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Moro caiu na mesma armadilha que criou para Lula e seus alvos na Lava Jato
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O ex-juiz Sergio Moro (Podemos) caiu em armadilha semelhante àquela que criou para seus alvos na operação Lava Jato, entre eles o ex-presidente Lula (PT). O que mostra que o mundo não gira, ele capota.
Após ter revelado que faturou em um ano ao menos R$ 3,7 milhões como consultor da Alvarez e Marsal, que atua como administradora judicial de companhias condenadas por ele na Lava Jato, como a Odebrecht e a OAS, Moro continua a ser cobrado para se explicar por essa incômoda relação. O mais importante, a natureza e os destinatários de seus serviços, até agora, não vieram à tona.
Tanto Moro quanto a sua contratadora dizem que não há conflito de interesses, pois a Alvarez e Marsal foi escolhida pela Justiça para a milionária tarefa e que o ex-ministro de Jair Bolsonaro assinou uma cláusula em que não atuaria com quem ele condenou ou investigou. Claro que as justificativas não bastam.
Nos processos contra o ex-presidente Lula, o então juiz federal defendeu a teoria de que não parecia ser necessário demonstrar que os mesmos valores recebidos da Petrobras pela OAS e pela Odebrech tenham sido usados supostamente em benefício de Lula, como na reforma do sítio de Atibaia. Disse que "o dinheiro é fungível, mistura-se na rede bancária e é objeto de operações de compensação em contas de um grupo empresarial". Ou seja, para ele, não importava que conta recebeu, mas quais as relações estabelecidas e quem eram os beneficiários.
Por essa lógica, críticos de Moro batem na tecla de que o dinheiro do caixa que pagou suas consultorias pertence à mesma Alvarez e Marsal que recebeu recursos pagos por empreiteiras que ele quebrou através de suas decisões. Dinheiro que, levando em conta as sentenças do ex-juiz, também estava misturado com dinheiro público desviado da Petrobras.
Outro ponto é o contexto. O então juiz federal consideraria que era o bastante um contexto aparentemente promíscuo para um ato de ofício contra um investigado sem uma prova sólida. Uma quebra de sigilo, por exemplo.
E, neste caso, qual o contexto? Depois que deixou a vida pública, Moro foi trabalhar para a Alvarez e Marsal, que recebe um bom dinheiro ao ter sido escolhida por juízes para atuar na recuperação de empresas da Lava Jato.
Com base nisso, o então responsável pela 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, Sergio Moro, exigiria mais explicações ao cidadão Sergio Moro. E escarafuncharia todos os seus ganhos, como ele fez com aqueles que tornou réus. Na live em que revelou os valores recebidos pela consultoria, ele desafiou Lula a abrir os valores que faturou com palestras após deixar a Presidência. Contudo, ele quebrou o sigilo da empresa de palestra do ex-presidente, em 2016, dados que foram vazados à imprensa.
Quantos consultores já recusaram trabalhos por conta de impeditivos morais e éticos envolvidos? É no mínimo estranho Moro ir trabalhar com conceitos como compliance, due diligence, ESG e ter ignorado que o princípio fundamental é a transparência, que precisa ser dada mesmo quando ela não é prevista em lei.
Explicações mais detalhadas sobre a natureza do trabalho de Moro para a Alvarez e Marsal precisam ser fornecidas até para que possamos compreender como e se ele realmente acredita que a separação entre a coisa pública e os interesses privados valem para todos ou apenas para seus adversários políticos.
Ele pode ganhar dinheiro na iniciativa privada, não precisa fazer voto de pobreza. A questão é que o contexto em que isso aconteceu gera 3,7 milhões de perguntas que o pré-candidato à Presidência das República parece fazer de tudo para não responder.