FORA DA LEI 1: O obsceno conluio da Lava Jato com o FBI ao arrepio da lei
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A Lava Jato decidiu sair das catacumbas para ocupar de novo as manchetes, mas se vê que seu fôlego é curto. Esta quarta-feira trouxe à luz ações da força-tarefa que evidenciam a degradação a que ela conduziu o estado de direito e o devido processo legal no país.
Deltan Dallagnol, diga-se, está me processando. Quer uma grana gorda. Não vou fazer proselitismo aqui. Respeito o Poder Judiciário. Quem já deu mostras evidentes de desrespeito é ele. Só fiquei sabendo hoje à tarde, quando chegou a intimação. Ignorava, portanto, a ação do rapaz quando escrevi o texto de ontem ou e anteontem. E agora sei.
O site Consultor Jurídico já havia noticiado em fevereiro de 2018 a colaboração do FBI com a Lava Jato. Bem, uma coisa é cooperação; outra, distinta, é uma parceria ao arrepio da lei, estabelecida nas sombras. Reportagem da Agência Pública, em parceria com o site The Intercept Brasil, revela coisas do arco da velha.
Por que chamo no título de "conluio" e de "obsceno" o que se deu. Leiam e descumbram.
Reproduzo trecho da reportagem. Prestem atenção!
À frente da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) da Procuradoria-Geral da República, o procurador Vladimir Aras alertou diversas vezes para problemas legais envolvendo a colaboração direta com agentes do FBI.
Uma conversa bastante tensa, em 11 de fevereiro de 2016, revela até que ponto a PF mantinha proximidade com o FBI e desconfiava do governo de Dilma Rousseff. A ponto de o próprio chefe da Lava Jato, Deltan Dallagnol, admitir ao secretário de Cooperação Internacional da PGR que a PF preferia tratar direto com os americanos a seguir as vias formais.
Às 11:27:04, Deltan pede que Aras olhe um e-mail enviado para os Estados Unidos. Aras se surpreende com o teor: tratava-se de um pedido de extradição de um suspeito da Lava Jato. Não fica claro quem é a pessoa a quem se referem. O pedido, informal, havia sido enviado ao Escritório de Assuntos Internacionais (OIA, na sigla em inglês) diretamente por Dallagnol, sem passar pela Secretaria de Cooperação Internacional da PGR nem pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), do Ministério da Justiça, autoridade central responsável, de acordo com um tratado bilateral. O diálogo dá a entender que um mandado de prisão ainda estava por ser decretado pelo então juiz Sergio Moro.
"Passa o nome e os dados que vamos atrás. Fizemos isso com o advogado de [Nestor] Cerveró", responde Aras. "Nosso parceiro preferencial para monitorar pessoas tem sido o DHS, mas podemos trabalhar com o FBI também. Quanto antes tivermos os dados, melhor", explica Aras, referindo-se ao Departamento de Segurança Interna dos EUA (DHS, na sigla em inglês). Aras prossegue explicando que o pedido de extradição teria de passar pelo DEEST, o Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, além do Ministério de Relações Exteriores, "um parceiro importante".
"Não é bom tentar evitar o caminho da autoridade central, já que, como vc sabe, isso ainda é requisito de validade e pode pôr em risco medidas de cooperação no futuro e a "política externa" da PGR neste campo", explica Vladimir.
"O que podemos fazer agora é ajustar com o FBI e com o DHS [Departamento de Segurança Interna dos EUA} para localizar o alvo e esperar a ordem de prisão, que passará pelo DEEST. Podemos mandar simultaneamente aos americanos", ele prossegue.
Em resposta, Deltan é direto.
"Obrigado Vlad por todas as ponderações. Conversamos aqui e entendemos que não vale o risco de passar pelo executivo, nesse caso concreto. Registra pros seus anais caso um dia vá brigar pela função de autoridade central rs", escreveu, deixando no ar a sugestão para que Aras se ocupasse do assunto se um dia comandasse o MPF ou o Ministério da Justiça. "E registra que a própria PF foi a primeira a dizer que não confia e preferia não fazer rs".
Vladimir insiste: "Já tivemos casos difíceis, que foram conduzidos com êxito".
"Obrigado, Vlad, mas entendemos com a PF que neste caso não é conveniente passar algo pelo Executivo".
Vladimir responde que "a questão não é de conveniência. É de legalidade, Delta. O tratado tem força de lei federal ordinária e atribui ao MJ a intermediação".
É um deboche. Fica claro que o coordenador da força-tarefa não está nem aí para o Ministério da Justiça ou para a própria PGR.
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