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MP investiga remoção de favelas próximas a lançamento de 14 empreendimentos em SP

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

29/11/2012 12h36Atualizada em 30/11/2012 12h29

A Promotoria de Habitação e Urbanismo de São Paulo investiga a remoção de moradores de favelas localizadas no entorno de 14 empreendimentos imobiliários lançados ou em vias de lançamento na região da avenida Chucri Zaidan, polo comercial de alto padrão do Campo Belo, na zona sul da capital paulista.

A área está dentro do perímetro da operação urbana Água Espraiada, da Prefeitura de São Paulo, que prevê a revitalização da região, próxima à avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, com a implementação de habitações sociais, sistema viário e transporte coletivo.

De acordo com o promotor José Carlos Freitas, o Ministério Público apura se as famílias removidas, supostamente em função de interesse imobiliário, estão sendo levadas para habitações sociais perto de onde moravam, conforme previsto.

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  • Arte/UOL

"Pela lei que a criou, a operação urbana precisa prover essas habitações às famílias removidas dentro da sua área de abrangência. O que verificamos é que o poder público está tentando tirar famílias que moram em favelas de todo o entorno da Chucri Zaidan para jogá-las em outro extremo desse perímetro, no Jabaquara", disse Freitas, em entrevista ao UOL.

Para o promotor, "o programa político hoje é de expulsão dessas famílias". "São porteiros, donas de casa, domésticas com seus trabalhos e filhos em creches, por exemplo. Transferir essas pessoas para longe dali é mais gasto público com infraestrutura e mais bolsões de pobreza que tradicionalmente se formam", afirmou, ressaltando que a escolha por áreas distantes é conveniente ao governo municipal. "São áreas bem menos valorizadas."

Freitas solicitou em setembro à Prefeitura de São Paulo dados sobre a assistência médica, social e habitacional dada aos moradores da região da Água Espraiada, inclusive da favela Sônia Ribeiro, conhecida como Piolho, que foi alvo de um incêndio que deixou mais de mil desabrigados no início daquele mês. A comunidade, que fica no Campo Belo, está próxima do Aeroporto de Congonhas e das obras da linha 17-ouro do Metrô.

MP investiga se incêndios nas favelas de SP têm relação com interesse imobiliário

O MP-SP (Ministério Público de São Paulo) investiga se existe relação entre os incêndios em favelas e a ação de grupos criminosos que representem interesses de especulação imobiliária. Entre os casos investigados está o incêndio que deixou 1.140 pessoas desabrigadas na favela do Piolho, no dia 3 de setembro. Em outro caso, o MP apura versão diferente da apontada pela polícia para incêndio na favela do Moinho ocorrido no dia 17 de setembro.

A Prefeitura informou que foram arrecadados R$ 3,2 bilhões para a operação urbana, de modo que R$ 2,9 bilhões advêm de leilão de Cepacs (Certificados de Potencial Adicional de Construção).

Segundo o promotor, "curiosamente", cerca de R$ 106 milhões (3,3% do arrecadado) foram gastos em obras de desapropriação e R$ 76 milhões em "taxa de administração" da SP Urbanismo (2,3%), que gerencia a operação, enquanto apenas R$ 73 milhões (2,2%) foram para as Habitações de Interesse Social (HISs).

"É muito pouco", criticou Freitas. "Notamos uma visível tendência de beneficiar a infraestrutura das proximidades de lançamentos imobiliários e uma arrecadação grande aos cofres do município, mas uma distribuição social muito pequena em obras e serviços que não são especificados quais."

Com isso, sobraram quase R$ 2,5 bilhões --78% do arrecadado-- ainda sem uso.

 

Outro lado

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano informou que os R$ 73 milhões destinados às HISs são para obras nos conjuntos Jardim Edite (R$ 31.462.963), Corruíras (R$ 26.452.295) e W. Luiz-Estevão Baião (R$ 15.796.960).

Mais R$ 106 milhões destinados a desapropriações, disse a pasta, serão gastos nos terrenos onde serão construídos os três conjuntos citados "e demais HISs nos setores Jabaquara e Americanópolis".

Sobram ainda R$ 152 milhões (4% do arrecadado) de recursos vinculados, que estão em caixa e devem ser usados em HISs. A secretaria afirma que, somando os valores, o total destinado às habitações é de cerca de R$ 332 milhões, embora não detalhe como e quando a maior parte do dinheiro será empregada.

"É possível verificar que a parcela destinada a HIS tem superado a casa dos 10%, índice que se tornou, a partir da Lei 15.416/2011, o mínimo a ser aplicado em HIS, voltado ao atendimento das famílias moradoras de favelas atingidas pelas obras do Programa de Intervenções da OUC Água Espraiada", informou o órgão.

Sobre a taxa de administração, a pasta disse que ela também engloba a SP Obras e "remunera os serviços prestados para gestão, gerenciamento, acompanhamento de todo o processo de emissão, distribuição e vinculação de Cepacs, bem como de obras, projetos, desapropriações e demais despesas no âmbito da OUC Água Espraiada".

A taxa de administração, segundo a Prefeitura, é de 1,5% sobre o valor arrecadado de Cepacs e de 3% sobre todas as demais despesas mencionadas.

Já a Secretaria Municipal de Habitação informou, em nota divulgada após a publicação da reportage, que "contribui com as investigações do Ministério Público Estadual" e que as comunidades em áreas de valorização imobiliária "estão, na verdade, incluídas num amplo programa habitacional dentro da Operação Urbana Consorciada Água Espraiada".

"As únicas famílias das comunidades no perímetro dessa Operação que hoje não estão mais ocupando seus imóveis --cerca de 1.000 --são aquelas que foram vítimas de incêndio ou as que desocuparam o terreno para a construção de conjuntos residenciais no mesmo local, que serão destinados a essas famílias. Todas recebem auxílio-aluguel até o atendimento habitacional definitivo e têm em mãos um documento de compromisso de atendimento como garantia", diz a nota.