Laboratório que vendia cápsula contra câncer é fechado; três são presos
Um laboratório irregular que produzia e comercializava cápsulas de fosfoetanolamina sintética, substância que supostamente combate o câncer, foi fechado nesta terça-feira (8) em Conchal (a 180 km de São Paulo). Três pessoas foram presas e duas estão foragidas. Cada frasco com o produto era vendido por R$ 180 e, segundo a Polícia Civil do Distrito Federal, que coordenou a ação, o grupo faturava R$ 900 mil mensais.
Todos os envolvidos são de uma mesma família. Eles conseguiram, ainda não se sabe de que forma, a fórmula da fosfoetanolamina sintética produzida pela USP (Universidade de São Paulo), e vendiam as cápsulas com o produto para todo o país, pela Internet e por telefone, com entrega pelos Correios. A polícia não sabe quantas pessoas compraram o produto.
Segundo o delegado João de Ataliba, diretor adjunto da divisão do Consumidor da Polícia Civil do Distrito Federal, que coordenou a ação, a polícia chegou à quadrilha após uma denúncia anônima feita há 45 dias por um paciente que iria comprar o remédio.
As investigações culminaram na descoberta do grupo e no fechamento do laboratório que, segundo Ataliba, não tinha a menor condição de funcionar. “O local funcionava no fundo de uma casa e não tinha higiene nenhuma, relatou.
Análise da substância
Agora, a Polícia Civil irá enviar as cápsulas para análise para determinar se o produto que o grupo entregava efetivamente era fosfoetanolamina. Independente dos resultados, entretanto, todos os envolvidos indiciados por associação criminosa e venda ilegal de medicamentos, cujas penas somadas podem passar de 23 anos de prisão.
Ataliba informou ainda que os crimes cometidos pelo grupo possuem ainda um agravante: ao contrário da USP, eles recomendavam aos pacientes que compravam as cápsulas para pararem com todos os tratamentos convencionais de combate ao câncer, como a quimioterapia.
Esquema
Segundo as investigações da polícia, o esquema era comandado por Jonas Lutzer, que era o responsável pela venda e vivia em uma chácara em Sobradinho, no Distrito Federal. No interior de São Paulo, a produção era operada pelo químico Sérgio Gabriel Lutzer, irmão de Jonas.
Foi Sérgio quem, ainda de acordo com a polícia, conseguiu a fórmula da fosfoetanolamina. Também foi ele o responsável pela criação e operação do laboratório em Conchal. Dois filhos dele, Sérgio Alexandre e Ana, seriam os responsáveis pelo armazenamento do produto. Já Maria Madalena Lutzer, irmã de Sérgio e de Jonas, era a responsável pelo envio do produto aos compradores.
Ontem, a polícia já prendeu Jonas, Sérgio e Sérgio Alexandre. Eles foram levados para Araras, onde estão à disposição da Justiça -- pai e filho foram detidos enquanto produziam uma fornada do medicamento. Com eles, foram encontrados R$ 56 mil, além de estufas, fornos industriais, máquinas para fazer as cápsulas e substâncias químicas para fazer o medicamento.
Já as outras duas integrantes do grupo chegaram a ser detidas e foram ouvidas pelos policiais, mas acabaram liberadas por conta de problemas coma burocracia, mas já há mandado de prisão.
A reportagem tentou localizar o advogado responsável pela defesa dos envolvidos, mas não conseguiu até o fechamento da matéria.
Entenda
Desenvolvida na USP de São Carlos, a fosfoetanolamina sintética começou a ser distribuída gratuitamente para pacientes interessados nos anos 1990 mas uma decisão da USP determinou, em junho de 2014, que a universidade não produzisse mais a substância sem registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Após a decisão ser implementada, e apesar de não haver pesquisas comprovando a segurança ou eficácia da substância para o tratamento do câncer em seres humanos (apenas alguns estudos preliminares in vitro e com camundongos), centenas de pacientes entraram com ações na Justiça para ter direito à fosfoetanolamina.
Em uma série de ações judiciais, o TJ (Tribunal de Justiça) de São Paulo concedeu liminares obrigando a USP a entregar o composto aos pacientes mas, no mês passado, o Órgão Especial do TJ determinou a suspensão do fornecimento da fosfoetanolamina sintética.
Desde então, com o aumento da pressão social, o Ministério da Saúde anunciou investimentos de R$ 10 milhões para estudar a substância e houve uma série de pedidos para que a fosfoetanolamina fosse liberada, mas não como medicamento. A substância deve ser testada nos próximos anos.
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