Lobista alvo da PF compartilhou suposta minuta da Presidência do STJ
A investigação da Polícia Federal sobre a atuação do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves em um esquema de venda de decisões do STJ (Superior Tribunal de Justiça) obteve indícios de que ele compartilhou uma suposta minuta de decisão da Presidência da Corte em 2020, mas que nunca chegou a ser proferida.
A apuração iniciada pela Corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) apontou suspeitas de que algum servidor da Presidência tivesse repassado informações antecipadas ao lobista.
"Tendo em vista o encaminhamento a Andreson de documento interno do STJ (minuta de decisão), aparentemente impresso e escaneado, há indícios de que havia algum servidor lotado na Presidência do STJ, em julho de 2020, também mancomunado com Andreson de Oliveira Gonçalves, servidor esse que não foi identificado nos diálogos", diz relatório da Corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) encaminhado à PF.
O suposto documento seria da época em que o presidente era o ministro João Otávio de Noronha. Questionado, Noronha afirmou que nunca havia visto o documento e que não era possível saber se foi forjado ou produzido efetivamente no STJ. Também reiterou que não tomou nenhuma decisão no processo e que ele foi redirecionado para a competência de outro ministro, por meio de uma ferramenta da Presidência que usa inteligência artificial para triagem de recursos.
As provas fazem parte dos diálogos entre Andreson e o advogado Roberto Zampieri, assassinado no fim do ano passado em Cuiabá. Extraídas do celular de Zampieri pela Corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), as mensagens mostram que o lobista compartilhou com Zampieri uma minuta que antecipava uma decisão a ser proferida pelo então presidente do STJ, em um processo de interesse do grupo criminoso. Mas essa decisão não foi proferida.
As informações indicam que o lobista poderia ter conexões ainda mais amplas com funcionários do STJ. A investigação apura indícios de que Andreson teria acesso, por meio de funcionários do STJ, a informações dos gabinetes de cinco ministros: Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, Og Fernandes, Moura Ribeiro e Antônio Carlos Ferreira. Até o momento, não surgiram indícios de que os ministros estariam envolvidos.
A defesa de Andreson de Oliveira Gonçalves não quis se manifestar porque afirma que não teve acesso à investigação.
Agora, o relatório do CNJ sobre os diálogos também aponta suspeita de acesso indevido às informações da Presidência. A Comissão de Sindicância do STJ aberta para apurar o assunto afirmou que não foi possível fazer a leitura do código de barras da minuta de decisão compartilhada por Andreson, por isso não foi verificada sua autenticidade.
O inquérito sobre o caso foi remetido ao STF (Supremo Tribunal Federal), depois que foram detectadas transações financeiras suspeitas envolvendo uma autoridade com foro privilegiado. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, analisa o material para decidir os próximos passos da apuração. Por isso, o caso ainda não foi devolvido para a PF dar prosseguimento às diligências.
Os diálogos
Na conversa, do dia 27 de julho de 2020, Andreson envia a Zampieri um arquivo digital em formato PDF, usado para documentos. Tratava-se de uma minuta de decisão do presidente, sem data e sem assinatura. O processo envolvia uma disputa judicial de um suposto cliente deles, produtor rural de Mato Grosso, com o banco Bradesco. Logo em seguida, o lobista diz ao advogado: "Resolvido".
No relatório sobre o caso, a Corregedoria do CNJ vê indícios de que o documento da Presidência foi impresso e enviado ao lobista. "Aparentemente, essa minuta, que supostamente deveria ser assinada pelo então Presidente do STJ, Min. João Otávio de Noronha, foi impressa, escaneada e enviada a Andreson Gonçalves", diz o CNJ.
Nessa data, o processo realmente estava distribuído para a Presidência. Porém, dois meses depois, houve uma redistribuição sob o entendimento de que o caso não estava nas atribuições do presidente. Com isso, o caso foi encaminhado à ministra Isabel Gallotti.
A investigação já mostrou indícios de que Andreson tinha acesso ao gabinete dela. Nos diálogos, o lobista continua tratando desse processo e tem acesso a uma minuta antecipada da decisão da ministra, dois dias antes de ter sido proferida. Ele envia a minuta da decisão a Zampieri e se vangloria do resultado. "Aqui sou eu, rapaz. Tem que respeitar", escreveu, em mensagem de 28 de setembro de 2020.
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