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Conselho de Medicina fere direitos da mulher ao proibir parto domiciliar e parteiras em hospitais, diz presidente de entidade de enfermeiros

Do UOL, no Rio*

23/07/2012 16h22

“As resoluções do Cremerj inibem o direito da mulher de decidir onde e por quem será acompanhada no seu parto, praticamente a obrigando a dar à luz no hospital. O Cremerj desrespeita os preceitos dos manuais do Sistema Único de Saúde (SUS) sobre os direitos sexuais e reprodutivos, além dos decretos do Ministério da Saúde referentes à humanização no parto”, afirmou o Coren (Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro) em documento assinado pelo presidente da entidade, o enfermeiro Pedro de Jesus.

Duas resoluções do Cremerj (Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro) proíbem a realização de partos domiciliares e vedam a atuação de parteiras, de acompanhantes (conhecidas como "doulas") e obstetrizes (profissionais que acompanham o pré-natal) em ambientes hospitalares.

As resoluções são reprovadas por movimentos sociais e organizações de enfermeiros e obstetrizes, que já se mobilizam para promover atos públicos e levar o caso ao Ministério Público. O Coren --que representa enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem, além de obstetrizes-- anunciou que irá entrar com uma ação civil pública contra a proibição.

As medidas foram publicadas no Diário Oficial da última quinta-feira (19), e deram origem a uma acalorada discussão sobre os direitos das gestantes. O Cremerj entende que a assistência perinatal prestada "por pessoas não habilitadas e/ou de profissões não reconhecidas na área da saúde" coloca em risco mães e bebês.

Segundo a entidade, "no decorrer do trabalho de parto e até 24 horas após podem ocorrer eventos adversos, que representem risco à parturiente e ao recém nato". As resoluções do Cremerj garantem apenas as presenças de "acompanhantes legais" (tais como o marido e parentes) e das enfermeiras legalmente reconhecidas "durante e após a realização do parto".

Além disso, se flagrados participando de partos domiciliares, os médicos que possuem registro no conselho (CRM) podem responder a processos administrativos que possivelmente levarão à cassação do direito de exercer a profissão. A rigor da lei, as parteiras e doulas também estarão sujeitas a processos na esfera judicial.

O Coren reclama ainda de um abuso de poder por parte da entidade representativa dos médicos. "[O Cremerj age] impondo fiscalizações ao trabalho de enfermeiras e parteiras, bem como das casas de Parto, quando obriga as equipes de emergência a notificarem o Conselho de Medicina, sempre que ocorrerem complicações em pacientes submetidas a partos domiciliares e seus conceptos ou oriundas das chamadas casas de Parto".

"Parto domiciliar é um retrocesso"

Em relação à presença das acompanhantes nos hospitais, o conselheiro do Cremerj Luís Fernando Moraes afirmou à Agência Brasil que elas não têm nenhuma formação na área da saúde.

“Pessoas leigas dentro de uma sala cirúrgica, atuando, nós achamos que isso é inseguro também para a paciente, porque essas pessoas não têm formação, não têm noções de assepsia, de cuidados. Por isso, a gente tenta proteger a paciente com essas resoluções”, disse.

Além disso, segundo ele, o Conselho Federal de Medicina e a própria Sociedade de Ginecologia consideram o parto domiciliar “um retrocesso e inseguro”.

A coordenadora do curso de Obstetrícia da USP, Nadia Zanon Narchi, disse que encarou com surpresa as duas resoluções do Cremerj, em especial pela inclusão das obstetrizes. A USP formou, desde 2008, cerca de 120 profissionais do ramo, que são registradas oficialmente como enfermeiras obstetrizes no Coren, após quatro anos e meio de curso.

Não há notícias, segundo Narchi, de atuação desses profissionais fora do estado de São Paulo, o que causa uma sensação de estranhamento diante da inclusão da categoria na resolução.

“O mercado de trabalho exige uma mudança na forma como as mulheres são atendidas. O atendimento obstétrico hoje é muito ruim, o Brasil consegue ser o campeão mundial de cesáreas, hospitais privados não tem vaga, e os médicos ficam loucos porque agendam cesáreas desnecessárias”, critica Narchi. (Com Agência Brasil)