Topo

Com metade da população, Baixada Fluminense tem 60% mais homicídios que Rio

Saílson José das Graças, 26, confessou em depoimento à Polícia Civil do Rio ter matado 39 mulheres ao longo de nove anos - Fábio Gonçalves/Agência O Dia/Estadão Conteúdo
Saílson José das Graças, 26, confessou em depoimento à Polícia Civil do Rio ter matado 39 mulheres ao longo de nove anos Imagem: Fábio Gonçalves/Agência O Dia/Estadão Conteúdo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

18/12/2014 06h00

Apesar de ter pouco mais da metade da população da cidade do Rio de Janeiro – 3,6 milhões de pessoas contra 6,3 milhões -, os 13 municípios que compõem a Baixada Fluminense registram juntos 59,1% mais assassinatos que a capital, segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública). Ao todo, foram cometidos cerca de cinco homicídios dolosos por dia na região em 2014, enquanto no Rio este número cai para cerca de três mortes por dia.

Entre janeiro e outubro foram registrados 1.674 homicídios dolosos na Baixada Fluminense, que compreende os municípios de Duque de Caxias, Belford Roxo, Guapimirim, Itaguaí, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, São João de Meriti, Seropédica. Já na cidade do Rio de Janeiro, no mesmo período, ocorreram 1.052 assassinatos.  

Frente a essa realidade, casos como o do suposto matador em série Saílson José das Graças, 26, que a polícia acredita que tenha cometido ao menos sete dos 43 assassinatos que confessou, perdem-se em meio a um mar de violência cotidiana. O próprio delegado responsável pelo caso, Pedro Medina, titular da DH (Delegacia de Homicídios) da Baixada, inaugurada em fevereiro, admite a dificuldade em investigar todas as mortes na região. “A Baixada tem cinco assassinatos por dia, é uma região muito grande”, afirma.

Saílson foi preso na última terça-feira (9) suspeito de ser o responsável pelo assassinato de uma mulher de 64 anos na Baixada Fluminense. Ao ser "apresentado" à imprensa na delegacia na quinta-feira (11) disse ter matado 39 mulheres, um bebê e três homens ao longo dos últimos nove anos. As mulheres ele afirmou ter assassinado por "prazer"; os homens a mando da companheira, Cleusa Balbina, 42, em troca de comida e moradia.

Para o sociólogo Ignácio Cano, professor da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e integrante do Laboratório de Análise de Violência, a Baixada Fluminense pode ser considerada uma das regiões mais violentas do país e da América Latina. Ele diz que diversos fatores explicam a situação, entre eles o descaso histórico do Estado com a área.

"De forma geral, se pensa muito pouco na Baixada. É uma região abandonada. Todos os projetos que o Estado faz, e não apenas de segurança pública, começam no município do Rio de Janeiro e dificilmente se estendem até lá”, afirma.

Cano cita como exemplo os processos contra milicianos. Segundo ele, a milícia é comum na Baixada há muito tempo, mas só se tornou caso de polícia e passou a ser investigada e punida depois que se infiltrou na política do Rio de Janeiro. “O que acontece lá gera pouco impacto”, diz. 

O sociólogo lembra ainda a forte presença de grupos de extermínio, muitos deles relacionados a lideranças políticas locais e os altíssimos níveis de impunidade na região. Lenin Pires, antropólogo e professor da UFF (Universidade Federal Fluminense)  acrescenta os “confrontos de proximidade”, como desavenças entre vizinhos e conhecidos e até mesmo casais, como um dos fatores que elevam a taxa de homicídios na região. “Todo mundo acho que os conflitos entre as pessoas não merecem atenção até serem transformados em caso de polícia”, afirma.