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Não temo ser criticado, diz Barroso após voto que absolve réus do mensalão

Fernanda Calgaro

Do UOL, em Brasília

26/02/2014 19h15Atualizada em 26/02/2014 20h32

Após votar por livrar condenados no mensalão do crime de quadrilha, incluindo o ex-ministro José Dirceu, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso disse nesta quarta-feira (26) não temer ser julgado pela opinião pública.

“Eu só temo ser criticado pelo que eu não fiz. Pelo que fiz, sou e penso, eu não temo ser criticado”, afirmou ao final da sessão em que recebeu duras críticas por parte do presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa.

Exaltado e demonstrando irritação, Barbosa discordou dos argumentos de Barroso de que as penas impostas aos condenados por formação de quadrilha foram, proporcionalmente, muito mais severas e destoaram das penas fixadas para os demais crimes.

Barroso entendeu que as penas deveriam ser mais baixas, o que resultaria na prescrição delas, ou seja, os condenados não poderiam mais ser punidos. Durante a sessão, o ministro defendeu que "antes de ser exemplar e simbólica, a Justiça precisa ser justa". 

"Fontes diversas divulgam o sentimento difuso de que qualquer agravamento das penas é bem-vindo e de que a imputação de quadrilha em particular teria caráter exemplar e simbólico. É compreensível a indignação contra a histórica impunidade das classes dirigentes no Brasil. Mas o discurso jurídico não se confunde com o discurso político. No dia em que o fizer, perderá sua autonomia e autoridade. O Supremo Tribunal Federal é um espaço da razão pública, e não das paixões inflamadas. Antes de ser exemplar e simbólica, a Justiça precisa ser justa, sob pena de não poder ser nem um bom exemplo nem um bom signo", afirmou quando apresentava o seu voto. 

Após a sessão, o ministro minimizou o embate com Barbosa e disse que debates exaltados acontecem em qualquer tribunal do mundo, a diferença é que, segundo ele, no caso do Brasil, isso acontece “ao vivo e a cores”.

“É um caso que despertou muitas paixões. (...)É preciso considerar que o Supremo Tribunal Federal é o único tribunal no mundo que debate e delibera em público e nas câmeras de televisão. Portanto, em todos os tribunais existem trocas de ideias, momentos de exaltação. Portanto, isso não é uma peculiaridade brasileira. A peculiaridade brasileira é que é ao vivo e a cores”, afirmou.

Tipos de recurso

EMBARGO DECLARATÓRIO: É um pedido para que um magistrado esclareça o que quis dizer em sua sentença ou acórdão, ou quando ele deixou de se pronunciar a respeito de algum ponto sobre o qual deveria ter se pronunciado. Não tem poder de reverter condenações.
EMBARGOS INFRINGENTES:São cabíveis quando um réu é condenado, mas recebe pelo menos quatro votos pela absolvição. Neste caso, o STF pode realizar um novo julgamento e até reverter a condenação

Ele disse que aceita as críticas e observou que é preciso aceitar que as instituições se transformam de maneira lenta. 

“Quem aceita um cargo como esse [de ministro do STF] e quem aceita entrar em um julgamento dividido como esse tem que pagar o preço da crítica, tem que pagar o preço das pessoas que veem o mundo de uma maneira diferente, tem que pagar o preço por vezes de uma certa impaciência com o modo lento com que as instituições se transformam.”

Ele defendeu ainda o seu voto sob o argumento de que o “que move o direito é o princípio da proporcionalidade”.

“Em relação à corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, que são crimes muito mais graves, o tribunal aumentou a pena-base em 20%, em 30%. E, quando chegou em relação à quadrilha, presentes as mesmas circunstância de fato, porque é o mesmo julgamento, aumentou-se a pena em 75%, que foi, na minha visão, mas que não é uma crítica a ninguém, uma forma de escapar da prescrição. Eu acho que o acórdão teve um descritério, uma desproporcionalidade, por um motivo que eu, pessoalmente, não considero legítimo”, afirmou.

O ministro argumenta também que a lei descreve o crime de quadrilha como uma associação de pessoas que se uniram para cometer um crime, determinando que precisaria ter sido criada com essa finalidade específica.

No caso do mensalão, tanto o PT quanto as empresas e bancos que colaboraram com o esquema não foram criados com esse fim, embora depois tenham participado de atividades ilícitas, segundo entendimento do Barroso.

“A posição é que não houve uma associação para cometer crimes. As pessoas e os núcleos tinham desígnios completamente diferentes e fins completamente diferentes, que não eram cometer crimes, porém, para realizar os fins que tinham, cometeram crime. Os crimes foram meios e não fins”, explicou. “Não acho que tenha havido uma entidade autônoma, como exige a lei, para caracterizar quadrilha.”

Barroso ressaltou ainda que manteve todas as demais condenações, como corrupção ativa, corrupção passiva, gestão fraudulenta de instituição financeira, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. “Todas essas penas estão mantidas.” 

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