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Reservatório do Cantareira tem nível mais baixo que o da pré-crise de 2014

Vista aérea da represa do rio Jaguari, em Joanópolis, no interior de São Paulo, na sexta-feira (11) - Luis Moura/Estadão Conteúdo
Vista aérea da represa do rio Jaguari, em Joanópolis, no interior de São Paulo, na sexta-feira (11) Imagem: Luis Moura/Estadão Conteúdo

Daniela Garcia

Do UOL, em São Paulo

12/05/2018 04h00Atualizada em 15/05/2018 14h38

Principal manancial da região metropolitana de São Paulo, o reservatório de abastecimento de água do Sistema Cantareira está operando com nível inferior ao cenário que provocou a crise de abastecimento de 2014 e 2015.

O reservatório contava, na última sexta-feira (11), com 49,3% de sua capacidade (sem considerar a reserva do chamado volume morto). Em 2012 e 2013, anos que antecederam à crise, o Cantareira contava com, respectivamente, 73,5% e 61,5%. No ápice da falta de abastecimento, o nível do reservatório chegou a ficar "negativo", sendo necessário o uso do volume morto.

Dois especialistas ouvidos pelo UOL dizem que registrar menos de 50% da capacidade antes da entrada oficial na temporada seca -- entre junho e outubro --, está longe do cenário ideal. Em abril, o Cantareira recebeu um nível de chuva de 22,4 mm, quando a média para abril é de 86,6 mm, segundo medições da Sabesp.

Para Pedro Luiz Côrtes, professor do Programa de Ciência Ambiental (Procam) da USP e coordenador da Rede Internacional de Estudos sobre o Meio Ambiente, esses fatores podem indicar um "prenúncio de crise". “A região Sudeste é propensa a ter um período severo de estiagem, como prova esse comportamento ao longo de 2017 e começo de 2018. Isso reforça essa preocupação, que pode ser o prenúncio de uma nova crise. O melhor seria que entrássemos no período de estiagem com o volume operacional entre 60% e 70%, para que ficássemos mais tranquilos”, afirma.

O patamar atual é classificado por órgãos reguladores como "estado de atenção" e se aproxima do "alerta" – que impõe mais restrições de retirada de água das represas.

Desde a crise hídrica que atingiu São Paulo, foram adotadas faixas de atenção que correspondem à capacidade do volume operacional:

  • Normal: mais de 60%
  • Atenção: entre 60% e 40%
  • Alerta: entre 40% e 30%
  • Restrição: entre 30% e 20%
  • Especial: com menos de 20%

Para a Sabesp (estatal paulista de abastecimento), não há motivo para preocupação. Tanto a faixa de alerta do Cantareira quanto o fato de o manancial ter recebido chuvas 20% abaixo da média nos últimos meses estão sob controle.

Segundo nota do instituto Climatempo divulgada na quarta-feira (9), o mês de junho deve ter chuva levemente acima do normal para as áreas de captação do reservatório da Cantareira, mas ainda assim, estará abaixo do esperado para o início da estação seca.

Em janeiro deste ano, integrantes do PCJ (consórcio para recursos hídricos que representa prefeituras e entidades civis da região de Campinas) divulgaram nota em que alertava a população sobre a possibilidade uma nova crise hídrica no Estado.

De acordo com o relatório, sem a ocorrência de chuvas consistentes, as chances de indisponibilidade de água e de dificuldades de abastecimento são grandes. O consórcio citava preocupação diante do fenômeno climático La Niña, que pode deixar a região Sudeste mais seca, e alertava sobre a necessidade de investimentos em segurança hídrica em SP.

Anna Carolina Lobo, coordenadora do Programa Mata Atlântica e Marinho da ONG WWF-Brasil, diz que o nível baixo do Cantareira deste ano se deve às medidas paliativas adotadas pela gestão dos recursos hídricos. “Desde que houve a crise e foi liberada a reserva técnica, a gente já sabia que isso era quase que enxugar gelo. Isso não significava que o problema seria resolvido. Na verdade, a gente está olhando para um bioma, que é a Mata Atlântica, que historicamente, vem sendo desmatada desde 1500, e sem floresta não tem água”, afirma.

Na avaliação da coordenadora, é necessário dar atenção ao reflorestamento para aumentar a cobertura vegetal para contornar o problema da estiagem. "Enquanto a gente não investir em restauração florestal e conectividade de corredores para aumentar a cobertura vegetal, a gente vai continuar a lidar com secas cada vez maiores.”

Sistema 'robusto', após crise

Diferentemente dos outros especialistas, o engenheiro Luiz Roberto Gravina Pladevall, presidente da Apecs (Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente), diz que a situação de alerta deve ser acompanhada de perto, mas descarta escassez hídrica até o final deste ano.

Segundo Pladevall, atualmente os órgãos responsáveis têm mais condições de enfrentar a seca, pois o sistema de tratamento e de distribuição da água dentro da cidade está mais eficiente e seguro. Ele cita como exemplos as obras de interligação Jaguari-Atibainha e do Sistema São Lourenço. 

De acordo com a Sabesp, a interligação Jaguari-Atibainha permite transferir água entre duas bacias distintas conforme a necessidade e que, no sentido do Cantareira, pode enviar até 162 bilhões de litros de água por ano -- volume equivalente a uma represa Guarapiranga cheia. Já o Sistema São Lourenço, que amplia a oferta de água tratada em até 6.400 litros de água potável por segundo, atendendo uma área que antes era abastecida principalmente pelo Cantareira.

A empresa afirma possuir "um sistema mais robusto", com mais interligações e maior capacidade de tratamento de água do que antes da crise hídrica de 2014. "Temos agora outros dois sistemas funcionando. Se necessário, é possível reforçar o avançar de outros mananciais para a área do Cantareira", diz