O que dizem os matemáticos sobre as ditas fórmulas certeiras e dicas infalíveis para se ganhar na loteria
Enquanto, na virada do ano, muitos estarão fazendo a contagem regressiva para a meia-noite ou enumerando metas para 2018, outros estarão ávidos para verificar se as seis dezenas apostadas na Mega-Sena da Virada trarão para eles um novo ano de muita prosperidade. Na edição que se aproxima, a de número 2.000, a prosperidade atende pelo nome de pelo menos R$ 280 milhões --a contemplar um ou mais felizardos.
E pelo que dão a entender dezenas de sites na internet que vendem dicas infalíveis, fórmulas certeiras e conselhos garantidos para marcar no bilhete os números que serão sorteados, só não vai ganhar quem não quiser ou for muito desatento.
Pululam também livros e cartilhas vendidos em bancas de jornais com outro tanto de mágicas para ficar milionário com a principal loteria do país. Entre as mais comuns, está a que é baseada no levantamento de todas as dezenas que saíram em todos os concursos anteriores. A dica então seria apostar nas mais sorteadas e nunca nas que apareceram menos.
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Outra recomendação comum, que teria o poder de aumentar as chances de acertar a Mega-Sena, é nunca jogar em dezenas sequenciais, como, por exemplo, 01, 02, 03, 04, 05 e 06 ou 26, 27, 28, 29, 30 e 31. As cartilhas também alertam: não se deve apostar nos números que estão numa mesma coluna vertical da cartela.
Mais uma fórmula que daria passagem sem escalas para a riqueza recomenda dividir o bilhete em quatro quadrantes e escolher números em todos eles. Outra dica: sempre se deve apostar numa mesma quantidade de pares e ímpares.
Antes de lançar mão de uma dessas fórmulas na esperança de ficar milionário, é preciso levar em conta um fato --esse sim, matematicamente infalível: elas não funcionam. Não importa o que você faça, a chance de qualquer uma das 60 dezenas ser sorteada é a mesma de qualquer outra.
"Infelizmente, essas fórmulas não podem ajudar quem aposta na Mega-Sena", avisa o físico e doutor em Matemática Augusto Quadros Teixeira, do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA).
Para o especialista em probabilidade, muita gente acredita nestas soluções porque o cérebro humano tenta buscar padrões na natureza à sua volta, inclusive em sua aleatoriedade.
"Isso talvez explique porque tantas pessoas tentam encontrar tais fórmulas", diz. "Mas para sorteios feitos de maneira correta e honesta é impossível tentar prever padrões ou aumentar suas chances de acertar as dezenas que serão sorteadas."
Eventos independentes
O matemático Ricardo Miranda Martins, do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (IMECC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), lembra que as seis dezenas mais sorteadas nos 1.999 concursos da Mega-Sena realizados até hoje foram 04, 05 (que saiu 230 vezes), 10, 23, 24 e 53, e as seis menos foram 26 (que saiu somente 164 vezes), 55, 22, 21, 25 e 60.
Mas isso não significa que se deva apostar nas primeiras e esquecer as outras.
"Os resultados anteriores não interferem no concurso seguinte", garante Martins. "Por exemplo, se você está jogando cara ou coroa e os últimos 20 lançamentos resultaram em coroa, você deveria apostar que o próximo seria cara? Ou coroa?"
"Surpreendentemente, a probabilidade do próximo lançamento ser uma ou outra é exatamente a mesma: 50% para cada. São eventos independentes."
A ideia de que senas sequenciais são mais difíceis de sair do que outras com número aleatórios também não tem suporte nas leis da matemática.
"Cada sena considerada individualmente tem a mesma chance de sair do que outra, e é ínfima", diz Hubert Marie Lacoin, do IMPA. "Tendo só 55 possibilidades de sena em sequência (tem 55 jeitos de escolher o primeiro numero), então podemos afirmar que com grande probabilidade nunca veremos uma dessa sair nos próximos 1.000 anos se fizermos sorteios diários. Mas a mesma observação vale para outras que contem os números 08, 33, 34, 48, 51 e 60 ou outros seis quaisquer. Por essa razão, a segunda possibilidade não é melhor que a primeira."
Numerologia
Para Martins, os motivos que levam as pessoas a não escolherem números de forma sequencial são puramente psicológicos.
"Optar por não jogar números em sequência ou escolher a data de aniversário dos filhos não altera a chance de ser sorteado", garante.
Além do caráter psicológico, outras fórmulas frequentemente sugeridas aliam componentes pessoais --como datas de nascimento e letras de nomes-- a um caráter místico. É o caso da numerologia. Apesar de ela trabalhar apenas com números de um dígito, há na rede inúmeras sugestões de como fazer combinações de algarismos para acertar na Mega-Sena. Pode-se, por exemplo, pegar o número de letras de seu próprio nome completo, juntar com os do dia, mês e ano de nascimento, além da dezena correspondente ao dia do mês, da semana e da hora em que se joga.
E por aí vai, as combinações são infinitas.
Entretando, na verdade, Teixeira destaca que é a imutabilidade --ou seja, a possibilidade de uma sequência sair seja sempre a mesma-- o que deixa as pessoas angustiadas.
"Mas é esta mesma característica que assegura que as regras do jogo sejam justas para todos os apostadores", diz.
Prêmio garantido com aposta de R$ 175 milhões
Mas nem tudo está perdido para quem busca estratégias racionais.
A única maneira de aumentar as chances de acertar a Mega-Sena é jogar um número maior de bilhetes.
Em um exemplo extremo, alguém que apostasse em todas as 50.063.860 de possibilidades teria a certeza de que uma de suas cartelas seria a vencedora, além de acertar muitas quadras e quinas.
"Com cada cartão custando R$ 3,50 ele gastaria R$ 175.223.510 para um prêmio de R$ 280 milhões", diz Martins. "O problema é que se outro apostador também acertasse os seis números sorteados, o que gastou R$ 175 milhões ficaria com um prejuízo de cerca de R$ 35 milhões."
Além disso, cabe a pergunta: se ele tivesse todo esse dinheiro, por que jogaria na loteria?
Contra a maré
Outra estratégia pode ser diminuir a concorrência pelo grande prêmio. Como todas as senas têm a mesma possibilidade de sair, o apostador deve escolher uma que ele ache que ninguém ou poucos outros escolherão.
"Deve haver padrões que podem ser levados em conta para tentar maximizar a probabilidade de, em acertando a combinação vencedora, ter uma quantidade mínima de outros acertadores com quem dividir o prêmio total", diz o estatístico Luiz Renato Fontes, do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP).
Ele ressalta, no entanto, que não sabe dizer quais seriam esses padrões.
"Mas como diz um artigo que li recentemente, datas de nascimento, por exemplo, podem ser usadas mais do que outros números pelo público apostador", diz.
Então, talvez, uma sena pouco apostada poderia ser uma sequencial, com números acima de 31 (para evitar as datas de nascimento). Mas isso é apenas conjectura.
"Existe uma antiga piada matemática que diz que a chance de ganhar na Mega-Sena é a exatamente a mesma, independentemente de você jogar ou não", conta Martins. "É uma anedota que indica o quão difícil é acertar as seis dezenas, isto é, uma sena particular entre 50.063.860 de possibilidades."
Ou seja, o que vale mesmo é a sorte.
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