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EUA e Cuba finalmente movem engrenagem diplomática enferrujada na Guerra Fria

17.dez.2014 - Alunos e professores cubanos comemoram em uma escola em Havana, Cuba, após anúncio do presidente Raúl Castro - Ramon Espinosa/AP
17.dez.2014 - Alunos e professores cubanos comemoram em uma escola em Havana, Cuba, após anúncio do presidente Raúl Castro Imagem: Ramon Espinosa/AP

Damien Cave

18/12/2014 06h01

Alan Gross foi o obstáculo que não se movia –o empreiteiro americano cujo aprisionamento em Cuba mantinha a relação entre os Estados Unidos e Cuba paralisadas, como uma engrenagem emperrada.

Agora, tanto em Washington quanto em Havana, o obstáculo foi removido e as engrenagens enferrujadas da diplomacia da Guerra Fria começaram a se mover.

A soltura de Gross na quarta-feira (17), em conjunto com a soltura de três espiões cubanos condenados detidos nos Estados Unidos, representa uma quebra coletiva de mais de 50 anos de desconfiança, raiva e inércia. Tanto o presidente Barack Obama quanto Raúl Castro, o presidente de Cuba, encontrarão sua própria forma de descrever o que foi feito, mas está claro que ambos deram uma chance à busca pelo caminho da reconciliação.

Os prisioneiros mantidos em cada país eram uma queixa central para aqueles em Washington e Havana que defendiam a manutenção do status quo entre os dois países. Mas Obama e Castro agiram de modo contrário aos linhas-duras em seu meio na soltura simultânea de presos que foram usados e reutilizados, repetidas vezes, por críticos que há muito defendem o distanciamento e a inimizade.


Ambos os líderes têm vitórias para apontar –e concessões que terão que explicar. Mas os passos dados até o momento, e as mudanças políticas mais amplas anunciadas pela Casa Branca na quarta-feira, têm o potencial de transformar as relações entre os Estados Unidos e Cuba, talvez de formas não vistas desde que um rebelde chamado Fidel desceu das montanhas cubanas.

"O que esse conjunto de medidas pode fazer é superar mais de 50 anos de hostilidade improdutiva e desafortunada entre nós e Cuba, que trabalhou em detrimento de ambos os países", disse Eric Hershberg, diretor do Centro para Estudos Latinos e Latino-Americanos da Universidade Americana, que está em Havana para uma conferência.

Mas não será fácil. As possibilidades de políticas práticas abertas para Obama ainda são relativamente limitadas. Os advogados que estão interpretando os poderes executivos do presidente argumentam que ele não pode simplesmente suspender o embargo contra Cuba, mas pode trabalhar pelas beiradas.

Cuba: país em transição; entenda

As mudanças que Obama está anunciando incluem: o aumento do valor que os americanos podem enviar para Cuba, de US$ 500 para US$ 2 mil a cada trimestre; a ampliação dos motivos para os americanos poderem viajar para Cuba, incluindo qualquer viagem em "apoio ao povo cubano"; e permitir que bens e suprimentos sejam vendidos aos cubanos para ajudar a estimular e expandir o crescente número de empresas de pequeno e médio porte dali.

Obama também anunciou uma expansão das vendas de tecnologia de informação para Cuba, com a meta declarada de ajudar o povo cubano a "se comunicar livremente".

Cuba, por sua vez, estará sob intensa pressão para permitir mais liberdade de expressão, libertar da prisão os dissidentes domésticos e abrir o acesso à informação e tecnologia –uma das maiores exigências dos jovens cubanos na ilha. Aos olhos deles, se Cuba e os Estados Unidos estão conversando de novo e não são mais apenas inimigos, então a lógica do governo cubano de limitar a informação para proteção contra intrusão americana não mais se aplica.

Esses velhos hábitos e culturas, é claro, não mudarão facilmente. O prisma pelo qual Cuba sempre viu os Estados Unidos é a soberania. Os cubanos são criados para se orgulharem da capacidade do país de desafiar os Estados Unidos, e a história da ilha está repleta de exemplos de heróis cubanos lutando para se livrar do jugo de potências estrangeiras, começando pela Espanha e depois os Estados Unidos.

Uma decisão importante que pode ajudar a restaurar o relacionamento, segundo aqueles favoráveis a relações mais calorosas, envolve a remoção de Cuba da lista de nações que patrocinam o terrorismo.

Mas independente do que acontecerá a seguir, os próximos meses e anos de discussão entre as autoridades cubanas e americanas serão um esforço para contornar os conflitos do passado. A soltura de Gross e dos prisioneiros cubanos permite acesso, discussão, terapia diplomática, como precursores de melhores relações. Mas navegar em meio às velhas discórdias e novos desafios exigirá uma destreza que nenhum líder de ambos os países conseguiu exibir em décadas de relações confusas e intensas.