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Fraudes recentes comprovam que é preciso supervisionar empresas

O presidente-executivo da Volkswagen, Martin Winterkorn, renunciou após o escândalo - Eric Piermont/AFP
O presidente-executivo da Volkswagen, Martin Winterkorn, renunciou após o escândalo Imagem: Eric Piermont/AFP

25/09/2015 17h46

Notícia: O presidente-executivo da Volkswagen renunciou após as revelações de que sua empresa cometeu fraude em uma escala épica, instalando software em seus veículos a diesel que detectavam quando suas emissões estavam sendo testadas, produzindo resultados baixos mentirosos. 

Notícia: O ex-presidente de uma empresa de amendoins foi condenado a 28 anos de prisão por conscientemente entregar produtos contaminados, que posteriormente mataram nove pessoas e adoeceram 700. 

Notícia: Os direitos de um medicamento usado para tratamento de infecções parasitárias foram adquiridos pela Turing Pharmaceuticals, que é especializada não em desenvolver novos medicamentos, mas em comprar os medicamentos existentes e aumentar seus preços. Neste caso, o preço passou de US$ 13,50 o tablete para US$ 750. 

Em outras palavras, foram bons dias para os conhecedores dos predadores nos negócios.

Sem dúvida serei acusado, como qualquer um que aponta os lapsos éticos por parte de algumas empresas, de satanizá-las. Mas não estou alegando que todos os empresários são do mal, apenas que alguns deles não são anjos. 

Há pessoas no mundo empresarial que farão o que quer que seja, até mesmo fraude que mata pessoas, para lucrar. E precisamos de uma regulação eficaz para policiamento desse tipo de mau comportamento, até mesmo para que empresários éticos não fiquem em desvantagem quando competirem com tipos menos escrupulosos. Mas já sabíamos disso, não é? 

Bem, sabíamos no passado, graças aos denunciadores e reformistas da Era Progressista. Mas Ronald Reagan insistiu que o governo era sempre o problema, nunca a solução, e isso se transformou no dogma da direita. 

Como resultado, uma parte importante da classe política americana passou a declarar guerra até mesmo às regulações mais obviamente necessárias. Um número grande demais de pessoas importantes argumenta, na prática, que as empresas não erram e que o governo não tem nenhum papel em limitar o comportamento impróprio. 

Um exemplo: nesta semana, Jeb Bush, que tem um talento impressionante para "timing" ruim, optou por publicar um artigo de opinião no "The Wall Street Journal" condenando o governo Obama por emitir "uma enxurrada de regras que matam empregos e esmagam a criatividade". Não importa seu uso impróprio de estatísticas escolhidas a dedo, ou o fato de os empregos no setor privado terem crescido mais sob as políticas "que matam empregos" do presidente Barack Obama do que durante o governo do irmão de Bush. 

E quais as regras terríveis, injustificadas, que Bush propõe eliminar? 

A regulação do carbono deve cair, é claro, porque não fazer nada a respeito da mudança climática se transformou em uma parte essencial da identidade republicana. Assim como a reforma da saúde de Obama. 

Mas Bush também propõe eliminar as regras em relação ao descarte de cinzas de carvão, um subproduto das usinas elétricas a carvão que contém mercúrio, arsênio e outros contaminantes que podem causar sérios problemas a saúde  caso se infiltrem as águas subterrâneas ou se espalhem pelo ar como poeira. Tentar limitar esses riscos soa como uma ação arbitrária, sem sentido? 

E há as escolas com fins lucrativos, um setor assolado por fraude –porque é muito difícil para os estudantes avaliarem o que estão recebendo– que deixa jovens americanos demais com dívidas pesadas e sem uma perspectiva real de melhores empregos. Mas Bush condena as tentativas de limpeza. 

Ah, e ele condena o governo por "regular a internet como uma empresa de utilidade pública", que pode soar estranho até você perceber que o que está de fato sendo regulado são os provedores de serviços de internet, que enfrentam pouca ou nenhuma concorrência em muitos mercados locais. Eu já mencionei que na Europa, onde os provedores de internet são obrigados a acomodar a concorrência, a banda larga é muito mais rápida e barata do que aqui? 

Por último, Bush pede por uma reversão da regulação financeira, repetindo a alegação amplamente desmentida de que a lei Dodd-Frank encoraja os bancos a se tornarem grandes demais para falir. (Os mercados discordam: a julgar pelos seus custos de tomada de empréstimos, os grandes bancos perderam, e não ganharam, desde que a lei Dodd-Frank entrou em vigor.) Por que deveríamos achar que deixar os bancos agirem de forma desenfreada representaria algum risco? 

O fato é que Bush não está errado em sugerir que houve um recuo na direção de uma maior regulamentação sob Obama, uma tendência que provavelmente prosseguirá se um democrata vencer a próxima eleição. Afinal, Hillary Clinton divulgou um plano para limitar os preços dos medicamentos  ao mesmo tempo em que Bush fazia seu ataque antirregulação. 

Mas a reação regulatória está ocorrendo por um motivo. Talvez tivéssemos regulações demais nos anos 70, mas já passamos 35 anos confiando que as empresas farão a coisa certa com supervisão mínima –e não funcionou. 

Assim, o que está acontecendo ultimamente é uma tentativa de consertar esse desequilíbrio, de substituir a oposição por reflexo à regulamentação por um uso sensato da regulação, onde há um bom motivo para acreditar que as empresas possam agir de formas destrutivas. Nós veremos a continuidade desse esforço? A eleição do ano que vem dirá.

Tradução: George El Khouri Andolfato