Por Carolina Marins
Donald Trump deixa no próximo dia 20 a presidência dos EUA. Mas, ainda hoje, a sua vitória nas eleições de 2016 é motivo de estudos.
Como um bilionário, apresentador de programa e sem carreira política ou militar, se tornou presidente da maior potência mundial?
Embora sua vitória naquelas eleições tenha sido uma surpresa, ela vinha
se desenhando na sociedade e na política americana anos antes.
A ascensão de Trump ocorreu junto
do crescimento do radicalismo
de extrema-direita nos Estados
Unidos e no mundo.
Os EUA têm um longo histórico ligado à extrema-direita, sendo o berço do maior grupo supremacista do mundo: a Ku Klux Klan. Porém, supremacistas, nacionalistas e neonazistas tendiam a ser grupos pequenos e pouco relevantes no cenário político.
Mas acontecimentos recentes favoreceram o seu crescimento.
Em 2010, a Primavera Árabe trouxe diversas mudanças para a região do Oriente Médio. Mas também provocou a maior crise humanitária da atualidade: um êxodo migratório para os países europeus.
Com os refugiados, também veio a xenofobia, e movimentos nacionalistas europeus ganharam força.O ápice do movimento nacionalista na Europa foi observado em 2016, quando, em uma votação com resultado surpreendente, o Reino Unido decidiu se separar da Europa.
O famoso Brexit. O plebiscito foi marcado por acusações de manipulação da opinião, notícias falsas e até interferência externa.
Embora não fosse um Alt-right declarado, Trump já havia participado de movimentos conspiratórios no passado. Em 2008, ele foi um nome proeminente do movimento "Birther" que questionava o país de nascimento do então candidato à presidência Barack Obama (ele dizia ser o Quênia, mas Obama nasceu no Havaí).
Mais tarde, Trump admitiria que seus questionamentos não tinham qualquer embasamento.
Além de falar com os extremistas, Trump inovou ao falar também com outra parcela esquecida do eleitorado americano: a classe média-baixa branca, pouco instruída e que havia empobrecido nos anos anteriores.
Uma parcela que podia até não concordar em absoluto com os extremistas, mas também não
os rechaçava.
Com Trump, a extrema-direita mundial ganhou um reforço de peso. Outros líderes extremistas, como Matteo Salvini, na Itália, e Viktor Orbán, na Hungria, vibraram.
Aqui, Jair Bolsonaro se elegeu repetindo a cartilha trumpista e tem mantido a estratégia até agora.
Durante o mandato, Trump abandonou os Alt-right. Bannon foi demitido.
Muitas de suas pautas não avançaram, como o muro. Mas, ainda assim, ele agiu para reverter pautas de costumes como o aborto, foi linha dura com a migração, negou o aquecimento global e garantiu uma maioria aos conservadores na Suprema Corte.
Mesmo sem Bannon e os Alt-right, Trump continuou utilizando a estratégia extremista de desqualificar a imprensa e, principalmente, o sistema eleitoral americano.
Sua mais recente cartada foi acusar as eleições de 2020 de fraude e incitar seus apoiadores a mancharem rumo ao Congresso, que terminou invadido e depredado.
Com a saída de Trump, especialistas esperavam que os movimentos populistas do mundo perdessem força, já que seu maior apoiador sairia de cena. Mas o episódio do Capitólio parece ter mudado essa percepção.
Trump sai deixando a democracia americana mais fragilizada do que quando entrou e deve influenciar líderes de outros países.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro já deu sinais de deve contestar o resultado das eleições de 2022, em especial se o voto não for impresso, como pede.
Há algum tempo, ele tem alegado ter ciência de indícios de fraudes na eleição que o elegeu em 2018, que alega, sem provas, ter vencido no primeiro turno.
Analistas temem que ele siga o exemplo do aliado.
Desde as eleições de 2018 que o elegeram, Bolsonaro vem construindo a narrativa de fraude nas eleições. Script repetido nas eleições municipais de 2020.
Com uma democracia muito mais nova e menos sólida que a americana, o temor é o tamanho do estrago que as atitudes do presidente daqui pra frente podem trazer para o Brasil.
Quem também vai sofrer com as consequência do governo trumpista é o tradicional partido Republicano. Embora não se apoie nos ideais de Trump, foi conivente com seus atos.
A dificuldade agora será lidar com as vozes extremistas do partido que ganharam força nos anos Trump. Além de precisar reconstruir uma liderança republicana com boa reputação para as próximas eleições.
Seu legado como 45º presidente dos Estados Unidos será o de uma sociedade dividida, uma democracia arranhada, instituições fragilizadas e um sistema eleitoral em suspeição para grande parte da população.
Além de um manual sobre extremismo para o resto do mundo.
Edição: Clarice Cardoso e Luciane Scarazzati.
Arte: Ana Carolina Malavolta.