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Reinaldo Azevedo

Ameaça de decreto é bravata de Bolsonaro; a medida não duraria meia-hora

É a Constituição. Junto com a Justiça . Poderia escrever que é bom já ir acostumando. Mas parece que não haverá tempo para quem não aprende nada nem esquece nada - Foto: Pedro Augusto Pinho
É a Constituição. Junto com a Justiça . Poderia escrever que é bom já ir acostumando. Mas parece que não haverá tempo para quem não aprende nada nem esquece nada Imagem: Foto: Pedro Augusto Pinho

Colunista do UOL

30/03/2020 08h52

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Ao chegar ao Palácio da Alvorada, vindo de seu passeio em que, mais uma vez, pregou o fim da quarentena, o presidente Jair Bolsonaro afirmou:

"Eu estou com vontade, não sei se eu vou fazer, de baixar um decreto amanhã: toda e qualquer profissão legalmente existente ou aquela que é voltada para a informalidade, se for necessária para levar o sustento para os seus filhos, para levar leite para seus filhos, para levar arroz e feijão para casa, vai poder trabalhar".

É populismo barato. Não vai baixar decreto nenhum. Se o fizer, não haverá nem tempo de o arroubo tresloucado ter efeito prático porque será derrubado pelo Supremo. Não compete ao governo federal arbitrar sobre a maioria das atividades hoje paralisadas nos Estados. Bolsonaro incluiu templos religiosos e lotéricas como atividades essenciais em seu decreto. Dizem respeito, de fato, à federação, mas sua decisão foi derrubada por liminar da Justiça Federal. Governadores, por seu turno, não podem impedir o transporte aéreo.

A fala do presidente é só uma bravata perigosa, a sugerir que as restrições impostas pelos governadores são punições aos trabalhadores. Não! O mundo inteiro, incluindo seu amigo Donald Trump, sabe que se trata apenas de produzir o menor número possível de mortos.

A fala é um despropósito. Sim, certamente o ministro Luiz Mandetta está articulando esforços para que o SUS atue dentro do que é possível, preparando-se para que o parece inevitável: o colapso do sistema. O que é colapso mesmo? Pessoas precisarão de leitos e não os encontrarão disponíveis.

Ora, os grandes aliados do ministro nesse esforço são os governadores. Foram eles, ou a quase totalidade deles, a tomar as medidas restritivas que podem adiar esse colapso, quem sabe impedi-lo, dando tempo ao sistema de se preparar para o inevitável. É agradável? Certamente não! Mas é fato que, com exceções aqui e ali, a população tem atendido às recomendações e vedações.

Falando à Folha, chefes dos Executivos estaduais externaram a sua indignação:
"Ele tem que parar de fazer política, parar de fazer intriga e assumir a função que a maioria do povo lhe deu de presidente da República. Cabe ao governo federal liderar esse processo e não ficar alimentando crise. Não vamos permitir. O que os governadores querem é que o presidente assuma suas responsabilidades de coordenar as ações de saúde pública para salvar vidas humanas", afirmou o petista Rui Costa, da Bahia,

"Nesta segunda, assino decreto renovando as medidas restritivas. Essa decisão é baseada na avaliação da OMS e das autoridades sanitárias. Não desafie o coronavírus. Não siga atitudes impensadas e descoladas da realidade. Olhe o que aconteceu nos países nos quais as pessoas não acreditaram nas consequências desse vírus. Não se oriente por ações irresponsáveis de quem quer que seja. Mantenha-se em casa. Os fluminenses podem ter certeza de que vamos, juntos, vencer essa doença", disse Wilson Witzel, do Rio, que é do PSC.

"Vivemos em uma Federação. O presidente não tem poderes de ditador. Ele não pode anular competências dos estados sobre proteção à saúde, nem normatizar sobre assuntos de interesse local. Se ele editar essa espécie de 'Ato Institucional', irei ignorar e fazer prevalecer o que consta do artigo 23 da Constituição", anuncia Flávio Dino (PCdoB), do Maranhão.