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Busca por informações sobre testes de DNA aumenta após caso Jolie

Testes de DNA podem estimar as chances do aparecimento de mais de 2,2 mil doenças genéticas hereditárias, incluindo tipos raros de alzheimer, casos de câncer e até síndrome de Down - Afp
Testes de DNA podem estimar as chances do aparecimento de mais de 2,2 mil doenças genéticas hereditárias, incluindo tipos raros de alzheimer, casos de câncer e até síndrome de Down Imagem: Afp

Chris Bueno

Do UOL, em São Paulo

21/06/2013 07h00

No dia 14 de maio deste ano, Angelina Jolie, uma das atrizes mais famosas do mundo, anunciou que havia passado por uma dupla mastectomia preventiva para reduzir o risco de câncer. A decisão foi tomada depois que ela descobriu que tinha uma mutação no gene BRCA1, que representa 87% de chances de desenvolver câncer de mama e 50% de desenvolver câncer de ovário.

A atriz perdeu a mãe, que morreu aos 56 anos, por causa de um câncer. Jolie comentou que não queria que isso acontecesse aos seus filhos também. A notícia teve grande repercussão, que já pode ser sentida nos laboratórios que realizam testes de DNA no Brasil.

Dois dos maiores laboratórios do país, o do Grupo Fleury e o do Hospital Israelita Albert Einstein, foram contatados pela redação do UOL para avaliar se a procura por testes de DNA - que detectam problemas como a mutação no gene BRCA1 – teria sofrido um aumento algumas semanas após a divulgação do caso da atriz.  

A resposta foi positiva. “Uma semana após a notícia ter saído na mídia, a procura por informações sobre o teste foi cinco vezes maior. Porém, ainda estamos avaliando se o volume de testes colhidos também cresceu”, aponta Flavia Balbo Piazzon , assessora médica de Genética Molecular do Grupo Fleury.

“O interesse pela informação aumentou e a procura pelos testes também – algo entre 5% e 10%. No entanto, a maioria não se converteu em realização, porque não havia uma necessidade real e nem mesmo uma indicação médica para tanto”, explica David Schlesinger, pesquisador do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (IIEPAE) e médico colaborador do Ambulatório de Neurogenética do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP).

Reprodução assistida

Também houve aumento pela procura de testes na clínica de reprodução humana do IPGO (Instituto Paulista de Ginecologia e Obstetrícia), em São Paulo. Porém, a clínica examina também os embriões de casais que tenham ou desconfiam ter uma doença genética antes de implantá-los no útero, evitando que o bebê nasça com problemas como hemofilia, fibrose sística, doença de Huntington e doença de Tay Sachs, por exemplo (veja box).

“A procura pelos testes aumentou, especialmente para detectar a mutação nos genes BRCA 1 e 2, que é o caso da atriz. Antes, era uma média de dois casos mensais. Em maio, chegamos a ter uma procura de dois casos por semana”, diz Arnaldo Schizzi Cambiaghi, especialista em infertilidade do Centro de Reprodução Humana do IPGO  e membro da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana.

Teste detecta cerca de 130 doenças genéticas em embriões

  • Divulgação/Grupo Huntington Medicina Reprodutiva

    Nenhum pai gosta que seu filho fique doente. Por isso muitos casais que tem um histórico de alguma doença genética têm medo que seu filho herde essa condição. No entanto, já existem exames que podem detectar no embrião a pré-disposição de desenvolver alguma doença e possibilitem ao casal, através da reprodução assistida, selecionar embriões que não carreguem mutações genéticas.

    O diagnóstico pré-implantacional (DPI) ajuda os casais com chances de gerar filhos com problemas genéticos como síndrome de Down, distrofia muscular, hemofilia e doença de Huntington, a diagnosticar no embrião a existência de alguma doença genética ou cromossômica. Essa técnica é utilizada em clínicas de reprodução humana em tratamentos de fertilidade como a clínica do IPGO.

    O DPI consiste na retirada de uma célula do embrião em laboratório, no terceiro dia de desenvolvimento. A célula é analisada e o resultado é obtido em poucas horas. O embrião é analisado antes de ser colocado no útero, e o procedimento não afeta o futuro bebê. “Os embriões que não apresentarem alteração genética são implantados no útero, enquanto aqueles em que alguma mutação esteja presente são congelados”, explica Arnaldo Schizzi Cambiaghi.

    Já é possível detectar cerca de 130 doenças através do teste, e sua precisão é de 95%. Apesar da técnica não ser recomendada para todas as mulheres que desejam engravidar – é preciso ter indicação e aconselhamento médico para tanto – a tendência é que esse tipo de exame se torne cada vez mais comum. “Com o avanço da tecnologia, esses testes se tornarão cada vez mais comuns. Eles só não são mais comuns, hoje, devido a seu alto custo, mas a procura por eles vem aumentando ano a ano”, afirma o médico.


Examinando o DNA

Hoje, os testes de DNA podem estimar as probabilidades do aparecimento de mais de 2,2 mil doenças genéticas hereditárias, incluindo tipos raros de alzheimer, alguns cânceres e síndrome de Down, com cerca de 95% de chance de acerto – um índice considerado muito alto.

O exame geralmente é feito a partir de uma simples coleta de sangue e o resultado é entregue em 30 dias. O DNA é avaliado por meio de marcadores moleculares, que são pedaços de DNA com uma sequência de bases nitrogenadas conhecida. Algumas doenças já foram identificadas com uma sequência específica de DNA, o que torna possível identificar a pré-disposição para seu desenvolvimento.

“Os testes genéticos são, em sua maioria, realizados em uma amostra habitual de sangue, sem necessidade de jejum ou qualquer outro preparo. Desse sangue extrai-se o DNA do paciente, que é amplificado, sequenciado e, então, analisado. Se for encontrada uma mutação, o laudo é simples e explicativo para o bom entendimento do médico solicitante do exame”, explica Piazzon. Apesar de o  recurso ter se tornado mais acessível e barato nos últimos anos, ele ainda é caro: hoje, os chamados testes de mutação genética custam algo entre R$ 4 mil e R$ 6 mil.

Saliva

Recentemente, uma nova técnica está disponível para se pesquisar estes genes, feita a partir da saliva, e já disponível no IPGO. Como o fluido contém grande número de células da mucosa bucal descamadas, é possível extrair o DNA para análise.

A coleta é simples e não invasiva: basta depositar a saliva no frasco coletor. Em seguida ela é misturada a um líquido estabilizador de DNA, que impede que o mesmo seja degradado e possa ser posteriormente avaliado. A única exigência é não comer, beber ou fumar no período de duas horas antes da coleta. O frasco é enviado ao laboratório especializado, onde é extraído o DNA e feita a pesquisa dos genes.

A técnica apresenta a mesma eficiência do teste de DNA feito através do sangue, porém com um custo menor: o exame sai por menos de R$ 1 mil. “Ele é menos invasivo, mais barato e tem uma taxa de acurácia de 96%. Tudo isso faz com que seja mais acessível, permitindo que pessoas que antes não poderiam fazer o teste para confirmar a pré-disposição genética de uma doença agora possam fazê-lo”, diz Cambiaghi.

Mapeamento genético

Outro recurso já disponível no país é a análise do exoma, conjunto dos cerca de 180.000 éxons (sequências de DNA) presentes no genoma humano. A análise do exoma consiste em sequenciar todos os mais de 20.000 genes do genoma de uma pessoa para identificar as mutações que causam doenças genéticas. A diferença é que é necessário apenas um teste para identificar várias doenças.

“Anteriormente, era preciso fazer um exame para procurar uma mutação capaz de causar doença. O que significa que, para procurar outra mutação, era necessário outro exame. Com o sequenciamento e análise de exomas, passou a ser possível investigar todos os genes com um único exame. Se há desconfiança de outro problema, é possível retornar ao teste para procurar a mutação, sem ter que fazer um novo exame”, explica Schlesinger, do HC. “Além disso, a sensibilidade desse exame está acima de 99%”, continua.

Com a análise de exoma também é possível detectar o risco de doenças que podem ser causadas por dezenas ou centenas de genes diferentes, como deficiência mental, autismo e surdez – o que é mais difícil com o teste tradicional. No Brasil, o recurso está disponível no Hospital das Clínicas da Universidade  Federal de Minas Gerais (UFMG), na Mendelics, na Helixxa e na DLE Medicina Laboratorial.

Diagnóstico precoce

Os testes de DNA podem ajudar no diagnóstico precoce de muitas doenças. Ao identificar a predisposição para uma determinada enfermidade, a pessoa pode tomar uma série de atitudes que ajudem a amenizar seus efeitos, ou até mesmo impeça sua manifestação.

Testes para detectar mutações em BRCA1 e BRCA2 vão ficar mais baratos

O Supremo Tribunal Federal rejeitou por unanimidade as patentes sobre genes BRCA1 e BRCA2 e dois genes ligados a formas hereditárias de câncer de mama e câncer de ovário, genes que existem naturalmente no corpo. Esta decisão pode levar a testes mais baratos para as pessoas que podem ter alto risco de desenvolver câncer.

“Se o teste identificar uma manifestação em BRCA 1 ou 2, o paciente descobre que tem um risco aumentado para os cânceres de mama e ovário ao longo da vida e pode fazer exames de vigilância para o diagnóstico precoce desses males semestralmente ou até mesmo retirar as mamas e/ou ovários profilaticamente (antes de aparecer o câncer). Isso pode ajudar a diminuir o risco da doença se desenvolver”, afirma Piazzon, do Fleury.

No entanto, há certas situações em que muito pouco – ou mesmo nada – pode ser feito. Esse é o caso da doença de Huntington, que é hereditária e degenerativa, afeta o sistema nervoso central e leva à perda progressiva tanto das faculdades mentais quanto do controle físico de braços, pernas e rosto, e para a qual não há cura nem tratamento. Nesse caso, muitas pessoas com histórico familiar da doença preferem nem fazer o teste, para não sofrer antecipadamente.

Os médicos alertam que os testes de DNA predizem a possibilidade de uma doença, mas não dão a certeza de que a mesma irá se desenvolver. Além disso, nem todas as pessoas precisam fazer o teste de DNA. Isso porque os testes genéticos não são simples nem fáceis de decifrar, e a interpretação equivocada dos resultados, assim como o aconselhamento inadequado, pode levar os pacientes a se submeterem a tratamentos e exames desnecessários, além de passar por situações de estresse emocional.

“Pessoas com histórico familiar claro de uma doença genética devem fazer o exame para detectar a possibilidade de desenvolvê-la – e sempre após a indicação e aconselhamento de um médico especialista. Para pessoas que não se encaixam nesse perfil, não recomendamos o teste”, diz Schlesinger.