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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

O que desmoraliza a Justiça é a falcatrua, não a correção do despropósito

Fachada do edifício Solaris, na praia das Astúrias, em Guarujá, onde fica o tríplex que virou símbolo de uma condenação sem provas, assinada por um juiz incompetente para o caso - Eduardo Knapp/Folhapress
Fachada do edifício Solaris, na praia das Astúrias, em Guarujá, onde fica o tríplex que virou símbolo de uma condenação sem provas, assinada por um juiz incompetente para o caso Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Colunista do UOL

09/03/2021 03h49

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Recebi mensagem de uma pessoa conhecida com a seguinte consideração: "Essa decisão de Edson Fachin só serve para desmoralizar a Justiça porque as pessoas se perguntam o óbvio: por que só agora?"

É claro que há algumas explicações — ou uma principal — para que seja só agora. Escreverei a respeito. Mas quero corrigir o amigo que enviou o texto, cujo nome não direi. Não é a decisão de agora que desmoraliza a Justiça. Esta, ainda que por caminhos tortos, tem ação corretiva. Nesse caso, o que desmoralizava a Justiça era tudo aquilo que veio antes.

Como cansei de demonstrar ao longo do tempo — meu texto evidenciando que o próprio Sergio Moro reconhecia não ser ele o juiz vai fazer quatro anos daqui a dez dias —, havia uma usurpação de competência absurda nesse caso. A Vaza Jato já revelou — e creio que dados novos serão evidenciados com o conteúdo da Operação Spoofing —, que houve uma tramoia para mandar para Curitiba o caso do apartamento da Bancoop.

E por quê? Porque era preciso ter o que os procuradores consideravam uma evidência de que lula havia recebido benefício de empreiteiras. A denúncia, em si, era fraca. Embora o processo tenha deixado claro que o imóvel não pertencia ao ex-presidente, ele foi usado como suposto elo entre o petista e a OAS.

Só para lembrar à margem: a Álvarez & Marsal, empresa de que Sergio Moro agora é sócio, fez a recuperação judicial da empreiteira. E sempre colocou o tal tríplex como um bem que pertencia ao grupo. Como o imóvel poderia ser de Lula e da empresa ao mesmo tempo?

Ocorre que pouco adiantava a evidência escancarada. Mais: parecia irrelevante que o próprio Sergio Moro confessasse não haver vínculo entre o imóvel e os contratos com a Petrobras. Bem, mas, se não havia, então era arreganhado que não era ele o juiz.

Ocorre que a Justiça preferia não ouvir. Setores majoritários da imprensa preferiram não ouvir. O mundo político preferiu não ouvir. Uns tinham a sua agenda política; outros, os próprios temores. E a aberração foi sendo empurrada com a barriga.

Isso, sim, desmoraliza a Justiça. A determinação de que tudo volte à estaca zero e seja devolvido à Justiça Federal de Brasília concorre para a moralização, ainda que muitas considerações tenham de ser feitas.