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Vírus ebola pode chegar ao Brasil durante a Copa? Especialistas respondem

Micrografia eletrônica colorida de transmissão (TEM) obtida pelo Centro de Controle de Doenças (CDC) em Atlanta, Estados Unidos, revela um pouco da morfologia ultraestrutural exibida por uma partícula viral do vírus  - Cynthia Goldsmith/AFP Photo /Divulgação/CDC
Micrografia eletrônica colorida de transmissão (TEM) obtida pelo Centro de Controle de Doenças (CDC) em Atlanta, Estados Unidos, revela um pouco da morfologia ultraestrutural exibida por uma partícula viral do vírus Imagem: Cynthia Goldsmith/AFP Photo /Divulgação/CDC

Cármen Guaresemin

Do UOL, em São Paulo

05/04/2014 07h00Atualizada em 07/04/2014 12h54

Ebola é considerado por muitos o vírus mais perigoso que a humanidade conhece atualmente. Ele voltou às manchetes recentemente graças a um surto em Guiné que já causou a morte de 84 pessoas, e sete outras na Libéria. Sem contar casos suspeitos no Mali, todos países da África Ocidental. Trata-se de uma "epidemia sem precedentes", segundo a organização humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF).

“Enfrentamos uma epidemia de uma magnitude nunca vista antes em termos de distribuição de casos no país", disse o coordenador da MSF em Conacri (capital de Guiné), Mariano Lugli, por meio de um comunicado.

O vírus foi batizado com esse nome por ter sido identificado pela primeira vez em 1976 na República Democrática do Congo (antigo Zaire), perto do rio Ebola. Desde então, causou cerca de 1.500 mortes na África e é considerado uma ameaça para a saúde global e até mesmo um possível agente de guerra biológica.

Nunca houve casos da doença em humanos fora do continente africano, mas agora, com a chegada da Copa do Mundo, quais seriam as chances do vírus imigrar para o Brasil?

Para o infectologista Celso Granato, diretor clínico do Fleury Medicina e Saúde, as chances de o vírus chegar ao país são muito remotas, mas não impossíveis, já que vivemos num mundo globalizado.

“O problema seria a pessoa vir da África, ou após ter visitado algum país do continente, com o vírus incubado. Isso porque é muito comum se confundir os sintomas da doença com os da malária, dengue e leptospirose, por exemplo. Também é comum que a equipe médica acabe se infectando, por não saber qual a real doença”.

Com ele concorda o infectologista José Ribamar Branco da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo: “Muito improvável que chegue aqui. Esses surtos costumam ocorrer em locais muito pobres, desprovidos de modelos de higiene”.

Gorilas e morcegos

Granato conta que o vírus pode ficar incubado por até duas semanas. Os principais sintomas são febre forte, dores de cabeça e musculares, conjuntivite e debilidade. Já na fase mais aguda, provoca vômitos, diarreia e hemorragias. A transmissão ocorre por vias respiratórias ou por contato com fluidos corporais das pessoas infectadas.

“O quadro é uma síndrome febril hemorrágica. Na grande parte das doenças que conhecemos, o vírus se adapta ao organismo. Não é um bom negócio o parasita matar o hospedeiro, mas no caso do ebola isso não acontece. É uma doença muito agressiva e bastante transmissível”.

O médico conta que, quando o vírus surgiu, os pesquisadores não sabiam quais eram os hospedeiros, não conseguiam descobri-lo. “Há cerca de cinco anos, chegou-se à conclusão que seria o morcego do tipo frugívoro, aquele que se alimenta de pequenas frutas”, diz Granato.

Anos atrás, porém, acreditava-se que o hospedeiro do ebola fosse o gorila, porque os surtos humanos começaram depois que as pessoas comeram esse animal. Após estudos mais elaborados, cientistas perceberam que os morcegos são os hospedeiros naturais do vírus e que os primatas talvez sejam infectados por meio da ingestão de frutas nas quais os morcegos salivaram ou defecaram.

Na África, é comum as pessoas comerem tanto gorilas como morcegos. Os cientistas presumem que foi desta forma que o filovírus (vírus particularmente mortal para o organismo humano) se alastrou pela região.

Bioterrorismo

Por ser uma doença muito local, até agora, a indústria farmacêutica não tem muito interesse em pesquisar possíveis vacinas ou medicamentos para o ebola. “A farmacêutica não se interessa, mas a medicina militar, sim. As Forças Armadas dos Estados Unidos afirmaram em um congresso de medicina tempos atrás que estão buscando alternativas para esta doença”, conta Granato.

Ele cita o Walter Reed National Military Medical Center, em Maryland, onde estariam fazendo pesquisas estratégicas sobre o tema. “Creio que eles tenham interesse em desenvolver alguma vacina ou medicamento porque terroristas podem usar o ebola como uma arma bacteriológica muito letal e atacar uma embaixada americana, por exemplo”.  

Branco acrescenta: “O ebola poderia se transformar em uma arma terrorista, sim. Por isso, os americanos têm estratégias em relação ao vírus. Costumam isolá-lo e monitorá-lo. Claro que são meio paranoicos, mas o contingente de soldados espalhados pelo mundo é muito grande”.

Sobre a doença estar se espalhando em família, como no caso de um homem que vive em Gueckedou, próximo das fronteiras com a Libéria e Serra Leoa, que perdeu dez parentes, inclusive a irmã, Granato afirma que se trata de caso co-primário (caso seguinte ao primário dentro de um período inferior ao de incubação). “São pessoas que moram na mesma região e tiveram contato entre si. É uma forma comum de o vírus se alastrar”.

Branco acredita que nos próximos dias a OMS (Organização Mundial da Saúde) irá criar um plano de contingência e até mesmo colocar os países que apresentaram casos da doença em quarentena.

“Países europeus e os Estados Unidos provavelmente vão juntar todas as forças para que o vírus não se espalhe. Aqui, creio que os órgãos de saúde também tomarão medidas especialmente em relação aos voos que chegarem vindos da África. Porém, repito, o perigo do vírus chegar aqui é muito remoto”.

Ministério da Saúde

Questionado se alguma medida seria tomada no período da Copa do Mundo, época que o país receberá muitos estrangeiros, o Ministério da Saúde informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “o ebola é um surto localizado apenas na África e a OMS tem acompanhado a evolução do surto diariamente”.

O ministério lembrou ainda que a própria OMS não pediu, até agora, para que as pessoas evitem viajar àquela região africana, devido ao surto do vírus, e que não há razão para “causar nenhum alarde”.