Entidades judaicas repudiam peça da Secom que remete a campo de Auschwitz
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A Confederação Israelita do Brasil divulgou uma nota em que repudia o emprego, pela Secretaria da Comunicação Social do governo Bolsonaro, de expressão que remete à inscrição no portão do campo de concentração de Auschwitz, na Polônia. Para lembrar: campanha oficial veiculada pela Secom traz o mote: "O trabalho, o união e a verdade nos libertarão". No campo de horrores, lê-se: "O trabalho liberta". Escrevi um longo post ontem a respeito do assunto.
Diz o texto da Conib:
"É conhecidíssima a relação desse mote com a mais infame instituição do Holocausto, o campo de extermínio de Auschwitz. Ali, no seu portão de entrada, uma placa com esses dizeres transmitia a mentira de que aquele era um local de trabalho e de possível liberdade - quando se tratava da principal fábrica de mortos do nazismo.
É lamentável ver, mais uma vez, questões caras ao judaísmo e à humanidade em geral serem banalizadas e emuladas, ofendendo a memória das vítimas e dos sobreviventes, em um momento já tão difícil do nosso país e do mundo".
Também o Museu do Holocausto de Curitiba protestou. Depois de fazer considerações sobre o frequente emprego do nazismo como símbolo do mal e do que pode haver de impertinente nisso, considera a entidade:
"O material divulgado pela Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom), órgão da Presidência da República (...) faz uma mistura entre um versículo bíblico já utilizado em campanha eleitoral e o infame dizer do portão do complexo de extermínio de Auschwitz-Birkenau - "Arbeit macht frei" (o trabalho liberta) - para promover políticas governamentais.
(...)
Diferentemente de menções ao nazismo como metonímia do mal, estes discursos enaltecem ideologicamente políticas análogas às nazistas, demonstrando a continuidade de aspectos de tal doutrina no presente, merecendo posicionamentos firmes por parte do Museu. A inconveniente frase "O trabalho liberta" converteu-se em símbolo da estratégia nazista para enganar suas vítimas com a falsa sensação de liberdade e sobrevivência por meio do trabalho.
(...)
Repudiamos, em tom de alerta à sociedade, a peça publicitária da Secom e demandamos deste órgão imediata retratação e correção - não apenas pela escolha de palavras, mas por seu sentido que, infelizmente, ratifica a presença atual de elementos que, décadas atrás, constituíram o nazismo.
As respectivas íntegras estão aqui e aqui.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que é judeu, afirmou: "Nada que lembre o nazismo pode ser visto com bons olhos. Para nós, judeus, o campo de extermínio de Auschwitz é um pesadelo eterno".
É bom saber que essas entidades estão atentas. Outras, no entanto, preferiram o silêncio. A reação seletiva — depende de onde parte a ofensa — em casos assim sempre abre um flanco para que, no futuro, outros tantos resolvam trilhar o mesmo caminho, de sorte, então, que o nefando já não pareça tão grave.
Lamento pelos judeus e não judeus que silenciaram diante da infâmia. Como costumo dizer, todos estão fazendo história. E serão cobrados por isso.