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Por que 2014 é importante

Sistema Cantareira continua com baixos níveis de água, na região de Joanópolis, mesmo após as fortes chuvas que caíram em São Paulo  - Danilo Verpa/Folhapress
Sistema Cantareira continua com baixos níveis de água, na região de Joanópolis, mesmo após as fortes chuvas que caíram em São Paulo Imagem: Danilo Verpa/Folhapress

Thomas L. Friedman

16/12/2014 00h06

Eu estava prestes a escrever uma coluna que começava assim: “Quando escreverem a história da resposta global à mudança climática, 2014 poderia muito bem ser visto como o momento em que o equilíbrio entre ação e negação pendeu decisivamente para a ação”. Isso graças à convergência de quatro forças gigantes: a seca em São Paulo; China e Estados Unidos terem optado juntos por serem verdes; a queda nos preços dos painéis solares; e a chegada de Google e Apple aos lares.

Mas, antes que pudesse prosseguir, o preço mundial do petróleo caiu, e o economista de energia Phil Verleger me escreveu dizendo: "Fratura hidráulica (fracking) é um avanço tecnológico semelhante à introdução do PC. Produtores de baixo custo como os sauditas responderão à ameaça desse aumento de oferta baixando os preços" –na esperança de que a queda do preço abaixo do custo da fratura hidráulica tire do mercado parte dos 'frackers' americanos.

Enquanto isso, ele acrescentou, os preços baixos sustentados do petróleo e do gás "retardarão" os esforços para venda de veículos mais eficientes em consumo de combustível, melhores para o meio ambiente, que são auxiliados pelos altos preços do petróleo, e desacelerarão a adoção de geração elétrica eólica e solar melhor para o clima, que é auxiliada pelo alto preço do gás.

Assim, acho que o lide (abertura do artigo) agora precisa ser assim: “Quando escreverem a história da resposta global para a mudança climática, 2014 certamente será visto como o momento em que o debate sobre o clima acabou”.

Os preços mundiais do óleo cru desabaram, tornando menos provável que o mundo faça o que a Agência Internacional de Energia (AIE) recentemente nos disse que devemos fazer: manter a maioria das reservas comprovadas de petróleo e gás no solo. Como alertou a AIE, "não mais que um terço das reservas comprovadas de combustíveis fósseis pode ser consumida antes de 2050" –caso contrário, nós ultrapassaremos o limite de aumento de 2ºC de temperatura média que os cientistas acreditam que provocará um derretimento de gelo, elevação do nível dos mares e eventos climáticos extremos realmente disruptivos.

A tecnologia é uma coisa cruel. Os inovadores que fizeram os painéis solares, a energia eólica e baterias tão eficientes que agora podem competir com o carvão e gás, são os mesmos inovadores que estão nos permitindo extrair petróleo e gás de lugares que nunca antes imaginávamos a preços que nunca acreditávamos que seríamos capazes. Será que uma terceira opção de lide é possível? É. Na verdade, há um lide incrível aguardando para ser escrito. Basta apenas a vontade política certa. E qual é?


Vamos voltar ao primeiro lide. O motivo pelo qual achei que estávamos pendendo decisivamente para a ação foi, em parte, por causa de notícias como esta da "BBC", em 7 de novembro, em São Paulo: "Na maior cidade do Brasil, um período recorde de seca e o consumo crescente de água levou a um duro racionamento". Quando uma região metropolitana de 20 milhões seca por casa da destruição de suas florestas naturais e bacias hidrográficas, mais um evento climático extremo que os cientistas acreditam ter sido intensificado pela mudança climática, a negação deixa de ser uma opção.

E há o acordo extremamente importante fechado entre o presidente Barack Obama e o presidente da China, Xi Jinping, em 12 de novembro, no qual os Estados Unidos reduzirão suas emissões de carbono em 26% a 28% abaixo dos níveis de 2005, e a China atingirá seu pico de emissões de carbono em 2030 ou antes. A China também se comprometeu a construir até 2030 um adicional de 800 a 1.000 gigawatts em energia limpa –ou quase tanta nova energia renovável na China quanto toda capacidade elétrica nos Estados Unidos atualmente. Isso estimulará enormemente a inovação em energia limpa e ajudará a fazer pela energia solar, eólica e pelas baterias o que a China fez pelos tênis –realmente derrubar os preços globais.

Também, em fevereiro, o Google comprou a Nest, por US$ 3,2 bilhões. A Nest produz um termostato inteligente de US$ 250 que pode economizar aos proprietários de imóveis uma tonelada de dinheiro, ao saber suas preferências de temperatura e administrar automaticamente seus sistemas de ar condicionado e aquecimento para maior eficiência. Também neste ano, a Apple anunciou o desenvolvimento do Apple HomeKit, que permitirá aos clientes controlar remotamente seus aparelhos e sistemas de energia domésticos por meio de seus iPhones. Quando Apple e Google começarem a competir para tornar os lares mais eficientes em energia, nós provavelmente veremos avanços não lineares.

Mas e se Verleger estiver certo –que assim como o custo da computação caiu após a introdução do PC, a tecnologia de fratura hidráulica possa inundar o mundo com petróleo cada vez mais barato, o transformando em uma barreira para a redução das emissões? Há uma forma de sair desse dilema. Vamos fazer a escolha política difícil benéfica para o clima, para o país e para nossos filhos: aumentar o imposto sobre a gasolina.

"As estradas americanas estão se despedaçando", disse Verleger. "A infraestrutura está entrando em colapso. Nossas ferrovias são uma piada." Enquanto isso, os preços nos postos estão caindo para US$ 2,50 o galão (3,78 litros) –a média nacional mais baixa desde 2009– e os consumidores estão correndo para comprar utilitários esportivos e caminhonetes.

 

A "solução clara", disse Verleger, é estabelecer um preço de, digamos, US$ 3,50  por galão de gasolina nos Estados Unidos, e então taxar qualquer preço abaixo disso até esse nível. Vamos deixar que os europeus façam sua própria versão. "E então começar a gastar bilhões em infraestrutura. A um imposto de US$ 1 por galão, os Estados Unidos poderiam arrecadar cerca de US$ 150 bilhões por ano", ele disse. "O efeito multiplicador do investimento daria um estímulo adicional à economia americana –e poderia até mesmo fazer a Europa começar a se mover."

Logo, há uma forma de tornar 2014 o ano realmente decisivo tanto no combate ao clima quanto na reconstrução dos Estados Unidos, mas apenas se nossos líderes políticos puderem escrever esse lide.