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'Não vai ter golpe': frases de Trump sobre impeachment repetem retórica de Dilma em 2016

Falas de Trump sobre impeachment poderiam ser confundidas com as ditas por Dilma em seu processo de afastamento - BBC
Falas de Trump sobre impeachment poderiam ser confundidas com as ditas por Dilma em seu processo de afastamento Imagem: BBC

18/12/2019 16h20

Nesta quarta-feira, o presidente americano viverá na pele os momentos de tensão que a ex-presidente Dilma encarou quando o processo de impeachment foi votado em Brasília.

Nesta quarta-feira (18/12), o presidente americano Donald Trump vive na pele momentos de tensão parecidos com os que a ex-presidente Dilma Rousseff encarou em meados de 2016, quando o processo de impeachment foi votado na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Nas últimas cinco semanas, em meio a debates, depoimentos de testemunhas e coletas de documentos, o americano subiu o tom contra os opositores do Partido Democrata tentando se defender com argumentos bastente conhecidos pelos brasileiros.

"É golpe", repete Trump como um mantra, ecoando as palavras ditas por Rousseff há três anos.

Algumas frases proferidas são quase idênticas, incluindo a hashtag #StoptheCoup - ou #PareoGolpe. A versão brasileira, usada até hoje por apoiadores da ex-presidente, é #nãovaitergolpe

Apesar da retórica de defesa semelhante nas redes sociais, as trajetórias e características políticas dos de Dilma e Trump são bem distintas. A primeira foi eleita como sucessora de Luiz Inácio Lula da Silva pelo PT, símbolo da esquerda brasileira. O segundo foi eleito após dois mandatos seguidos do democrata Barack Obama - e se elegeu com apoio das alas mais conservadoras da sociedade americana e do Partido Republicano.

As acusações também diferem profundamente.

Frases

"A cada dia que passa, fica mais claro que o que está acontecendo não é um impeachment, mas um golpe planejado para tirar o poder da população e do voto."

Quem disse a frase acima?

Acertou quem apostou em Trump. O presidente americano é alvo de investigação por abuso de poder e obstrução do Congresso.

Segundo os acusadores, Trump teria constrangido o governo da Ucrânia a anunciar uma investigação contra um opositor político, em troca de ajuda militar ao país. Em um telefonema em 25 de julho, ele teria pedido que o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, investigasse o adversário democrata Joe Biden e seu filho, Hunter Biden. O americano teria ainda tentado atrapalhar inquérito sobre sua conduta.

"Arquitetaram a minha destituição, independentemente da existência de quaisquer fatos que pudessem justificá-la perante a nossa Constituição."

A frase acima também poderia ter sido dita por Trump, mas veio da boca de Dilma, há três anos.

Diferente do americano, o impeachment da petista foi disparado por denúncias de atrasos em repasses para bancos públicos - as chamadas pedaladas fiscais - e pela publicação de decretos aumentando despesas mesmo quando a meta fiscal não estava sendo cumprida.

"O impeachment é a maior trapaça da história da nossa política", disse Trump. "Impeachment sem crime de responsabilidade é o quê? É golpe", já afirmou Dilma.

O desfecho dos dois casos também deve ser distinto.

Vai ter impeachment?

É consenso entre analistas que o impeachment de Donald Trump deve ser aceito na Câmara, onde os deputados do Partido Democrata são maioria.

Já no Senado, se tudo se mantiver como está hoje, Trump deve ser inocentado por uma ampla maioria de parlamentares republicanos.

"Isso não é um impeachment. É um golpe de Estado."

A frase acima - idêntica a diversas falas de Dilma - foi dita por Trump nas últimas semanas.

A brasileira, por outro lado, viu sua base de sustentação se erodir ao longo de seu pimeiro governo e de uma reeleição apertada contra o tucano Aécio Neves.

O impeachment se tornou inevitável quando o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, rompeu oficialmente com o governo e passou a apoiar o afastamento da presidente.

"Desde a proclamação dos resultados eleitorais, a oposição fez de tudo para impedir a minha posse e a estabilidade do meu governo."

A fala acima, muito semelhante ao tom adotado pelo americano nas redes sociais, foi dita por Dilma durante seu processo de impeachment.

Cartas

Nesta terça, o presidente dos EUA descarregou sua fúria em relação ao processo de impeachment em uma carta à líder democrata, Nancy Pelosi.

A acusação que ele fez contra a presidente da Câmara dos Deputados é muito parecida com os comentários de Dilma sobre Eduado Cunha: o impeachment seria uma "guerra aberta à democracia americana".

Com pouca esperança de alterar o resultado da votação na Câmara, Trump usou a carta de seis páginas para atacar o processo e denunciar Pelosi, que abriu o inquérito formal de impeachment contra ele em setembro.

Trump afirmou na carta que havia sido "privado de um processo constitucional básico desde o início desse golpe de impeachment" e "teve negados os direitos mais fundamentais previstos na Constituição, incluindo o direito de apresentar provas".

"Um processo mais justo foi concedido até no julgamento das bruxas de Salem", escreveu.

No Brasil, uma carta também marcou o processo de impedimento de Dilma. Mas ela foi escrita por seu então vice-presidente, Michel Temer, e divulgada à imprensa.

O texto, considerado o pontapé inicial para a derrocada da brasileira, foi imortalizado pela expressão "vice decorativo" - forma como Temer descreveu sua posição no governo dilmista.

"Tenho ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB", disse Temer à época.