ligeiramente.

O que poderia ser responsável por essa boa notícia? Uma resposta óbvia é a economia ainda deprimida, que pode estar levando as pessoas a abrirem mão de atendimento médico caro. Mas essa explicação pode ser problemática de várias formas. Por um lado, a economia já estava estabilizada em 2010, mesmo que a recuperação tenha sido bem fraca, mas os custos de saúde continuaram desacelerando. Por outro, é difícil ver por que uma economia fraca teria um maior efeito na redução dos preços dos serviços de saúde do que em meio a um cenário de inflação. Finalmente, os gastos no Medicare não deveriam ser afetados pela economia fraca, mas eles desaceleraram ainda mais dramaticamente do que os gastos privados.

Uma história melhor se concentra no que parece ser um declínio em alguns tipos de inovação médica –em particular, uma ausência de novas drogas caras de sucesso, enquanto as drogas existentes apresentam expiração de patente e podem ser substituídas por marcas genéricas mais baratas. Esse é um fenômeno real; ele é, de fato, o principal motivo para o programa de medicamentos do Medicare ter gasto menos do que foi originalmente projetado. Mas como os medicamentos representam apenas 10% dos gastos em saúde, eles só explicam um pouco.

Logo, que aspectos da Obamacare podem estar contribuindo para desaceleração dos custos de saúde? Uma resposta clara é a redução pela lei dos "pagamentos excessivos" do Medicare –principalmente uma redução dos subsídios aos planos de saúde privados que ofereciam Planos de Vantagem do Medicare, assim como o corte do pagamento para alguns provedores. Uma fonte menos certa, mas provável, de economia envolve mudanças na forma como o Medicare paga pelos serviços. O programa agora penaliza os hospitais se muitos de seus pacientes forem readmitidos logo após receberem alta –uma indicação de mau atendimento– e as taxas de readmissão de fato caíram substancialmente.

O Medicare também está encorajando uma mudança da taxa por serviço, na qual médicos e hospitais recebem por procedimento, por um "atendimento responsável", no qual as organizações de saúde são recompensadas pelo sucesso geral na melhora do atendimento ao mesmo tempo que controlam os custos.

Além disso, há evidência de que a economia no Medicare "se espalha" para o restante do sistema de atendimento de saúde; quando o Medicare consegue reduzir o crescimento dos custos, os planos de saúde privados também ficam mais baratos.

E a maior economia ainda está por vir. O Conselho Consultivo Independente de Pagamento, um painel com poder de impor medidas para contenção de despesas (sujeitas a veto do Congresso) caso os gastos do Medicare cresçam acima da meta, ainda não foi estabelecido, em parte por causa da quase certeza de que qualquer nomeação ao conselho seria obstruída pelos republicanos, que gritariam "painéis da morte". Agora que a obstrução foi reformada, o painel pode passar a existir.

Resumindo, as notícias a respeito dos custos da saúde são incrivelmente boas. Você não ouvirá muito a respeito dessa boa notícia até e a menos que o site da Obamacare seja consertado. Mas abaixo da superfície, a reforma da saúde está começando a parecer um sucesso maior do que até mesmo seus defensores mais ardorosos esperavam.