Preconceito: Mito da democracia racial só fez mal ao negro no Brasil
O Brasil é um país racista. Casos como os dos insultos ao jogador Michel Bastos e à atriz Taís Araújo nas redes sociais expõem essa realidade com mais visibilidade. O sofrimento de ambos, por serem figuras públicas, tende a comover mais as pessoas.
Mas, segundo especialistas e ativistas sociais, o país ainda reflete as mesmas relações escravocratas de séculos atrás.
“As máscaras caíram. O movimento negro contemporâneo foi responsável pelo desmonte do mito da democracia racial”, afirma Rosane Borges, jornalista e professora da Universidade Estadual de Londrina (PR).
O termo, difundido a partir do livro “Casa Grande e Senzala” (1933), de Gilberto Freyre, considera que as relações entre negros e brancos no Brasil se deram e se dão de forma harmônica.
“Os indicadores sociais demonstram como isso é falso. Dados do IBGE e de IDH [sobre qualidade de vida] mostram como a raça é que organiza as relações sociais no Brasil”, afirma Borges. Para os estudiosos, a pobreza não explica a mudança nos índices sociais quando se considera apenas a população negra.
Vilma Reis, socióloga e ouvidora-geral da Defensoria Pública do Estado da Bahia, concorda: “Quando eu olho o sistema prisional, por exemplo, eu vejo um sistema colonial, de vingança contra negros e negras”. “Somos mais de 50% do total da população, mas mais de 70% dos pobres e bem mais da metade dos desempregados”, compara.
Douglas Belchior, blogueiro e militante do movimento negro, reforça que há muito tempo “existe uma cultura de negação do racismo”. “Somos educados a naturalizar o racismo, a achar que é normal”, diz Belchior.
Xingamentos nas redes sociais
Para eles, as redes sociais amplificam as vozes, tanto dos caluniados quanto dos caluniadores.
“A internet tira isso de um circuito confinado a um espaço doméstico ou nos clubes e vira uma caixa de ressonância”, diz Borges.
“É melhor ter um campo de batalha aberto. Você sofre a ofensa e se pronuncia no mesmo lugar. Quem é homofóbico ou racista não vai recuar, com ou sem as redes sociais”, diz Reis.
Douglas Belchior diz, contudo, que “a estrutura da sociedade em que a gente vive é muito mais violenta do que a da web”. “A internet faz um favor para a gente, para o bem e para o mal. Explicita valores que estão presentes na sociedade.”
Novos tempos
A visão sobre o racismo também se transformou. Antes o preconceito era creditado a uma ação de indivíduos, “exageros” esporádicos. “Agora se revela que nosso tecido social é racista”, afirma Borges.
Nem por isso os entrevistados acham que exista um aumento no número de casos. “O que acontece agora é que estamos com mais coragem de levantar e nos pronunciar”, diz Reis. “As novas gerações foram educadas a reagir e a não se calar. O tempo atual não é de silêncio.”
Um indicativo é o crescimento das denúncias à Ouvidoria Nacional da Igualdade Racial. De 219 em 2011, saltaram para 570 até outubro de 2015 --como comparação foram 567 em todo 2014.
Qual a saída?
Para Leci Brandão, as pessoas só aprendem se forem presas ou pagarem multas. “E só vai parar mesmo quando os negros forem para o poder. A marca afrodescendente está em tudo. Servimos de degrau para eleger presidente, governador, prefeito. E depois não levam nenhum negro para os ministérios.”
O professor Belchior diz que precisamos “enfrentar o poder branco instituído no país”. “As pessoas não nascem racistas. Elas aprendem isso.”
Já a socióloga Vilma Reis diz ter fé na luta social. “Não há um salvador da pátria. Quando se encontram respostas, os racistas levantam novas perguntas. Mas não podemos desistir.”
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