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Sem trabalho, guia turístico vai de sunga entregar água e alimento a familiares dos grevistas

"Há nove dias que não ganho um centavo. Como não tem trabalho, eu vou à praia fazer o quê, lá? Sou uma partícula nesse impasse aqui, quero ajudar", diz o guia turístico Jonas Alves, 61 - Janaina Garcia/UOL
"Há nove dias que não ganho um centavo. Como não tem trabalho, eu vou à praia fazer o quê, lá? Sou uma partícula nesse impasse aqui, quero ajudar", diz o guia turístico Jonas Alves, 61 Imagem: Janaina Garcia/UOL

Janaina Garcia

Do UOL, em Salvador

08/02/2012 15h15Atualizada em 08/02/2012 15h38

Vestindo apenas uma sunga vermelha e um tênis com meia, o guia turístico Jonas Alves, 61, se lambuza de bloqueador solar sob o forte sol de Salvador enquanto oferece a “água da paz” e pedaços de melancia. Ele também armazena outros itens em seu carro, como biscoitos e avisos em busca de doações.

Alves é um dos homens barrados pelas forças federais de segurança que fecharam os acessos do Centro Administrativo de Salvador nesta quarta-feira (8), nono dia de greve dos policiais militares no Estado. Cerca de 300 policiais em greve estão concentrados na Assembleia Legislativa, que fica dentro do CAB –a partir de hoje os amotinados estão sem acesso a água e alimentos. Religada ontem, a luz também foi cortada no local.

Morador da periferia o guia turístico contou que desde o início da greve está com serviço “à míngua”. Os dois únicos clientes que conseguiu, segundo contou ao UOL, foi um casal de idosos americanos que ele tentou levar para conhecer a capital baiana no último sábado. “Uns encapuzados de moto pararam meu carro quando eu deixava o aeroporto e ameaçaram por fogo. Não puseram, mas foi desesperador.”


Sem cliente –e pouco animado para ir à praia, segundo confessou–, resolveu levar alimentos e água aos que aguardam o impasse nas negociações pelo fim da greve. Entre os beneficiados estão familiares e amigos dos PMs grevistas, além de repórteres, cinegrafistas e militares das forças de segurança.

“Há nove dias que não ganho um centavo. Como não tem trabalho, eu vou à praia fazer o quê, lá? Sou uma partícula nesse impasse aqui, quero ajudar”, afirmou.

Alves se disse preocupado com o bloqueio de hoje. “Porque tem criança aí, né? São filhos de PMs. Se estiverem com sede, como faz?”, questionou, referindo-se aos familiares acampados em frente à Assembleia, fora da área de isolamento.

 

Entenda a greve

A greve na Bahia foi deflagrada na terça-feira, dia 31 de janeiro, por parte da categoria, liderada pela Associação de Policiais e Bombeiros da Bahia (Aspra). Doze mandados de prisão foram expedidos contra policiais militares que lideram o movimento, considerado ilegal pela Justiça. As prisões foram decretadas pela juíza Janete Fadul. Todos são acusados de formação de quadrilha e roubo de patrimônio público (carros da corporação). Além dos crimes, os policiais devem passar por um processo administrativo. Dois já foram presos.

Cerca de 300 policiais militares estão amotinados na Assembleia Legislativa em Salvador, cercados por forças federais. Na segunda-feira, soldados lançaram bombas de efeito moral e dispararam balas de borracha contra policias grevistas que estavam do lado de fora e que tentavam entrar no local.

De acordo com o líder do movimento, os grevistas não vão deixar a Assembleia até que sejam revogados os pedidos de prisão de 12 grevistas, além da concessão da anistia irrestrita para os envolvidos e o pagamento de gratificações. Segundo o governo estadual, a principal reivindicação dos policiais, que era a implantação de duas gratificações (a Gratificação de Atividade Policial-GAP 4 e 5), foi concedida em forma escalonada até 2015. "Com muito esforço orçamentário, ofereci entre 2012 e 2015 o atingimento no contracheque dessas duas gratificações", disse o governador Jaques Wagner (PT).

O impasse é sobre a anistia aos grevistas: enquanto os PMs não abrem mão desse ponto, o governador reiterou que os policiais envolvidos em "casos de vandalismo" serão punidos. "Os policiais que participaram legalmente, dentro das regras do processo reivindicatório, não têm com o que se preocupar. Mas todos aqueles condenados pela sociedade baiana que depredaram, quebraram e intimidaram a população devem ser investigados. Não há como falar em perdão quando se fala em atos de vandalismo."

A paralisação gerou um aumento da violência no Estado: houve registro de arrastões e aulas e shows foram cancelados. Os Estados Unidos chegaram a recomendar aos norte-americanos que adiem viagens "não essenciais" ao Estado. Em uma semana, o número de homicídios mais do que dobrou na região metropolitana de Salvador, segundo estatísticas oficiais do governo.