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'Qualquer um pode ter na carteira nota roubada do BC em 2005', diz delegado

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

30/07/2015 06h00

Uma década se passou, e o roubo ao Banco Central de Fortaleza ainda guarda a pecha de maior assalto já realizado no país. Por três meses, 36 pessoas de três quadrilhas --duas de São Paulo e uma cearense-- se uniram para praticar o furto. Dos R$ 164,8 milhões levados entre os dias 5 e 6 de agosto de 2005, apenas R$ 40 milhões foram recuperados até hoje.

Todos os envolvidos no engenhoso assalto foram identificados e a maioria, condenada pelo Judiciário. Há ainda dois foragidos entre os 36 que participaram do assalto e quatro já morreram. Mas a recuperação do montante roubado durante não alcançou 25% do total levado.

“As pessoas pensam: 'Só R$ 40 milhões de mais de R$ 160 milhões?'. Só que, ao contrário, nunca em um crime dessa espécie houve uma apreensão em valores tão altos como esse. Claro que, se pudesse recuperaria tudo, mas foram notas de R$ 50 usadas e não rastreáveis. São notas que estão girando no sistema bancário, sem nenhuma condição de identificar. Eu, você ou qualquer um pode ter uma delas na carteira. Elas circulam até hoje”, afirmou em entrevista ao UOL o delegado aposentado Antônio Celso dos Santos, que por cinco anos comandou a investigação.

Segundo planilha da Justiça Federal, os leilões realizados com os bens apreendidos, realizados entre 2007 e 2013, recuperaram R$ 12,5 milhões do valor roubado. O restante foi recuperado em dinheiro vivo.

O delegado do caso não tem dúvidas de que a competência da quadrilha em executar o crime não foi a mesma para não deixar rastros. “Foi muito engenhosa e bem executada a construção do túnel e a retirada do dinheiro. Depois eles não foram tão competentes. Nenhum crime é perfeito, todos deixam pistas. Com quatro meses tínhamos todos os envolvidos identificados. A demora era não só para prender, mas também para recuperar o que foi roubado”, afirmou.

“Recuperação total era impossível”

Segundo o delegado, recuperar todo o valor roubado era impossível por uma série de motivos. Um deles é que os assaltantes compraram bens com valor bem acima aos de mercado.

“Eles precisavam se desfazer rápido do dinheiro e pagaram pelos bens mais do que valiam. Se você levar em conta o valor pago por eles para adquirir esses bens, o valor recuperado seria de R$ 60 milhões, não R$ 40 milhões”, explicou.

As investigações apontaram que o dinheiro roubado foi dividido em partes iguais entre as quadrilhas. “Segundo eles, cada cabeça do grupo recebeu pouco mais de R$ 50 milhões para dividir em partes iguais. Quer dizer, algumas pessoas receberam um pouco menos. No final das contas, os chefes devem ter ficado com um pouco mais”, afirmou.

Passados dez anos, Antônio Celso afirma que, apesar da complexidade e da duração do caso --foram cinco anos após a identificação de todos os participantes diretos e posteriores do caso--, o resultado da investigação foi satisfatório.

“Para a polícia, o caso está encerrado, todos os participantes foram identificados, a grande maioria já foi condenada, muito do dinheiro foi recuperado. As pessoas que participaram devem estar arrependidas, pois nunca tiveram uma resposta tão pesada. O que foi possível fazer, fizemos”, revelou.

Fantasia popular sobre o caso

Entre a casa 1071 na rua 25 de Março e a sede do banco são 80 metros. Por três meses, o grupo fez uma obra de engenharia ao perfurar um túnel e conseguiu manter a discrição --nem vizinhos nem autoridades desconfiaram de nada. Desde então, a casa não foi mais alugada. Tudo isso fez surgir mitos sobre o caso.

“Até hoje esse crime deixa para população muitas perguntas, muitas fantasias. Histórias foram criadas, por conta dessa quantia que foi furtada”, disse Antônio Celso.

Sobre o filme lançado em 2011, o delegado diz que é obra de pura ficção. “O filme não tem nada a ver com a realidade. A única coisa real ali é o banco, o dinheiro e o túnel. Não fui procurado. Eles devem ter coletado informação da imprensa, algumas pessoas que saberiam e criaram uma obra de ficção”, contou.

Relembre o caso

O plano do assalto foi traçado três meses antes do furto. Para ter acesso ao cofre do Banco Central, as três quadrilhas decidiram alugar uma casa próxima à sede do prédio. De lá, eles cavaram um túnel de 80 metros que deu acesso ao cofre do banco. Para localização exata de onde estava o dinheiro já usado, eles contaram com informações de um vigilante do prédio.

Para não levantar suspeitas, uma empresa de fachada de venda de grama foi montada para justificar o fluxo de pessoas e saída de sacos de terra retirada do chão durante as escavações. Até brindes foram feitos e dados para conquistar os vizinhos.

O túnel era revestido por tábuas de madeira, sacos de areia e lonas plásticas e iluminada por lâmpadas, com direito a sistema de refrigeração.

Na noite do dia 5 de agosto de 2005, uma sexta-feira, o grupo chegou ao objetivo e fez um buraco no chão. Eles fizeram o furo na parte de trás do cofre e impediram a captação de imagens por meio de pedaços de madeira.

Segundo a polícia, o dinheiro levado eram notas de R$ 50 que estavam foram de circulação e foram retiradas até a manhã do sábado. Em seguida, os assaltantes fugiram com o montante já dividido para várias partes do país. O crime só foi descoberto na manhã segunda-feira seguinte, dia 8.

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